sábado, 4 de agosto de 2012

A DIFÍCIL VIDA BANDIDA





O SUL, Porto Alegre, Sábado, 04 de Agosto de 2012.

WANDERLEY SOARES

Ainda me sobram lágrimas na alma, embora elas não vertam por aqueles que fizeram chorar irmãos inocentes.

Em sessão com meus conselheiros, sempre digo coisas comuns, pois sou, como um humilde marquês, um cidadão comum. Nesta esteira, nesse colegiado que não é secreto, mas é discreto, concordamos que profissionais das carreiras humanísticas, entre os quais alguns pedreiros livres, sem desprezar os seguidores das ciências exatas, não perdem a ternura e até praticam, mesmo sem rimar, poemas que guardam em segredo e outros que arriscam publicar. É certo, então, que nós, humanistas, somos feridos tanto pelas lágrimas da euforia e igualmente por aquelas que tatuam, não no corpo, mas em nosso espírito, os flagelos da humanidade. Prisioneiro desta moldura, disse aos meus conselheiros que não me causou espanto a abertura do espaço dado por um canhão da mídia de nosso Rio Grande para bandidos profissionais, recolhidos ao Presídio Central de Porto Alegre, um dos quais levou às lágrimas um ilustre magistrado do Poder Judiciário gaúcho. Com pouco mais de sete décadas de caminhada, entendo a emoção do magistrado, pois ainda me sobram lágrimas na alma, embora elas não vertam por aqueles que fizeram chorar irmãos inocentes. Sigam-me.

Levar a vida

A vida bandida é difícil de levar. Os operários que vivem na periferia das grandes cidades, as mães de família que passam fome para melhor alimentar seus filhos, os velhos com suas aposentadorias miseráveis e que são condenados à morte lenta pelo Estado a que serviram, as meninas que são levadas à prostituição pelos rufiões que abastecem as cortesãs dos melhores cabarés das metrópoles, os pequenos comerciantes que são obrigados a obedecer as regras de traficantes, os professores que têm medo de repreender um aluno relapso, não sabem como a vida bandida é difícil de levar. E são os bandidos que ganharam espaço para revelar as suas agruras que aqui resumo, ainda pensando nas lágrimas do juiz. Vinícius, 33 anos, condenado por assaltos e homicídios, diz: - Falta comida, cobertor e medicamento. Morremos na espera por direitos; Gomes, 54 anos, condenado por homicídios e assaltos, denunciou: - Tô velho, gordo e hipertenso. Daqui a pouco saio daqui e nem para bandido mais sirvo; Santiago, 31 anos, cumpre pena por assaltos, reclamou: - Minha família tem de trazer óleo para eu cozinhar. O Estado não dá; Santos, 29 anos, condenado por assaltos, apontou: - A família tem de trazer para gente papel higiênico, uma comida melhor. O Estado não fornece o que deveria. - Eis a dolorosa saga dos bandidos condenados.

Execução

Um homem de 32 anos, identificado como Valtair José Machado Mendonça, foi morto no bairro Canudos, em Novo Hamburgo. Valtair foi atingido por, pelo menos, 40 tiros. Este é o estágio da bandidagem no RS.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Entendo as lágrimas do abnegado e respeitado magistrado que tem a coragem de demonstrar publicamente a sua impotência  em conter o caos prisional e a impassividade do Poder Judiciário em auxiliá-lo na luta contra o poder político. Está na hora do Tribunal de Justiça do RS entrar em ação e denunciar formalmente esta situação ao STJ (questão criminal) e à Assembléia Legislativa (questão política). As atuais medidas se mostraram insuficientes para obrigar o Executivo a cumprir dispositivos constitucionais, atender os pedidos judiciais e obedecer as leis que regem os direitos humanos e os direitos dos apenados.

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