quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

VERBAS DA UNIÃO PARA PRESÍDIOS DO RS FORAM DEVOLVIDAS



DO G1 RS, RBS TV 09/11/2016

Ex-secretário do RS é denunciado por devolver à União verba para presídios. MP ingressou com ação por improbidade contra 2 ex-membros do governo. Airton Michels argumenta que devolução foi determinada por Dilma em 2011.



Dois ex-integrantes da Secretaria de Segurança do Rio Grande do Sul – entre eles o titular da pasta durante o governo anterior – foram acusados pelo Ministério Público por improbidade administrativa. Segundo a denúncia, eles deixaram de construir novas penitenciárias e devolveram aos cofres federais R$ 18 milhões, valor que viabilizaria obras de presídios, como mostra reportagem do RBS Notícias (veja no vídeo).

De acordo com a denúncia, o ex-secretário de Segurança Airton Michels, que hoje é procurador de Justiça, descumpriu uma decisão judicial que determina a criação de mais vagas, mesmo com aplicação de multa. A promotora Daniele Schneider diz que Michels e Gelson Treisleben, ex-chefe da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), tentaram "ludibriar" autoridades e a população com promessas de locação ou construção de presídios.

A verba devolvida à União, que segundo a ação corresponde a R$ 33 mil em valores atualizados, era repassada para garantir novas vagas em presídios. O Ministério Público diz que o ex-secretário da segurança teve dois anos para realizar as obras ou prorrogar os contratos, em vez de devolver os recursos.

A promotoria pede que Michels e Treisleben paguem uma indenização de R$ 65 milhões, para compensar dano moral coletivo, prejuízo causado pela devolução da verba e também para quitar a multa de R$ 10 mil por dia, pelo descumprimento da sentença que manda abrir novas vagas. Por isso, a atual gestão também é investigada, em outro inquérito. A multa segue sendo aplicada no governo de José Ivo Sartori.

Michels nega a acusação. Ele afirma que os R$ 18 milhões foram devolvidos ao governo federal por determinação da então presidente Dilma Rousseff. "Em 2011, uma decisão da presidente da República determinou que todos os convênios do Brasil, fossem prisionais ou de obras que não tivessem iniciado a execução até aquele momento, deveriam ser devolvidos. Eu não tenho nenhuma ingerência nisso", argumentou, descartando que tenha responsabilidade pelo fato. "Não existe nenhum ato de improbidade que eu tenho praticado na minha vida pública".

Os recursos devolvidos no primeiro ano do governo anterior eram destinados à criação de 505 vagas em quatro cidades: Passo Fundo, Bento Gonçalves, Charqueadas e Bagé, onde R$ 860 mil garantiriam 108 vagas no regime semiaberto. O comandante do policiamento ostensivo em Bagé, capitão Augusto Porto, diz que o espaço faz falta.

"Os presos acabam por várias formas sendo liberados ou recebendo alguma forma de benefício para que fiquem fora da custódia direta do Estado. Há várias situações em que o preso fica recolhido de forma domiciliar", diz o oficial.

O atual secretário da Segurança, Cezar Schirmer, disse que esse é um assunto do governo anterior, e preferiu não comentar a questão. A secretaria enviou uma nota informando que o governo pretende aumentar o diálogo com a União para garantir os convênios que ainda estão em vigor e buscar recursos para novas unidades.

Treiesleben diz que discorda da denúncia, e lembrou que durante a sua gestão à frente da Susepe inaugurou as penitenciárias de Arroio dos Ratos e Venâncio Aires, iniciou a construção do Módulo de Charqueadas, concluiu o de Montenegro e entregou o presídio de Canoas.

Sobre o presídio de Passo Fundo, Treisleben alegou que as obras pararam por determinação do Tribunal de Contas da União. Em relação à construção de cadeias em Bagé, Charqueadas e Bento Gonçalves, ele disse que os contratos foram suspensos pelo governo federal, e que não houve má vontade ou negligência na devolução dos recursos.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O PERFIL DO CRIMINOSO PSICOPATA

Conteúdo Jurídico, Sábado, 23 de Julho de 2011 
Link: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-perfil-do-criminoso-psicopata,32921.html


» Fabíola dos Santos Araújo




Resumo: A psicopatia é considerada um transtorno de personalidade com traços notáveis de comportamento antissocial. O psicopata não possui consciência moral nem empatia, fatores que os tornam muito perigosos sob o ponto de vista legal. O objetivo desse artigo é apresentar um breve resumo sobre o transtorno e suas características, distingui-lo das doenças mentais e apontar os crimes mais comumente praticados por criminosos psicopatas.


Palavras-chave: criminologia, psicopatia, transtorno da personalidade dissocial, transtorno da personalidade antissocial

Psychopathic criminal’s profile

Abstract: Psychopathy is a personality disorder with remarkable traits of antissocial behavior. The psychopath doesn’t have moral conscience and empathy, these factors make him very dangerous on legal viewpoint. This paper presents a short summary about the disorder and its characteristics, distinguishes it from mental diseases and lists the common crimes that are practiced by psychopathic criminals.

Keywords: criminology, psychopathy, dissocial personality disorder, antissocial personality disorder.



INTRODUÇÃO

Este artigo tem por objetivo apresentar um breve estudo sobre as características do criminoso psicopata e os crimes mais usuais cometidos por pessoas que apresentam esse transtorno. O trabalho teve por base o estudo de livros que abordam a psicopatia, assim como artigos científicos. O método utilizado foi o dedutivo e o exposto foi obtido através das leituras do material bibliográfico. O tema é de grande relevância para o estudo da Criminologia, em correlação com o Direito Penal, a Psiquiatria e a Psicologia.

Personalidade, do latim personalis, pessoal, é a soma de muitos caracteres diferentes e variáveis, intelectuais, afetivos e físicos, que confere a cada pessoa uma individualidade como uma semelhança a seus iguais. A personalidade significa a organização física, psíquica, social e cultural do indivíduo. Para o alemão Kempf, a “personalidade é representada pelo modo habitual de ajustamento que o organismo efetua entre as exigências individuais e as do ambiente” (MIELNIK, 1987, p. 208).

Em geral, os psicólogos e os psiquiatras tendem a dizer que psicopatas são indivíduos com personalidade anormal.

O psiquiatra alemão Kurt Schneider (1887-1967) definiu, em 1923, que psicopatas são aquelas personalidades anormais que sofrem por sua anormalidade ou causam sofrimento para a sociedade.

Os psicopatas causam sofrimento, porque não têm consciência moral e, também, empatia.

O psicólogo norte-americano Daniel Goleman define a empatia com sendo “a compreensão dos sentimentos dos outros e a adoção da perspectiva deles, e o respeito às diferenças no modo como as pessoas encaram as coisas” (GOLEMAN, 2001, p. 282). A empatia é essencial no desenvolvimento do comportamento altruísta, afetivo e moral, ou seja, na forma como o indivíduo age perante as pessoas com as quais se inter-relaciona.

A empatia, reforçada pelo código de moral e de ética aprendido, funciona como um freio para as atitudes humanas. O psicopata não se comove com o sofrimento alheio e pode cometer atrocidades sem sentir remorso ou temer punições.

Segundo Luís Rey, consciência é o “estado do aparelho psíquico que permite ao indivíduo compreender tudo aquilo que percebe do mundo exterior, através dos sentidos, e tomar conhecimento a cada instante de sua própria existência com tudo que ela comporta” (REY, 1999, p. 177).

A consciência moral é conhecer, ter e respeitar a conduta moral do meio em que vive. Para a psicologia, há três aspectos importantes da consciência moral:

- julgamento moral (L. Kohlberg e J. Piaget);

- conduta moral (R. Hogan); e

- valores morais (H. J. Eysenck).


O desenvolvimento do julgamento moral decorre, segundo a concepção da psicologia do desenvolvimento cognitivo (Kohlberg, em ligação com Piaget) em seis estágios:

1-orientação pelo castigo (obediência);

2- orientação egoísta-ingênua;

3- orientação pela aprovação social;

4-autoridade e ordem social;

5- orientação pelo contrato legal; e só então

6- orientação pela consciência moral, isto é, por princípios universalmente válidos.


As dimensões da conduta moral são para Hogan:

1-conhecimento das regras morais;
2-socialização;
3-empatia com os outros;
4-autonomia (consciência versus responsabilidade) e
5-julgamento moral. (DORSCH; HÄCKER; STAPF, 2001, pp. 184-185)

Nesse diapasão, é necessário relacionar ao exposto o sentido de consciência de norma como sendo a prontidão para observar as prescrições sociais do comportamento, que pressupõe tanto o conhecimento das normas, sua valorização positiva, como também, a prontidão motivacional para cumpri-las. O psicopata conhece as normas sociais e legais, porém não as respeita, e não as respeitando, não as cumpre nem as teme, agindo sempre em favor de seus próprios interesses e sem considerar os sentimento dos outros.

No dizer da psiquiatra brasileira Ana Beatriz Barbosa Silva, “a consciência está profundamente alicerçada em nossa habilidade de amar, em criar vínculos afetivos e nos abastecer dos mais nobres sentimentos” (SILVA, 2010, p. 33.), sentimentos que o psicopata não possui.


1 Breve histórico dos estudos sobre psicopatia

Atribui-se à escola de psiquiatria alemã a introdução da palavra psicopatia nos estudos científicos.

Em 1888, o psiquiatra alemão J. L. A. Koch apresentou o termo inferioridade psicopática.

Emil Kraepelin (1856-1926), psiquiatra alemão, dedicou anos estudando as desordens de comportamento de pacientes hospitalizados em Munique. Em 1904, Kraepelin definiu a personalidade psicopática, caracterizando-a como uma personalidade não desenvolvida nas esferas afetiva e volitiva e fronteiriça com a psicose.

Kurt Schneider deu propulsão aos estudos da psicopatia ao defender que esta era um distúrbio da personalidade e não, uma doença. Schneider distinguiu dez tipos de personalidade psicopáticas: hipertímicos, deprimidos, medrosos, fanáticos, vaidosos, lábeis de humor, explosivos, frios, abúlicos e astênicos (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 275).

O trabalho do psiquiatra norte-americano Hervey Milton Cleckley (1903-1984), The Mask of Sanity (A Máscara da Sanidade), publicado em 1941, é reconhecido como o primeiro estudo completo sobre a psicopatia e o que fornece uma das definições mais completas.

O psicólogo canadense Robert D. Hare, após anos de estudos, formulou, em 1991, um questionário chamado Psychopathy Checklist-Revised – PCL-R, ou escala Hare, considerado, atualmente, o método mais confiável na identificação de psicopatas.


2 Conceito

A palavra psicopatia, etimologicamente, vem do grego psyché, alma, e pathos, enfermidade. O conceito de psicopatia não é consenso entre os especialistas, entretanto, apesar das inúmeras definições diversificadas, acorda-se que a psicopatia é um transtorno da personalidade e não, uma doença mental.


O transtorno da personalidade

[...] exige a constatação de um padrão permanente de experiência interna e de comportamento que se afasta das expectativas da cultura do sujeito, manifestando-se nas áreas cognoscitiva, afetiva, da atividade interpessoal, ou dos impulsos, referido padrão persistente é inflexível, desadaptativo, exibe longa duração de início precoce (adolescência ou início da idade adulta) e ocasiona um mal-estar ou deteriorização funcional em amplas gamas de situações pessoais e sociais do indivíduo. (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 284)

A Organização Mundial de Saúde, OMS, utiliza o termo Transtorno de Personalidade Dissocial e o registra no CID-10[1] (Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde) sob o código F60.2:

Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade.


Personalidade (transtorno da):

- amoral
- antissocial
- associal
- psicopática
- sociopática.


A Associação Americana de Psiquiatria (American Psychiatric Association – APA) prefere a expressão Transtorno da Personalidade Antissocial sob o código 301.7. Em seu manual DSM-IV-TR[2] – Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), a instituição apresenta critérios diagnósticos do transtorno:


Critérios Diagnósticos para Transtorno da Personalidade Antissocial

A. Um padrão global de desrespeito e violação dos direitos dos outros, que ocorre desde os 15 anos, como indicado por pelo menos três dos seguintes critérios:

(1) incapacidade de adequar-se às normas sociais com relação a comportamentos lícitos, indicada pela execução repetida de atos que constituem motivo de detenção

(2) propensão para enganar, indicada por mentir repetidamente, usar nomes falsos ou ludibriar os outros ara obter vantagens pessoais ou prazer

(3) impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro

(4) irritabilidade e agressividade, indicadas por repetidas lutas corporais ou agressões físicas

(5) desrespeito irresponsável pela segurança própria ou alheia

(6) irresponsabilidade consistente, indicada por um repetido fracasso em manter um comportamento laboral consistente ou de honrar obrigações financeiras

(7) ausência de remorso, indicada por indiferença ou racionalização por ter ferido, maltratado ou roubado alguém

B. O indivíduo tem no mínimo 18 anos de idade.

C. Existem evidências de Transtorno da Conduta com início antes dos 15 anos de idade.

D. A ocorrência do comportamento antissocial não se dá exclusivamente durante o curso de Esquizofrenia ou Episódio Maníaco.


3 Investigações empíricas

Tem-se dado importância a estudos experimentais para se mostrar a relação fisiológica do cérebro com a psicopatia. Modelos empíricos demonstram que psicopatas apresentam disfunções dos circuitos cerebrais relacionados à emoção.

O sistema límbico, formado por estruturas corticais e subcorticais, é responsável pelas emoções humanas (SILVA, 2010, p. 183) e por parte da aprendizagem e da memória (GOLEMAN, 2001, p. 29). A amígdala cortical, estrutura localizada no interior do lobo temporal, “é especialista em questões emocionais” (GOLEMAN, 2001, p. 29). “A amígdala cortical funciona como um depósito da memória emocional e, portanto, do próprio significado” (GOLEMAN, 2001, p. 29).

A região cerebral envolvida nos processos racionais é o lobo pré-frontal. Parte do lobo pré-frontal, o córtex medial pré-frontal, recebe influência do sistema límbico, mais especificadamente da amígdala, e atua na tomada de decisões pessoais e sociais. Assim, verifica-se a interconexão entre o sistema límbico, responsável pela parte emocional, e o lobo pré-frontal, pela parte racional do pensamento, e o resultado disso é determinante no comportamento social adequado, o que o psicopata não possui.

Através de pesquisas com aparelhos de ressonância magnética funcional (RMf), psicólogos e neurocientistas puderam estudar as estruturas cerebrais envolvidas nas emoções e constataram

[...] alterações características de um funcionamento cerebral de um psicopata. Pessoas sem qualquer traço psicopático revelaram intensa atividade da amígdala e do lobo frontal (sendo neste de menor intensidade), quando foram estimuladas a se imaginarem cometendo atos imorais ou perversos. No entanto, quando os mesmos testes foram realizados num grupo de psicopatas criminosos, os resultados apontaram para uma resposta débil nos mesmos circuitos. (SILVA, 2010, p. 187)

Pelo fato de serem hipofuncionantes, as amígdalas do psicopata

[...] deixam de transmitir, de forma correta, as informações para que o lobo frontal possa desencadear ações ou comportamentos adequados. Chegam menos informações do sistema afetivo/límbico para o centro executivo do cérebro (lobo frontal), o qual, sem dados emocionais, prepara um comportamento lógico, racional, mas desprovido de afeto. (SILVA, 2010, p. 187)

O psicopata possui uma capacidade muito limitada de sentir e responder às emoções em comparação com o não psicopata (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 278). Em experimentos que imaginam frases de forte conteúdo emotivo, pessoas não psicopatas têm aceleração do ritmo cardíaco e contrações dos músculos faciais, enquanto os psicopatas não evidenciam diferenças significativas nesses aspectos. Investigações utilizando scanner, para medir a ativação cerebral ao lerem palavras neutras e palavras de alto conteúdo emotivo, concluíram que “os cérebros dos psicopatas mostraram maior atividade que os cérebros dos não psicopatas ante palavras de carga emotiva que palavras neutras, isto é, os psicopatas hão de se esforçar mais para reconhecer e processar as palavras com carga emocional que as neutras” (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 279). Estudos utilizando pequenas descargas elétricas constataram que indivíduos psicopatas são menos sensíveis ao medo e que dispõem de um mecanismo mental que desconectam os sinais de medo e de ansiedade associados à ameaça das descargas: o ritmo cardíaco dos psicopatas decresce, ao passo que o dos não psicopatas se eleva (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 278).


4 Investigações teóricas[3]

Paralelamente aos estudos empíricos, há modelos teóricos que procuram investigar o comportamento psicopático e explicá-lo.

Atualmente, destacam-se dois modelos teóricos: o biológico-conductual ou de condicionamento do processo de socialização, do psicólogo teuto-britânico Hans Jürgen Eysenck (1916-1997), com colaboração do psicólogo e criminalista britânico Gordon Blair Trasler (1929-2002), e o biossocial, do psicólogo norte-americano Sarnoff A. Mednick.


4.1 Modelo biológico-conductual

O modelo de Eysenck e Trasler baseia-se no condicionamento clássico ou aprendizagem por associação de estímulos. Para os pesquisadores, a criança aprende através de reflexos condicionados: cada vez que é castigada ou reprimida pelos pais, que lhe aplicam uma sanção (estímulo incondicionado), a criança associa (aprendizagem) tal sanção a condutas proibidas (estímulo condicionado) e desenvolve uma consciência de medo ou de ansiedade (reação condicionada) de que comportamentos semelhantes devem ser evitados no futuro.

Segundo Eysenck, os psicopatas são incapazes de se condicionarem em virtude de possuírem uma muito ilimitada atividade cortical. A propensão dos psicopatas para exibirem comportamentos criminais ocorre porque tais indivíduos não conseguem formar uma consciência sólida, em virtude de incapacidade de condicionamento congênito e de incompetente processo de socialização dos pais, ou responsáveis, que não os condicionaram eficazmente.

Eysenck resume em quatro fases a dinâmica criminal: defeito congênito de condicionamento nas personalidades psicopáticas por uma insuficiente ativação cortical; comportamento criminal instintivo, natural, que se reforça; falta de consciência do desenvolvimento de um reflexo condicionado que permita associar conduta delitiva e castigo ou angústia no sentido dos processos de condicionamento ou aprendizagem ‘clássica’; ausência de todo o corte pessoal inibitório do comportamento criminoso por causa da péssima capacidade de condicionamento. (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 280)


4.2 Modelo biossocial

O modelo de Mednick apóia-se na aprendizagem operante ou instrumental: o homem aprende pelas consequências de seus atos, castigos ou recompensas. A criança que tem um sistema neurovegetativo muito sensível, que responde e se recupera rápido do medo ao castigo, conta com um rápido reforço para inibir comportamento desaprovados e aprende a agir conforme a lei – evita o castigo antecipando-o mentalmente e desenvolve mecanismos de inibição frente a atos desabonados socialmente.

Para Mednick, o psicopata aprende mal, ou não aprende, comportamentos ou atos prescritos por leis, porque possui o sistema nervoso vegetativo deficitário: este reage pouco diante do temor ao castigo.

Sarnoff A. Mednick descreve assim a resposta das personalidades psicopáticas: lenta recuperação do sistema neurovegetativo uma vez excitado pelo temor (ao castigo); hipoatividade congênita; planificação do comportamento proibido; reduzida e lenta mitigação de temor ao castigo, escasso ou nulo reforço (recompensa) dos mecanismos inibitórios frente ao comportamento proibido por causa da péssima capacidade de recuperação do sistema neurovegetativo; reduzida capacidade de aprendizagem do comportamento socialmente aprovado. (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, pp. 280-281)


5 Características

A psicopatia apresenta níveis variados de gravidade: leve, moderado e grave, o que faz com que as características do transtorno sejam percebidas de formas variadas, ou seja, nem todos os psicopatas apresentam as mesmas características em número e grau iguais. Alguns podem tender para o cometimento de crimes contra o patrimônio, como o furto e o dano, enquanto outros realizam crimes contra a pessoa, a exemplo do homicídio e dos maus-tratos.

Em 1966, após avaliar os estudos existentes sobre o assunto, Craft detectou dois traços primários na personalidade psicopática: uma incapacidade de responder emocionalmente em situações nas quais se esperaria alguma resposta, tratando-se de uma pessoa normal, e uma irresistível tendência a atuar impulsivamente (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 297). Provêm desses traços primários características secundárias como “agressividade, ausência de sentimentos de culpa, falta de motivação ou impulsão positiva, não influenciabilidade pelo temor ao castigo etc.” (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 297).

O psicólogo espanhol Vicente Garrido Genovês analisou recentes investigações psiquiátricas e constatou que a psicopatia é composta por duas dimensões que dizem respeito à área emocional e ao estilo de vida antissocial. Em relação à dimensão referente à área emocional, o psicopata não possui a capacidade de se vincular emocionalmente aos seus semelhantes, sendo egocêntrico (narcisismo e elevada autoestima), manipulador (loquacidade, encanto superficial), mentiroso (enganos com convicção e sem necessidade) e cruel (total ausência de remorso e culpa, falta de empatia e déficit afetivo).O organismo dos psicopatas não apresenta respostas psicofisiológicas relacionadas com o medo e à ansiedade. A dimensão relativa ao estilo de vida antissocial caracteriza o psicopata como agressivo (necessidade de sentir tensão constantemente), impulsivo (agir ditado pelo capricho ou pelos ímpetos e desejo permanente de alcançar a satisfação imediata), irresponsável (inexiste preocupação com a repercussão negativa de seu comportamento para as pessoas em seu entorno) e insensível (percepção positiva das atitudes cruéis cometidos contra pessoas e animais). Essas características “fazem do psicopata um indivíduo especialmente preparado para patrocinar as empreitadas criminais mais absurdas e para executar delitos com uma violência desproporcional e gratuita” (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 274).

Daniel Goleman evidencia que os psicopatas são “deslavados mentirosos, prontos a dizer qualquer coisa para conseguir o que querem, e manipulam as emoções das vítimas com o mesmo cinismo” (GOLEMAN, 2001, p. 121). “A violência deles parece ser um ato de terrorismo calculado” (GOLEMAN, 2001, p. 122) e tais indivíduos “não se preocupam com punições futuras pelos atos que praticam. E como eles próprios não sentem medo, não há lugar para a empatia – ou piedade – em relação ao medo e à dor de suas vítimas” (GOLEMAN, 2001, p. 123).

No livro Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado, a psiquiatra Ana Beatriz B. Silva pontua os traços distintivos do psicopata: frio, calculista, mentiroso, cruel, charmoso, atraente, dissimulado, desprovido de culpa, remorso e empatia, perverso, transgressor de regras sociais, imoral, impiedoso, com grande poder de convencimento, egocêntrico, insensível, manipulador, incapaz de aprender através da experiência, com grande capacidade de fazer intrigas e usar pessoas com a única intenção de atingir seus objetivos. A autora examina a falta de responsabilidade e os problemas comportamentais precoces dos psicopatas. Os psicopatas não honram obrigações e compromissos, seja no trabalho, nas relações interpessoais e na família. Ana Beatriz B. Silva destaca que a vigilância dos pais e a educação dada por eles podem reforçar as manifestações do transtorno e assegura que “quando em grau leve e detectada ainda precocemente, a psicopatia pode, em alguns casos, ser modulada através de uma educação mais rigorosa” (SILVA, 2010, p. 197). Assim, percebe-se que além do fator orgânico (ou neurobiológico), a psicopatia também sofre influências do meio social no qual o psicopata se encontra inserido.

Robert Hare aponta os aspectos[4] marcantes na personalidade psicopática: superficialidade e manipulação das relações, autoestima grandiosa, mentira patológica, falta de remorso, afeto superficial, falta de empatia, não aceitação de responsabilidade pelos próprios atos, impulsividade, parasitismo em relação aos outros, falta de objetivos realistas, problemas de comportamento precoces, delinquência na juventude, versatilidade criminosa e revogação de liberdade condicional.


6.Psicopatia e doenças mentais

A psicopatia é um transtorno comportamental e não, uma doença mental. Para a Psiquiatria, a psicopatia não é uma enfermidade mental, porque o psicopata não sofre alucinações e delírios, não apresenta manifestações neuróticas nem desorientações quanto ao tempo, ao lugar e às pessoas e não tem intenso sofrimento mental, como ansiedade, depressão ou pânico, características de enfermos mentais.

O neurótico (transtornos neuróticos) é consciente que possui uma enfermidade e sofre por isso, com alta ansiedade. O psicopata não sofre por sua condição nem manifesta ansiedade.

Na psicose (CID-10 – (F20 a F29); 298.X) há perda de contato com a realidade e a quebra com a própria identidade biográfica, acompanhadas de delírios e alucinações, mudanças profundas do estado de humor e transtornos de conduta extremos.

O paranoico sofre delírios crônicos e sistemáticos e, em decorrência disso, acha-se em erro e fora da realidade. O psicopata mente, engana, manipula a realidade, porém não a cria.

O psicopata não tem alucinações ou delírios típicos da esquizofrenia (CID-10 – (F20.X) ; 295.X), na qual há rompimento com a realidade e com a identidade. O psicopata “não tem capacidade para ver-se a si mesmo como os outros o veem, para conhecer como sentem os demais quando o veem, para apreciar os afetos e valores que suscite nos outros a sua existência” (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, pp. 275-276).


7.Conflitos com o sistema legal

Estudos empíricos na cidade de Tübingen, Alemanha, na década de 1960, feitos pelo criminólogo Hans Göppinger, levaram-no a associar comportamentos de determinados indivíduos com personalidades “anômalas”, suas características psíquicas e a projeção de tais atos na vida social. Göppinger concluiu que certos tipos de psicopatas (sem se distanciar da classificação de K. Schneider) podiam ser úteis para a Criminologia, devido à relação de traços da personalidade desses e suas reações na convivência social (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 275).


Devido ao constante comportamento transgressor e antissocial, o psicopata tende a cometer infrações penais. Conforme registra Ana Beatriz B. Silva,


[...] os psicopatas têm total ciência dos seus atos (...) sabem perfeitamente que estão infringindo regras sociais e por que estão agindo dessa maneira. A deficiência deles (...) está no campo dos afetos e das emoções. Assim, para eles, tanto faz ferir, maltratar ou até matar alguém que atravesse o seu caminho ou os seus interesses, mesmo que esse alguém faça parte de seu convívio íntimo. (SILVA, 2010, p. 44)

Para a psiquiatra, “os psicopatas não apenas transgridem as normas sociais como também as ignoram e as consideram meros obstáculos, que devem ser superados na conquista de suas ambições e seus prazeres” (SILVA, 2010, p. 102).

Eles jamais deixarão de apresentar comportamentos antissociais; o que pode mudar é a forma de exercer suas atividades ilegais durante a vida (roubos, golpes, desvio de verba, estupro, sequestro, assassinato etc.). Em outras palavras, a maioria dos psicopatas não é expert numa atividade criminal específica, mas sim ‘passeia’ pelas mais diversas categorias de crimes, o que Hare denomina versatilidade criminal. (SILVA, 2010, pp102-103)

Utilizando a classificação de K. Schneider, o criminólogo Benigno Di Tullio entendeu que há três tipos de psicopatas com relevância penal: os hipertímicos, os lábeis e os histriônicos (GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 275). Da mesma forma, baseando-se na mesma classificação, Jason Albergaria (1999) destaca os seis tipos que mais interessam à Criminologia: os hipertímicos tendem à difamação, à indolência e à fraude; os fanáticos praticam o delito político; os explosivos, delitos contra a pessoa; os frios, homicídio, latrocínio, terrorismo; os vaidosos, injúria, calúnia e fraudes; e os abúlicos, furtos, fraudes e apropriações indébitas.


Segundo Newton Fernandes e Valter Fernandes, “aspectos especiais dos indivíduos psicopatas são ‘traços criminais acentuados’”, como “a deficiência moral e a perversão sexual” (FERNANDES; FERNANDES, 2010, p. 185).

Pelo fato dos psicopatas reagirem com acessos de cólera quando seus desejos não são satisfeitos imediatamente, o traço de agirem impulsivamente os levam a cometer crimes que podem ter consequências desastrosas, tendo em vista que não há conexão lógica entre o sentir, o pensar e o agir desses indivíduos.

Por serem pessoas amorais, sem ética, desprovidas de culpa ou remorso e indiferentes diante da emoção alheia, os psicopatas são propensos á reincidência criminal. Ana Beatriz B. Silva informa que “estudos revelam que a taxa de reincidência criminal (...) dos psicopatas é cerca de duas vezes maior que a dos demais criminosos. E quando se trata de crimes associados à violência, a reincidência cresce para três vezes mais” (SILVA, 2010, p. 153). A autora afirma que por serem “incapazes de aprender através da experiência”, “são intratáveis sob o ponto de vista da ressocialização” (SILVA, 2010, p. 188).


As infrações mais comumente realizadas pelos criminosos psicopatas são:

- Contravenções Penais (Decreto-lei nº 3.688/41 – Lei das Contravenções Penais): porte de arma (art. 19); vias de fato (art. 21); disparo de arma de fogo (art. 28); direção perigosa de veículo na via pública (art. 34); arremesso ou colocação perigosa (art. 37); provocação de tumulto.Conduta inconveniente (art. 41); perturbação do trabalho ou do sossego alheios (art. 42); exercício ilegal de profissão ou atividade (art. 47); crueldade contra animais (art. 64); perturbação da tranquilidade (art. 65) e inumação ou exumação de cadáver (art. 67);


- Crimes (Decreto-lei nº 2.848/40 – Código Penal): homicídio (art. 121); lesão corporal (art. 129); violência doméstica (art. 129, § 9°); maus-tratos (art. 136); difamação (art. 139); injúria (art. 140); constrangimento ilegal (art. 146); ameaça (art. 147); sequestro (art. 148); violação de correspondência (art. 151); furto (art. 155); roubo (art. 157); extorsão (art. 158); dano (art. 163); estelionato (art. 171); abuso de incapazes (art. 173); estupro (art. 213 e 217-A); simulação de casamento (art. 239); explorar prostituição (art. 228 e 229); incêndio (art. 250); poluição de água potável (art. 270 e 271); exercício ilegal da medicina (art. 282); formação de quadrilha (art. 288); falsa identidade (art. 307); peculato (art. 312); crimes contra a administração pública (art. 315, 317, 318 e 322); desobediência (art. 330); desacato (art. 331); corrupção (art. 317 e 333); coação no curso do processo (art. 344); motim de presos (art. 354);


- Crimes contra o mercado financeiro (Lei nº 7.492/86);

- Crimes hediondos (Lei nº 8.072/90);

- Crimes de trânsito (Lei nº 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro);

- Crimes ambientais (Lei nº 9.605/98);

- Crime de lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/98).


Considerações finais


A psicopatia é um transtorno de personalidade e não, uma enfermidade psíquica.


A psicopatia tem particular interesse para a Criminologia, tendo em vista que portadores desse transtorno, pelo fato de serem isentos de empatia e de não aceitarem qualquer ética moral, cultural, familiar, social ou legal, possuem inclinação intrínseca para o cometimento de infrações penais.


Estudiosos consideram, através de inúmeras pesquisas, tanto experimentais, quanto teóricas, que a psicopatia possui um correlato fisiológico (déficit funcional do sistema límbico) e um social (falhas na educação moral e ética e no processo de socialização).


Por serem indivíduos instáveis e pelo fato de não sentirem inibição de origem emocional, são propensos a reincidirem em atos criminosos, fatos que devem ser considerados no momento de conceder liberdade condicional ou redução de pena a um criminosos psicopata.


A construção de uma sociedade solidária e livre de violência passa pela proteção às pessoas em terem o direito de não conviverem com criminosos dissimulados e insensíveis.


Referências Bibliográficas


ALBERGARIA, Jason. Noções de criminologia. Belo Horizonte: Mandamentos, 1999.
ALEXANDER, Franz G.; SELESNICK, Sheldon T. História da Psiquiatria – Uma avaliação do pensamento e da prática psiquiátrica desde os tempos primitivos até o presente. Trad. Aydano Arruda. São Paulo: IBRASA, 1968.
DORSCH, Friedrich; HÄCKER, Hartmut; STAPF, Kurt-Hermann. Dicionário de psicologia Dorsch. Red. Horst Ries. Trad. Emmanuel Carneiro leão e equipe. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. 3. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Trad. Marcos Santarrita. 84. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
GOMES, Luís Flávio; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio. Criminologia: introdução a seus fundamentos teóricos, introdução às bases criminológicas da lei nº 9.099/95 – lei dos juizados especiais criminais. Trad. Luiz Flávio Gomes, Yellbin Morote García e Davi Tangerino. 6. ed. reform., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
HAUCK FILHO, Nelson; PEREIRA TEIXEIRA, Marco Antônio; GARCIA DIAS, Ana Cristina. Psicopatia: o construto e sua avaliação. Disponível na Internet: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1677-04712009000300006&script=sci_arttext. Acesso em 10-05-2011.
MIELNIK, Isaac. Dicionário de termos psiquiátricos. São Paulo: Roca, 1987.
REY, Luís. Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999.
SHINE, Sidney Kiyoshi. Psicopata. São Paulo: Caso do Psicólogo, 2000.
SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. Ed. de bolso. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 28. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
WILLIS, James. Conceitos básicos em Psiquiatria. 5. ed. São Paulo: Organização Andrei Editora Ltda., 1980.


Notas: 

[1] Também conhecida como Classificação Internacional de Doenças – CID 10 (International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems – ICD) é publicada pela Organização Mundial de Saúde e visa padronizar a codificação de doenças e outros problemas relacionados à saúde. A CID 10 fornece códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos ou doenças. A cada estado de saúde é atribuída uma categoria única à qual corresponde um código CID 10. A CID é usada no Brasil e foi adotada como referência para profissionais de saúde do SUS.
[2] O DSM foi elaborado por psiquiatras em grupo de trabalho estabelecido pela Associação Americana de Psiquiatria (American Psychiatric Association – APA). É um manual para profissionais da área da saúde mental que lista diferentes categorias de transtornos mentais e critérios para diagnosticá-los. É usado ao redor do mundo por clínicos e pesquisadores bem como por companhias de seguro, indústrias farmacêuticas e parlamentos políticos. O DSM-IV-TR é a revisão mais recente.
[3] Conforme a opinião de alguns estudiosos, modelos teóricos carecem de verificação empírica.
[4] Itens avaliados no questionário PCL-R formulado pelo referido psicólogo.

Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARAÚJO, Fabíola dos Santos. O Perfil do Criminoso Psicopata. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 jul. 2011. Disponivel em: . Acesso em: 21 dez. 2016.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

ALTERNATIVAS PARA PRESOS



ZERO HORA 10 de novembro de 2016 | N° 18683



EDITORIAL





No mesmo dia em que dois prisioneiros amanheceram algemados numa lixeira em frente ao Palácio da Polícia, o secretário de Segurança, Cezar Schirmer, anunciou ontem a implementação de cinco centros de triagem com o objetivo de ampliar as alternativas para receber presos provisórios. Como o primeiro deles, com capacidade para 96 pessoas, deve ficar pronto apenas em meados de dezembro, é importante que os prazos sejam cumpridos com rigor. Não há como imaginar qualquer redução da insegurança se a polícia não tem sequer para onde levar quem é preso cometendo crimes.

Assim como o anúncio feito em Brasília de que a Força Nacional permanecerá no Estado por tempo indeterminado, também tendem a ser apenas paliativas essas providências idealizadas para atenuar uma situação esdrúxula, que já está virando rotina, de presos em viaturas ou expostos em via pública. É preocupante que a simples construção de espaços para abrigar presos temporários requeira tanto tempo, quando tudo é urgente em matéria de segurança. De acordo com o próprio secretário, se tudo ocorrer dentro do previsto, as medidas anunciadas ontem gerarão 554 vagas adicionais até maio de 2017.

Diante da gravidade da situação carcerária, é preciso que, paralelamente a essas medidas emergenciais, o governo gaúcho se mobilize de fato para enfrentar o déficit de vagas em presídios. Essa é uma questão crucial para que o Estado volte a garantir um mínimo de segurança para os gaúchos.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O pior da gestão político-partidária do direito à segurança pública é a elaboração de medidas paliativas visando conter as críticas contra o governo e atender o clamor da imprensa. Por isto, estas medidas são sempre inadequadas, desperdício de dinheiro público, inoperantes na solução dos problemas e criadoras de mais problemas.As soluções para a execução penal passam pelo envolvimento dos poderes e dos órgãos da execução penal em aplicar e projetar efetivos, ações e investimentos capazes de capacitar a guarda penitenciária, de constituir um departamento de agentes da condicional e de dotar o subsistema prisional de presídios seguros, sob controle, humanos, adequados e distribuídos em nível de segurança para atender os objetivos da execução penal. Ações isoladas do Executivo, desumanas e sem objetivos são ilusórias, paliativas e inoperantes, pois não terão o envolvimento, a solução das mazelas e a força da lei e da justiça.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

PÓS-GRADUAÇÃO CRIMINAL





ZERO HORA 27 de outubro de 2016 | N° 18671


ARTIGOS


POR CLAUDIO LAMACHIA*




Ao longo da última década, tenho acompanhado mais proximamente a realidade do sistema prisional brasileiro. Perdi a conta das vezes em que estive dentro de presídios para vistoriar e por muitas vezes denunciar o quadro caótico que é, infelizmente, a regra no funcionamento do sistema.

O fato é: para que o status quo seja alterado, é fundamental que novas práticas sejam implementadas. Seguir o modelo atual nos levará a um cenário social cada dia mais violento. Muitos dos crimes cometidos no dia a dia têm como origem o ordenamento das facções que hoje comandam as prisões país afora.

Os relatos recentes apontam que, de Sul a Norte, as facções criminosas dominam as penitenciárias, promovendo rebeliões, mortes, gerando um clima cada vez mais tenso e violento, que é refletido nas ruas.

O sistema prisional não pode ser um depósito de pessoas. Sua administração deve ser feita de maneira eficiente, com um volume de recursos condizente com a demanda. É preciso também que se estabeleçam políticas públicas eficientes e permanentes de ressocialização.

O quadro tenebroso de violência urbana – que coloca o Brasil entre as nações mais violentas do mundo – tem como um dos fatores principais a incapacidade do sistema penitenciário de realizar a sua função primordial, que é justamente punir e ressocializar.

Cabe a cada um de nós olhar o tema com mais atenção e compreender que a criminalidade não avança à toa. O poder público vem ao longo dos tempos permitindo que presos de menor potencial sejam mantidos em verdadeiras “escolas do crime”, transformando-os em pós- graduados no que há de pior na nossa sociedade.

O fato é que faltam vagas em casas prisionais – mais do que isso, faltam condições mínimas estruturais para que as vagas existentes auxiliem o Estado no cumprimento pleno da sua função, que é garantir à sociedade que apenados realmente saiam de maneira definitiva do mundo do crime.

No fim das contas, a sociedade vive com sua liberdade tão limitada quanto os presos. Vivemos hoje entre grades e muros opressivos, sem qualquer sensação de segurança.

*Advogado e presidente nacional da OAB


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Gostaria de ressaltar duas citações neste artigo da liderança do maior e mais forte segmento da sociedade organizada na área do Direito - "Perdi a conta das vezes em que estive dentro de presídios para vistoriar e por muitas vezes denunciar o quadro caótico que é, infelizmente, a regra no funcionamento do sistema"; e "No fim das contas, a sociedade vive com sua liberdade tão limitada quanto os presos. Vivemos hoje entre grades e muros opressivos, sem qualquer sensação de segurança". Quer dizer que houve a presença da OAB nas inspeções prisionais em várias oportunidades e que no "fim das contas"  nada é resolvido tanto os presos como o povo são oprimidos. Afinal, no Brasil n"ao existem Leis e Justiça para fazer cumprir as leis e os direitos?

A FALÊNCIA DA SEGURANÇA PÚBLICA E A QUESTÃO PRISIONAL




ZERO HORA 27 de outubro de 2016 | N° 18671


ARTIGOS


POR LUÍS ALBERTO THOMPSON FLORES LENZ*

A FALÊNCIA DA SEGURANÇA PÚBLICA


Da leitura de reportagem de Zero Hora do dia 25/10/2016, intitulada “Alternativas para conter facções”, o sentimento dali proveniente é de completo desânimo e desalento.

Primeiro, porque nela está reconhecido, em letras garrafais, o que todos nós sabíamos, mas não tínhamos coragem de dizer, ou seja, que a mera alusão à transferência dos presos que lideram as facções para outros Estados poderia “alterar o gerenciamento do atual sistema prisional gaúcho – em que os próprios presos regulam o funcionamento de muitas das galerias”.

Isso demonstra, por si só, a falência de todos os órgãos públicos afetos ao encarceramento dos condenados, de qualquer dos poderes e instituições, que “convivem” com tal iniquidade, a qual, salvo melhor juízo, beira a prevaricação.

Não se pode conceber e aceitar que os próprios bandidos detenham o poder dentro de um estabelecimento prisional, ainda que de forma parcial, sob pena de se admitir, no futuro, que eles mesmos fixem as suas penas, prestem informações a respeito de seu comportamento carcerário, decidam sobre a concessão de progressões de regime e benefícios, indiquem o diretor do presídio etc.

Tais tarefas são a própria razão de ser do Estado moderno, sendo que a sua delegação a terceiros, notadamente aos condenados, ensejou a barbárie em que nos encontramos inseridos.

Resta saber quem firmou tal “acordo” de “convivência” com a bandidagem, e quando os gestores públicos esperam romper com essa situação absurda.

Esse, obviamente, é o primeiro passo para o resgate da ordem pública na sociedade brasileira, na medida em que os crimes cometidos aqui fora, em grande parte, são concebidos e arquitetados dentro da própria cadeia.

Para encerrar, faz-se mister advertir que além de melhores condições físicas, só a retomada da autoridade pública pode viabilizar credibilidade ao sistema prisional e segurança para coletividade como um todo.

*Procurador de Justiça


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Segurança pública é um direito e direitos se garantem no Estado Democrático de Direitos pela Força da Lei e da Justiça, não pela força das armas ou pela gestão político-partidária dos presos da justiça. A questão prisional é de responsabilidade direta dos poderes, instituições e órgãos da execução penal que são incumbidos de exercer deveres e responsabilidade na supervisão, na guarda, na custódia, na fiscalização, nas inspeções, na requisição e na apuração de responsabilidade diante das irregularidades e ilicitudes. O Judiciário, que é o poder supervisor e o ordenador do regime penal, deveria parar de lavar as mãos e de justificar erros com a sua omissão, passando exigir das autoridades o cumprimento das leis, o respeito aos direitos humanos os objetivos da execução penal, nas penas da lei. Além disto, entre os órgãos da execução penal estão o MP e a defensoria com incumbências a serem executadas que podem se agregar ao judiciário para exigir providências. Os poderes sabem da gravidade do problema que é público e evidente, mas parece que ninguém quer resolver. 

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

ALTERNATIVAS AO CAOS PRISIONAL NO RS



ZERO HORA 21 de outubro de 2016 | N° 18666 - SEGURANÇA JÁ


SCHIRLEI ALVES

ALTERNATIVAS AO CAOS PRISIONAL



PAINEL RBS reuniu promotor, juiz e secretário da Segurança Pública para discutir soluções às cadeias gaúchas. Déficit de vagas no RS supera 11 mil e, a curto prazo, não há propostas



Possíveis alternativas para amenizar a superlotação carcerária – que chegou ao auge nesta semana quando presos tiveram de ficar detidos dentro de viaturas por falta de vagas no Presídio Central –, diminuir o índice de reincidência e mudar a dinâmica do sistema prisional nos próximos anos foram discutidas ontem no Painel RBS Segurança Já.

Dados do Tribunal de Justiça revelam que 42 a cada cem condenações dadas em Porto Alegre em 2015 foram com réus reincidentes, ou seja, condenados pela segunda vez. Se considerar os presos que passam pelo sistema antes de receber sentença, o índice chega a 70%, afirmam os especialistas. A prática de retornar ao crime é um dos combustíveis para a crise do sistema carcerário do RS, hoje com 11 mil presos além da capacidade.

Mediado pelo editor de Segurança do Grupo RBS e editor-chefe do Diário Gaúcho, Carlos Etchichury, e pelo comentarista da Rádio Gaúcha e colunista de Zero Hora Cláudio Brito, o debate contou com a presença de três convidados: o secretário da Segurança Pública do Rio Grande do Sul, Cezar Schirmer, o juiz da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre Sidinei Brzuska e o procurador de Justiça Gilmar Bortolotto.

O magistrado destacou o caos a que chega o sistema prisional do Estado com exemplo simples. Cerca de 6 mil presos ingressaram no cárcere recentemente. Na avaliação dele, se as prisões continuarem no mesmo ritmo, seria necessário construir um presídio por mês, o que equivale ao investimento de R$ 30 milhões por unidade. Alternativas emergenciais foram tomadas pelo Judiciário ao longo dos anos, mas o principal presídio do Estado continua sendo vulcão prestes a entrar em erupção.

– O problema é recorrente e vem aumentando bastante. Como não há dinheiro (para investir), os presídios lotam, e a cena é essa – diz.

Além da superlotação, Bortolotto lembrou que o Estado perdeu força na ordem dos presídios. As galerias são comandadas por facções, da mesma forma como ocorre na rua. Destacou ainda que o preso, quando deixa a unidade prisional, sai endividado com as organizações criminosas e sem alternativa senão a de reingressar para o crime.

– Quando colocamos excesso de presos, o espaço do Estado se reduz e as facções é que identificam o espaço prisional como de investimento – avaliou.

Schirmer concordou que o sistema atual de encarceramento está em crise e a atribui ao descaso aos governos anteriores. Prometeu apresentar diagnóstico do sistema prisional em até 30 dias e revelou meta audaciosa. Embora seja necessário o investimento de R$ 10 milhões ainda inexistentes, a promessa da secretaria é deixar o Presídio de Canoas (há 2,4 mil vagas ociosas) pronto até o primeiro semestre de 2017, o que ajudaria a desafogar o sistema.

Os três painelistas foram unânimes num aspecto: a solução compreende o envolvimento da comunidade tanto no cuidado dos presos quanto em alternativas de ressocialização.

– A comunidade é fundamental na prevenção e na recuperação não só da segurança pública, mas em tudo que envolve o Estado – disse o secretário.



Falta de vagas em cadeias, presos em viaturas


RENATO DORNELLES


As consequências do caos provocado pela superlotação nos principais presídios e penitenciárias do Estado, que já afetavam a Polícia Civil, atingiram, agora, o policiamento ostensivo. Das 20h de quarta-feira ao final da tarde de ontem, presos em flagrante permaneciam em viaturas da Brigada Militar (BM) e da Guarda Municipal de Porto Alegre, uma vez que as celas da 2ª e da 3ª Delegacias de Polícia de Pronto Atendimento (DPPAs) estavam lotadas.

Os veículos passaram a noite de quarta-feira, a madrugada, a manhã e a tarde de ontem estacionados junto à 3ª DPPA, na Zona Norte. Na viatura da BM, durante boa parte do tempo, policiais militares do 19° BPM escoltaram dois presos por tráfico de drogas. A dupla, conforme os PMs, estava com maconha e armas na Rua Paulino Azurenha, no bairro Partenon. No meio da tarde de ontem, um deles foi levado para o Presídio Central, a partir da abertura de vaga. O outro, permaneceu no carro. Na viatura da Guarda, dois servidores mantinham um detido por assalto a taxista.

A situação expôs PMs, guardas municipais e os presos a situação de completo improviso e sem qualquer estrutura de cárcere. Uma primeira dupla de policiais ficou cerca de 12 horas no local, até trocar o turno, às 8h de ontem. Os guardas municipais foram substituídos após 10 horas. Os presos, durante o período, puderam usar banheiro e beber água, mas não receberam alimentação. Dez presos lotam as celas da 3ª DPPA.

As celas da 2ª DPPA, no Palácio da Polícia, abrigavam, ontem, 18 presos. O delegado Marco Antônio Souza, responsável pelas delegacias de plantão, diz que há riscos de motim.

– Estamos em constante contato com a Susepe tentando dar vazão a alguns presos, colocando-os no sistema penitenciário. A situação é grave – disse.

Um policial da 2ª DPPA, que pediu para não ser identificado, disse que os servidores passam por estresse devido à situação, com presos exigindo remoção mediante ameaças de espancamentos e de mortes dentro das celas.

– As madrugadas são verdadeiro inferno. Os presos batem nas grades o tempo inteiro – relatou.

As celas são descritas como “imundas” e “fétidas”.

DIFICULDADE EM ABRIR VAGAS É RECONHECIDA PELA SUSEPE

A Superintendências do Serviços Penitenciários (Susepe), por meio da assessoria de imprensa, admite problemas e diz que monitora constantemente a abertura de vagas em presídios e penitenciárias, para a remoção de presos de delegacias. Atualmente, segundo o órgão, mais de cem presos estão nessa condição (o número varia, conforme as vagas vão surgindo).

O Presídio Central, maior prisão do Estado, está interditado para novos presos. A medida é adotada por ordem judicial, desde 1995, a cada vez que a população carcerária atinge 4.650 presos, e o Estado descumpre a determinação de remoção de detentos já condenados. A capacidade é de 1,9 mil homens.

Presidente da Associação dos Delegados de Polícia (Asdep), a delegada Nadine Farias Anflor lembra que a situação de presos em celas de delegacias já dura quase um ano, provocando desvio de função e riscos para os policiais.

– De modo geral, policiais acabam tendo de ficar custodiando presos, em vez de atender a população. Sabemos que a Chefia de Polícia está preocupada, mas temos de denunciar para que o Estado tome alguma atitude.

A delegada afirma ainda que, com mais 80 vagas no sistema penitenciário, o problema seria resolvido:

– É absurdo o Estado não conseguir uma solução. E a situação só tem piorado.



SUA SEGURANÇA | Humberto Trezzi

Camburão, a nova cadeia


O repórter-fotográfico Ronaldo Bernardi, de Zero Hora, flagrou na manhã de ontem a nova modalidade de presídio do Rio Grande do Sul, o camburão. Presos são amontoados na traseira de viaturas policiais e ali ficam, ao sol, enquanto aguardam vaga no xadrez da Polícia Civil. Aliás, o próprio cárcere policial deveria ser apenas usado por algumas horas, enquanto o flagrante do criminoso é lavrado. Mas tem se transformado em moradia de presos por dias a fio, uma ilegalidade.

O uso de camburões policiais como prisão é apenas mais uma aberração no cotidiano de carências da segurança pública gaúcha. São vários os motivos, a começar pela superlotação das penitenciárias. O Presídio Central de Porto Alegre guardava na quarta-feira mais de 4 mil apenados e ameaça bater seu próprio recorde de lotação, algo que costuma acontecer ao longo das décadas. Defensores dos direitos humanos e advogados têm sugerido saída para a superlotação: que crimes leves ou de menor potencial ofensivo (como tráfico) não sejam punidos com encarceramento.

Ou que, pelo menos, não sejam prioridade na hora de prender. É razoável. O problema é que está faltando vaga até para crimes graves. Todos os que aguardam, presos, no camburão foram flagrados com arma, em assaltos. Isso, convenhamos, é grave o suficiente para justificar encarceramento. E a lei prevê. Não é possível libertarem ladrões e homicidas sob justificativa de falta de vagas prisionais. É injusto com a comunidade. É ilegítimo. Existe razão melhor para inaugurar novos presídios?


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - DISCORDO!!!!. Há sim solução a curto prazo. E esta solução não parte do "envolvimento da comunidade tanto no cuidado dos presos quanto em alternativas de ressocialização", e sim dos poderes constituídos custeados pelo povo para governar, administrar, legislar e aplicar as leis. Basta cada poder exercer seus deveres e cumprir o previsto na Constituição do RS, e os órgãos da execução penal exercerem de fato e de direitos as atribuições, competências e incumbências previstas na Lei da Execução Penal. Está na hora das autoridades competentes pararem de justificar a própria omissão, descaso e irresponsabilidade, acabarem com o compadrio e a conivência com as irregularidade e ilicitudes cometidas pelo Estado, de empurrar a responsabilidade nos outros e de lavar as mãos para as questões de ordem, justiça e segurança pública.

ZERO HORA - SOLUÇÕES

NOVAS METODOLOGIAS PARA AS CADEIAS
O procurador de Justiça Gilmar Bortolotto sugere que as novas unidades prisionais, como o Presídio de Canoas comecem a atuar com metodologia diferenciada. Os presos ainda não vinculados às facções devem ser separados dos demais. Além disso, a unidade deve promover atividades que ocupem o tempo do preso e oferecer tratamento aos viciados em drogas. Após sair da prisão, o detento também deve ter acompanhamento, com oportunidade de emprego, por exemplo.
– A maioria dos presos são dependentes químicos, com baixa instrução e jovens. Os espaços novos não podem levar os métodos velhos, porque o resultado vai ser o mesmo – completou.
Dentro da mudança de metodologia, o procurador sugere a criação das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac), como ocorre em Nova Lima, em Minas Gerais. O envolvimento da comunidade e o trabalho incentivam a diminuição da reincidência.
EDUCAÇÃO E TRABALHO PARA REDUZIR POPULAÇÃO PRISIONAL
O juiz da Vara de Execuções Criminais, Sidinei Brzuska, acredita que a mudança precisa ser pensada a longo prazo. Em pesquisa que fez nas comarcas onde atuou, o magistrado constatou que a maioria dos presos tem baixa escolaridade. Os detentos com curso superior no Presídio Central, por exemplo, correspondem a 0,03% do total.
– A chance da pessoa com curso superior ser presa é 67 vezes menor do que aquele que tem Ensino Fundamental incompleto. O preso ingressa no sistema na 5ª série e sai com a mesma escolaridade. Não há meta para aumentar o grau de educação. Ele também chega ao presídio sendo usuário de droga e continua sendo lá dentro.
Para o juiz, o governo precisa criar políticas públicas com o objetivo de manter o aluno na escola o maior tempo possível (na foto acima, presos trabalham em Canoas). Para isso, a escola precisa ser atrativa. Depois, esse aluno precisa ter a garantia do primeiro emprego e conseguir manter-se empregado até, pelo menos, os 25 anos. Na avaliação do magistrado, a estratégia diminuiria a população carcerária.
PROMESSAS DO SECRETÁRIO DA SEGURANÇA PÚBLICA
1Entregar o Presídio de Canoas no primeiro semestre de 2017. Embora uma galeria já esteja operando, a unidade necessita de R$ 10 milhões para ficar completamente pronta. Apesar de ainda não ter o investimento disponível, o secretário afirma que a obra é prioridade do Piratini e que, por isso, terá verba garantida.
Entre as ações necessárias para funcionar, a unidade precisa de sistema de água e esgoto, cercamento da área, implantação de ruas no entorno, contratação de novos servidores, mobiliário, unidade de saúde e bloqueador de celular.
-O Presídio de Canoas é ruptura com o sistema caótico. É uma visão diferenciada, superior e de qualidade do sistema prisional, vai acabar com aquela mistura de presos de diferentes periculosidades – avaliou.
2Está em estudo a possibi-lidade de reconstruir as unidades caóticas do Estado. A ideia é trocar propriedades do governo por áreas construídas pela iniciativa privada. No Presídio Central, por exemplo, as galerias seriam destruídas e substituídas por novas construções. A iniciativa privada entraria com a obra em troca de terrenos cedidos pelo Estado.
-Reformar é mais caro do que fazer outro. Constrói lá mesmo. A área do Central é degradada, o espaço não tem valor de mercado para a iniciativa privada.
3 Grupo de trabalho criado pela Secretaria de Segurança Pública pretende entregar diagnóstico do sistema prisional gaúcho e apontar soluções em até 30 dias. O decreto criando o grupo foi publicado na quarta-feira, mas republicado ontem para incluir integrantes do Poder Judiciário. Após a corregedoria lamentar a exclusão da instituição, o decreto foi revisto.
Fazem parte do grupo a Secretaria da Casa Civil, Secretaria-Geral de Governo, Secretaria de Segurança Pública, Secretaria da Fazenda e Superintendência dos Serviços Penitenciários. Foram convidados representantes do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas, do Ministério Público e da Procuradoria- Geral do Estado.

ZERO HORA. PARTICIPANTES DO PAINEL

SIDINEI BRUSKA
Juiz da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, atuou em diferentes comarcas do Estado e está há cerca de duas décadas trabalhando nesta área.
GILMAR BORTOLOTTO
Procurador de Justiça, esteve 17 anos na Promotoria de Justiça de Controle e Execução Criminal de Porto Alegre.
CEZAR SCHIRMER
Ex-prefeito de Santa Maria, assumiu a Secretaria da Segurança em setembro, em meio à onda de violência que segue atingindo o Estado.

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

PLANO ESTRATÉGICO SITUACIONAL PRISIONAL DO RS

ZERO HORA, DO LEITOR, SOBRE ZH...


JORGE BENGOCHEA


Tem razão o Fred Wilson Jeckel. "É preciso mudar para leis mais fortes e criar presídios adequados", pois o Estado Democrático de Direito exige a força da lei e da justiça, sendo que as polícias e a execução penal são subsistema de justiça criminal.

 Defendo a implementação de um Plano Estratégico Situacional Prisional para estabelecer em conjunto com os poderes e órgãos da execução penal as políticas, programas, ações e objetivos para a execução penal no RS, tratando como um subsistema de justiça criminal.

Entre elas, a designação das unidades prisionais em níveis de segurança, sendo a mais baixa para os Centros Técnicos Prisionais Municipais, aos moldes das APAC, conveniados com o mercado local para abrigar presos de baixa periculosidade e dispostos a se recuperarem. Unidades prisionais de nível médio para abrigar presos provisórios e unidades prisionais de saúde para tratar dependentes químicos. E Presídios de Segurança Máxima para abrigar lideranças e presos perigosos, sob controle total e localizados em áreas rurais e longe de aglomerados humanos.

Além disto, compactuo com a ideia do Juiz Felipe Keunecke de Oliveira de passar o subsistema prisional para a administração do Poder Judiciário, já que os presos ficam a disposição e supervisão deste poder.

CUMPRA-SE A LEI

Os poderes e órgãos da execução penal não podem se omitir em exercer seus deveres, competências, atribuições e incumbências previstas na Lei de Execução Penal. Chega de conivência, compadrio, jogo de empurra e lavar as mãos para as questões de ordem, justiça e segurança pública. Doa a quem doer.


A Constituição do RS é clara em seus objetivos e prioridades. Os poderes não podem aceitar que a desrespeitem sem ser responsabilizado...







EXECUÇÃO PENAL CAÓTICA, ESTADO IRRESPONSÁVEL E OMISSO.

 

Ontem na PUC, assisti o documentário Central que retrata a realidade do Presídio Central de Porto Alegre, de Tatiana Sager e Renato Dorneles que debateram sobre o longa. Parabenizo a eles pelo trabalho magnífico, expondo a realidade de um submundo de desumanidade e degradação que atenta contra os interesse público, judicial e social.

É uma crítica contundente contra poderes e órgãos da execução penal que se mostram irresponsáveis, omissos e negligentes em seus deveres, competências, atribuições e incumbências neste subsistema da justiça criminal, permitindo o tratamento de pessoas como animais depositados em ambientes medievais controlados pelos próprios presos, negociados pela administração, mediados pelos juízes e promotores, esquecidos pela defensoria e dominados pelas facções, com descaso absoluto dos Governantes que dispõem a alimentação e as condições necessárias e não investem nas políticas penitenciárias para atender os objetivos da execução penal previstos em lei, tudo com a conivência dos deputados que deveriam representar o povo fiscalizando e cobrando a responsabilidade do Executivo. 

Não é a toa o crescimento da criminalidade e da violência nas ruas, tendo um Estado (diga-se poderes legislativo, executivo e judiciário, e os órgãos da execução penal) que não dá a mínima atenção para recuperar os presos da justiça, a maioria envolvida em drogas sem direito a tratamento da dependência e sem oportunidades para sair do crime que se adaptam e se submetem ao modelo oferecido pelas autoridades, saindo profissionais, matadores e líderes de facção. Azar da população e dos policiais que ousarem enfrentá-los.

Aproveito para parabenizar a diretora Tatiana Sager, o roteirista Renato Dornelles e toda a equipe. Vocês produziram um trabalho de extremo interesse público, social e judicial, que deve servir de alerta a todos e de cobrança do povo dirigida aos poderes, órgãos da execução penal e autoridades competentes para que saiam da zona de conforto onde vivem em estado de anomia e compadrio, e passem a buscar soluções para um problema que há décadas vem sendo denunciada publicamente e nada é feito. Está na hora de apurar responsabilidade, requerer providências, denunciar as irregularidades, processar e punir os culpados por esta situação desumana que viola os direitos humanos e atenta contra a vida, o patrimônio e a liberdade das pessoas, contra a ordem pública, contra a justiça, contra o direito de todos à segurança pública e contra o trabalho e a vida dos policiais. 

Chega de omissão!!!



Sobre o documentário:

O documentário premiado internacionalmente é baseado na obra Falange Gaúcha: o Presídio Central e a História do Crime Organizado no RS, de autoria do jornalista Renato Dorneles. No filme, representantes do Poder Judiciário, do Ministério Público e pesquisadores analisam a situação crítica da prisão, considerada a pior do País pela CPI do Sistema Carcerário, da Câmara dos Deputados, em 2008, e alvo de denúncias de violações dos direitos humanos feitas à Organização dos Estados Americanos (OEA), em 2013. Policiais militares, familiares e, principalmente, presos falam sobre o cotidiano da cadeia, descrevendo graves problemas como a superlotação. Imagens inéditas mostram o interior das galerias, onde os guardas não entram, e os próprios presidiários, organizados em facções, detêm o comando. (PUCRS)


 http://www.pandafilmes.com.br/portfolio/central/


A PROPÓSITO: PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR: 

- Por que a defensoria não requer providências? 

- Por que o Ministério Público não denuncia e exige a apuração de responsabilidade e o devido processo legal? 

- Por que o Juizado de Execução não apura responsabilidade? 

- Por que o Tribunal de Justiça não exige responsabilidade do Governador? 

- Por que a Assembleia Legislativa nunca responsabilizou os governadores pelas condições que oferece na execução penal, descumpre a lei, desvia de finalidade efetivos da BM, e atenta contra os direitos humanos?

- O que impede os poderes e os órgãos da execução penal de exercerem seus deveres, competências, atribuições e incumbências previstas na Lei de Execução Penal e atender os objetivos previstos na Constituição do RS?

Como não é cobrado nas penas da lei, a impunidade vence e o "responsável" nada faz mudar... 

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

MAIS TEMPO NA PRISÃO



ZERO HORA 14 de outubro de 2016 | N° 18660


EDITORIAIS





O governo já negocia com os presidentes da Câmara e do Senado o envio ao Congresso de alteração na Lei de Execuções Penais com o propósito de aumentar o tempo de cumprimento de pena para condenados por corrupção e crimes violentos ou que representem ameaça grave. O ponto básico é uma alteração no regime de progressão de penas, estendendo da exigência atual de um sexto para metade da condenação o prazo para que o condenado tenha direito a sair do regime fechado. Considerando-se o atual contexto de violência do país e a impunidade gerada pelo regime de progressão de pena, a proposta é bem-vinda, mas precisa ser acompanhada de pelo menos duas ações urgentes: o aumento de vagas nos presídios e a melhora das condições carcerárias.

O caos no sistema prisional e a resistência do poder público em enfrentar a situação tornam oportuna também a intenção do Planalto de permitir que mais condenados por crime sem violência ou grave ameaça cumpram pena de prestação de serviços à comunidade. O que não faz sentido é a situação atual, na qual quem é punido por crimes como estelionato, por exemplo, fica encarcerado por período equivalente ao de quem cometeu infração mais severa, como embolsar elevadas somas dos contribuintes.

O aumento no prazo de encarceramento em casos específicos também é uma bandeira do Ministério Público Federal, que incluiu a sugestão no âmbito de um pacote de 10 medidas contra a corrupção. A dúvida é saber se o Congresso, onde já tramita proposta semelhante desde 2013, será receptivo à mudança e se os governantes conseguirão ampliar as vagas nas prisões.

A imposição de maior rigor na execução das penas é um aspecto importante para o país reduzir a impunidade. A sociedade precisa acompanhar de perto a evolução dessa proposta.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - No Estado Democrático de Direito, a ordem pública, a justiça e o direito de todos à segurança pública não podem ser tratados com política partidária, nem com paliativos e tampouco de maneira corporativa, isolada e pontual. O Brasil precisa de leis claras, objetivas e severas para serem executadas e aplicadas por sistemas de justiça criminal federal e estaduais que envolvem o judiciário, o ministério público, a defensoria, as forças policiais e a execução penal. Um sistema com competências, atribuições, limites e objetivos definidos em lei, livre da ingerência político-partidária e capaz de controlar, fiscalizar e cobrar responsabilidade uns dos outros. O resto é enxugar gelo e ilusão para o povo. 

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

O CAOS DO SISTEMA PENITENCIÁRIO



ZERO HORA 13 de outubro de 2016 | N° 18659



CEZAR ROBERTO BITENCOURT*



Os estabelecimentos penitenciários brasileiros, em quase sua totalidade, não satisfazem os requisitos mínimos exigidos pela Lei de Execução Penal. Essas carências históricas nunca indignaram os fiscais do sistema, pelo menos nada disso nunca veio a público. A violência das prisões, o empilhamento de presos, a falta de vagas, a inexistência de celas individuais, a insuportável insalubridade e desrespeito à dignidade humana são a tônica de todas as prisões brasileiras, que convivem com a impune omissão do poder público, que nada faz, e o complacente olhar do Poder Judiciário e do Ministério Público.

Conhecemos a temática penitenciária – academicamente e profissionalmente: fizemos doutorado nessa área e tivemos oportunidade, nos idos da década de 1980, de trabalhar como promotor de Justiça na Vara de Execuções Penais de Porto Alegre. De lá para cá, o sistema penitenciário nacional só piorou, e muito, tanto que o Presídio Central de Porto Alegre transformou-se em um novo Carandiru, que envergonha a todos os gaúchos.

Sabe-se, hoje, que a prisão reforça os valores negativos do condenado. Até para sobreviver nesse meio altamente criminógeno, o indivíduo é obrigado a optar de imediato por uma facção criminosa, que é o vestibular para o crime.

A sociedade brasileira é coautora quando manda para a prisão alguém que dela não precisa, assim, exemplificativamente, quando lhe cabe pena alternativa (é um direito do cidadão), mas erroneamente o sistema judicial – que nos representa – não substitui determinada pena e impõe o recolhimento ao sistema prisional.

Soma-se a isto o fato de a sociedade brasileira fechar todas as portas para o egresso do sistema penitenciário, isto é, para aquele que sobreviver, e de lá sair com vida. Esse indivíduo não tem o apoio de ninguém, principalmente do Estado, que o condenou e lhe prometeu ressocializá-lo no interior das prisões.

Urge que repensemos o sistema prisional e a aplicação das leis, que encontremos novas penas compatíveis com os novos tempos, sob pena de aumentarmos ainda mais o caos na segurança pública em que nos encontramos.

*Advogado criminalista, doutor em Direito Penal pela Universidade de Sevilha


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Muito bom e pertinente este artigo. É certo que "os estabelecimentos penitenciários brasileiros, em quase sua totalidade, não satisfazem os requisitos mínimos exigidos pela Lei de Execução Penal", que alimentam "a violência das prisões, o empilhamento de presos, a falta de vagas, a inexistência de celas individuais, a insuportável insalubridade e desrespeito à dignidade humana", tudo diante da "impune omissão do poder público, que nada faz, e o complacente olhar do Poder Judiciário e do Ministério Público". Também está correto ao afirmar sobre "o fato de a sociedade brasileira fechar todas as portas para o egresso do sistema penitenciário, isto é, para aquele que sobreviver, e de lá sair com vida". Também tem toda a razão ao alertar que "urge que repensemos o sistema prisional e a aplicação das leis (...) sob pena de aumentarmos ainda mais o caos na segurança pública em que nos encontramos". Agora, não se pode colocar a culpa na sociedade, mesma que apática, quando paga muito caro para manter instrumentos legislativos e judiciais que deveriam coibir o crime pela força da lei e da justiça, penalizando com rigor e com uma execução penal segura, digna, humana, objetiva e responsável.  

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

O STF E A PRISÃO DO CONDENADO

Resultado de imagem para COLARINHO BRANCO PRISÃO


ZERO HORA 12 de outubro de 2016 | N° 18658


ARTIGOS


POR LUÍS ALBERTO THOMPSON FLORES LENZ*




Com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal ratificando o início do cumprimento da pena para quem for condenado em tribunal de segundo grau, reacendeu-se a discussão a respeito da violação ao princípio constitucional da presunção de inocência.

Inicialmente, deve-se ressaltar que o dogma em questão é relativo, não sendo aceitável que ele se sobreponha à condenação judicial em duas instâncias, sob pena, inclusive, de se entender que o juízo condenatório desses magistrados não serviu para nada.

Isso, notadamente em uma situação de verdadeira guerra civil no país, em que as organizações criminosas comandam, além dos presídios, inúmeras áreas urbanas das cidades brasileiras, instituindo pena de morte, tribunais de exceção, toques de recolher, banimento de cidadãos etc.

São locais onde o Estado brasileiro perdeu integralmente a soberania, sendo completamente sobrepujado por essas facções, que fazem leis, instituem taxas, criam as suas milícias e aplicam penas à revelia das autoridades nacionais.

Basta lembrar que em hipótese análoga, de guerra civil, um dos maiores homens públicos de todos os tempos, o presidente Lincoln, suspendeu inclusive a sagrada medida do habeas corpus, nas regiões de hostilidade, durante a guerra de secessão.

O que não é aceitável, vale a pena insistir, é persistir na adoção de uma equação perversa, na qual o acolhimento infinito da presunção de inocência, somado à morosidade do sistema judicial brasileiro, leve à perpétua impunidade de bandidos e facínoras, em detrimento do anseio de toda a sociedade.

O mero caos no sistema prisional não impede a adoção dessa medida. Isso porque, assim como a constatação de que alguns hospitais e escolas públicas no Brasil estão completamente degradados nunca impediu que nós remetêssemos as nossas crianças e os doentes para tais ambientes inóspitos, seria um verdadeiro contrassenso imaginar que, para bandidos, tivéssemos de ter presídios de Primeiro Mundo.

*Procurador de Justiça


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É surreal a argumentação para não prender e para soltar criminosos usando a execução penal caótica, desumana e irresponsável aplicada no Brasil. Principalmente sabendo que esta "situação de verdadeira guerra civil no país, em que as organizações criminosas comandam, além dos presídios, inúmeras áreas urbanas das cidades brasileiras, instituindo pena de morte, tribunais de exceção, toques de recolher, banimento de cidadãos", é produto de um Estado que alimenta o crime com com seus legisladores permissivos e com uma justiça leniente que lavam as mãos para as questões de ordem pública, não melhorando as leis do país, não fiscalizando e nem apurando responsabilidade pela caos prisional, conforme determina a lei.

sábado, 8 de outubro de 2016

STF E O SISTEMA CARCERÁRIO



ZERO HORA 08 de outubro de 2016 | N° 18655

OUTRA VISÃO | ANDRÉ LUÍS CALLEGARI



POR ANDRÉ LUÍS CALLEGARI*



A polêmica sobre a execução provisória da pena foi julgada na última quarta-feira. O Supremo Tribunal Federal ratificou o entendimento de que após o reexame do recurso por um órgão colegiado já será possível o início do cumprimento da pena determinada pelo juiz de piso.

O fato de alguns recursos serem meramente protelatórios pesou a favor da execução provisória, bem como o fato de que, em vários países, é comum a execução da pena após a decisão de uma corte superior. Contra a decisão tomada pela maioria, um dos principais argumentos era a presunção da inocência, que seria desrespeitada caso executada provisoriamente a pena.

O argumento baseado na comparação com outros países é frágil, eis que esses sistemas citados como paradigma contemplam uma segurança jurídica desde a investigação até o julgamento final, onde todos os órgãos estatais são bem aparelhados e dotados de um equilíbrio de controle que permite uma paridade de armas no julgamento dos processos, fato esse que não é regra absoluta no Brasil.

Ao contrário de alguns dos países citados nas declarações de votos, nosso sistema de cumprimento de penas está colapsado, um dos piores da América Latina. Não há vagas nos presídios, as pessoas dormem amontoadas. Há rodízio para comer e dormir e o controle das casas prisionais pelas facções criminosas. O sistema semiaberto faliu e, no aberto, não há mais lugar também. O próprio CNJ tem esses dados e a contradição do recente julgamento do STF reside justamente aqui, ou seja, reconhece que o sistema faliu, porém, quer mais gente dentro dele. Qual será a mágica que será feita para colocarmos todos os condenados em segunda instância na prisão?

A decisão do Supremo Tribunal Federal não trouxe uma solução, mas, sim, delegou ao Executivo a nada grata missão de criar vagas em todo o sistema carcerário para atender a essa nova demanda. Esse imbróglio, criado em nome do enfrentamento à impunidade no Brasil, trará à tona casos ainda mais graves do sistema carcerário falido.

*Advogado criminalista e professor de Direito Penal


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - A polêmica só existe porque ninguém se atreve a apurar a devida responsabilidade pelo colapso no "nosso sistema de cumprimento de penas", que realmente é desumano, inseguro, sem controle, dominado pelas facções e "um dos piores da América Latina". O STF e o CNJ não podem delegar ao Executivo a missão de criar vagas para atender a demanda, porque esta atitude é de omissão, de jogo de empurra e de lavar as mãos para as questões de ordem pública e para a questão do preso cuja supervisão é do Poder Judiciário, ao qual incumbe também a apuração de responsabilidade e o devido processo legal para punir o culpado por esta "colapso". Infelizmente, o que mais se vê é o uso deste "colapso"  para soltar os presos e devolver a bandidagem às ruas para terror da população, para criar leis permissivas favorecendo os criminosos e para criar medidas alternativas sem estrutura de execução e de fiscalização, estimulando a impunidade e a reincidência ao invés de reeducar, ressocializar, reintegrar os apenados e exigir dos poderes e órgãos competentes responsabilidades num subsistema  prisional humano, seguro e objetivo.

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

SÃO OS PRESOS QUE MANDAM



ZERO HORA 07 de setembro de 2016 | N° 18628


RENATO DORNELLES



SEGURANÇA JÁ




Se havia alguma dúvida, não existe mais: as grandes galerias do Presídio Central, que concentram centenas de presos (em pelo menos uma delas há cerca de 500), são totalmente controladas pelas facções criminosas. Até aqui, havíamos assistido a várias demonstrações de força, mas nenhuma como a de ontem, quando os autointitulados “Bala na Cara” bateram de frente com o Judiciário, ao não permitir a saída de um preso provisório para uma sessão no Tribunal do Júri.

Situações como essa tendem a se repetir e a se agravar enquanto o Estado, com o aval de boa parte da sociedade, mantiver como única preocupação em relação ao sistema carcerário a segregação dos presos, como se o simples afastamento dos criminosos desse garantias de segurança à sociedade livre. Sobre isso, pergunto: existem muros e grades suficientemente altos a ponto de isolar por completo os presidiários? Não!

O próprio funcionamento do Central comprova isso. A começar pela distribuição dos presos. Não é o Estado que define em qual galeria cada um deles vai ficar. Para evitar o risco de misturá-los com grupos rivais, são distribuídos conforme a facção a qual pertencem.

Ou seja: se tiver ligação com os “Bala na Cara”, será colocado na terceira ou na segunda galerias do pavilhão F, dominada por esse grupo. Se for dos “Manos”, irá para a segunda ou terceira do pavilhão B, e assim sucessivamente. Isso, com a anuência da direção do presídio, do Ministério Público e do próprio Judiciário.

Em outras palavras, as galerias do presídio são forma de organização das facções. Cada uma tem um plantão (ou prefeito, na linguagem dos presos), que faz os contatos com a guarda, a direção do presídio, a Susepe e a Justiça. Em nome da galeria, faz reivindicações, encaminhamentos para assistência médica, transferências. Já houve várias denúncias de cobranças, por parte desses prefeitos, de pedágios para que as demandas fossem providenciadas. Um exemplo ocorreu há uns três anos, com exigência de taxa para acesso à Defensoria Pública. Isso comprova o controle exercido pelo plantão, ou prefeito, na figura do líder da facção ou de alguém nomeado por ele. Para este, quanto mais lotada a galeria, melhor, pois maior será a arrecadação.

O descontrole pelo Estado no interior dos pavilhões, eventuais ocorrências de corrupção, falhas na segurança (seja na entrada de visitantes, seja junto aos muros do presídio), permitem que armamento seja utilizado pelos líderes para a manutenção da ordem, e que o tráfico de drogas seja atividade corriqueira na prisão.

É importante salientar também que o Estado não fornece roupas, material de higiene e de limpeza aos apenados. Esses itens, somados a gêneros alimentícios (uma vez que a alimentação fornecida pela casa é considerada precária), são supridos pelas facções, que cobram por isso. O pagamento, pelos presos, é feito com dinheiro levado por familiares em dias de visitas. Caso isso não ocorra, fica uma dívida, que é cobrada após a progressão de regime ou libertação do detento. A quitação do débito, então, é feita por meio de crimes, como homicídios encomendados, roubos de veículos, assaltos a banco, a residências.

É importante frisar: as facções que atuam nos presídios têm correspondência com grupos do lado de fora, em determinadas regiões da cidade. Apesar disso, a guerra não se desenvolve na prisão, onde os líderes dos bandos, numa espécie de pacto, convivem pacificamente. A ordem é “bronca da rua deve ser resolvida na rua”. Toda e qualquer morte pensada no interior da cadeia deve ser consumado fora dela. Isso explica, em parte, o alto índice de homicídios na Região Metropolitana.

Em suma, em grandes presídios superlotados, como o Central, as facções se fortalecem, arrecadam e comandam crimes praticados do lado de fora. De outra parte, o Estado mantém sua meta de apenas segregar os presos (não investindo na ressocialização, por exemplo), exigindo apenas que não matem, não fujam e não realizem rebeliões, mantendo falso aspecto de calmaria e controle do sistema.

Enquanto isso, a sociedade livre paga um alto preço.