quinta-feira, 26 de março de 2009

A Justiça e o Cárcere - Uma relação que não zela os Direitos Humanos e não pune o descaso e as violações




Parabéns à ZH e ao repórter Daniel Scola. Há muito tempo ZH e os demais veículos de comunicação em todo o Brasil vêm denunciando a calamidade nos presídios. Há um descalabro administrativo e um descaso com os direitos humanos promovidos pelo Executivo na custódia dos apenados, com a devida conivência e tolerância do Judiciário, que é o órgão supervisor da execução penal. Como ninguém se importa com as denúncias, as violações e o sucateamento continuam e os responsáveis permnacem atuando impunemente.

O Judiciário, com sua burocracia, morosidade, corporativismo, tolerância e medidas terapeuticas e alternativas, vem se distanciando dos presídios como se a situação dos apenados dentro dos cárceres não fossem da sua inteira responsabilidade. Ora, quem sentencia e manda prender? Quem manda soltar? Quem determina o regime de prisão? e quem concede os benefícios e licenças? Todos estes atos, entre outros, na execução penal é competência indelegável do Poder Judiciário. Ao Poder Executivo imcumbe apenas a custódia do apenado objetivando a sua reinclusão na sociedade, com a devida supervisão direta do Poder Judiciário.

Portanto, já é hora do Poder Judiciário assumir de fato e de direito suas obrigações na execução penal como supervisor que é. A primeira medida é promover um diagnóstico da calamidade prisional, apurar as condições caóticas e responsabilizar a Chefia do Executivo por violações contra os direitos humanos, descaso administrativo e sucateamento dos presídios, por negligenciar na custódia, impedir uma execução penal digna e humana e descumprir os objetivos da pena. Esta ação penal, por certo, obrigará o Executivo a tomar medidas para se livrar de uma possível punição, construindo novas instalações e executando uma custódia dentro dos princípios democráticos e humanos, objetivando a ressocialiação e reinclusão do apenado na sociedade e no mercado de trabalho.

O Judiciário não pode mais continuar com medidas paliativas, superficiais e imediatistas como aquelas em que manda interditar presídios ou soltar presos devido à superlotação ou outros problemas. Os magistrados brasileiros não podem mais se comportar como "Pilatos", lavando a mãos para esta questão, sob pena de se envolverem ainda mais nesta vergonhosa política prisional praticada no Brasil.

No momento em que aplicarem a lei nos governantes, esta situação melhorará.

A PROPÓSITO - A respeito da afirmação do juiz Sidinei Brzuska que "se nada for feito, em um ano e meio, no máximo, a PEJ vai se igualar ao Central", pergunto se Poder Judiciário já propôs algum projeto ao Legislativo para:

- mudar a constituição, deixando-a mais enxuta para limitar as intervenções do STF e fortalecer a decisão dos tribunais regionais, encerrando neles a maioria dos conflitos jurídicos?

- criar os juizados de garantia para reduzir a burocracia, extinguir o IP, agilizar os processos e aproximar o judiciário dos delitos, das polícias, das defensorias, do setor prisional e do MP?

- aumentar o número de juizes criando estes juizados em todos os municípios do Brasil, para aproximar o judiciário dasociedade?

- reduzir prazos, recursos e instâncias para transitar em julgado com maior celeridade de forma a desafogar os presídios?

- responsabilizar o Executivo por violação de direitos humanos ao manter sob tais condições pessoas apenadas pela justiça?

- responsabilizar magistrados, promotores e defensores públicos pela omissão e tolerância diante da ação do Executivo que mantém condições insalubres, insegurança, ociosidade, permissividade e o desmando dentro das casas prisionais?

- criar serviços para monitorar, controlar, fiscalizar e acompanhar os benefícios penais concedidos pelo magistrado?

- rever o texto constitucional referente aos dispositivos que estimulam a impunidade e prejudicam o ação coativa da justiça?

- rever o texto constitucional tornando obrigatório o trabalho dentro das prisões?

- criar dentro do Estado (envolvendo os três Poderes) um sistema de ordem pública que tenha salvarguardas fortalecidas, menor burocracia e possibilite a integração ágil e técnica dos processos preventivos, investigativos, pericial, de contenção, de ampla defesa, prisionais, monitoramento e tratamento das dependências e desvios?

Estas soluções, com certeza, agilizariam os julgamentos, reduziriam a população carcerária, obrigariam a construção de novos presídios e evitariam as condições desumanas praticadas nas casas prisionais.

Ou segundo Rodrigo Puggina, Coordenador do Movimento pela Consciência Prisional, - "Alguém acha, realmente, que não seremos atingidos, ou que vamos melhorar a segurança pública tratando os apenados de forma desumana?"

segunda-feira, 2 de março de 2009

Negligência estatal ameaça reativar cárcere em delegacias no RS





A notícia publicada em Zero Hora do dia 01/03/2009 e assinada pelo Humberto Trezzi referente à possibilidade de reativação das cadeias de depelacias de Polícia é de arrepiar.

O RS é um dos seis Estados que não têm presos cumprindo pena ou mesmo prisão provisória em delegacias, mas existem, pelo menos, 53.125 brasileiros trancafiados em delegacias. "Se os presídios brasileiros são covis decrépitos, o que dizer das celas existentes nas delegacias? Nelas inexistem camas ou colchões, vasos sanitários, cobertas ou sequer um banquinho, pequenos confortos garantidos nas penitenciárias. Pois nestes locais, no xadrez das DPs, está trancada 12% da população carcerária brasileira, gente com prisão decretada ou até sentença condenatória."

A ameaça está de volta. "Semana passada, por 48 horas, seis presos em Caxias do Sul e Flores da Cunha permaneceram aprisionados nas precárias carceragens da Polícia Civil, pela singela razão de que não existem vagas nos presídios da serra gaúcha. Por pressão dos próprios policiais, que não querem voltar a ser carcereiros, o juiz da Vara de Execução Criminal (VEC) da capital gaúcha Sidinei Brzuska permitiu que os detentos fossem transferidos para o Presídio Central de Porto Alegre. A manutenção de presos em delegacias fere pelo menos três artigos da Lei de Execução Penal (LEP), que regula os estabelecimentos prisionais brasileiros. Ela determina que os apenados cumpram pena ou prisão provisória em presídios, que os detentos sejam alojados em celas individuais dotadas de lavatório e que presos primários sejam separados dos reincidentes. Para quem conhece os amontoados humanos que são as celas das DPs, onde não há sequer espaço para todos deitarem no chão, a norma soa como piada. Mas não é, é um direito legal do prisioneiro, sistematicamente desrespeitado."

A reportagem aponta o Paraná como "o pior exemplo do Brasil nesse assunto. Dos 36,5 mil presos naquele Estado, 13,3 mil estão em delegacias – mais de um terço. Detalhe: 3,5 mil são condenados e, legalmente, deveriam estar em penitenciárias. A média de um preso em delegacia para cada três encarcerados se repete nos Estados de Minas Gerais e Maranhão. Além de desrespeitar direitos dos presos, a colocação de detentos em delegacias traz risco para a sociedade. O Ceará registrou, em 2007 e 2008, cerca de 1,3 mil fugas de presos de carceragens de delegacias. Rebeliões em DPs são bem mais fáceis de acontecer do que em presídios, lembra o delegado aposentado e atual presidente da Associação de Delegados de Polícia do Rio Grande do Sul, Wilson Müller Rodrigues."


"O temor da volta das masmorras - Escuras, fétidas e úmidas, as celas das delegacias de Porto Alegre que guardavam presos até a década de 80 eram verdadeiras masmorras. Ali conviviam presos políticos e estelionatários, ladrões de galinha e assaltantes notórios, delinquentes primários e veteranos em delitos, todos igualados num cubículo infernal, descreve o delegado aposentado Ivair Maynart, que começou a trabalhar na polícia nos anos 70 e chefiou DPs onde eram guardados presos. O mais conhecido e maior era o porão da 8ª DP, em Petrópolis, chamado de Jumbo. Outro Jumbo existia na 13ª DP (Cavalhada). Uma terceira prisão foi improvisada na Divisão de Investigações (DI, hoje extinta), onde funciona a Delegacia de Homicídios, na Avenida Ipiranga. Existiam ainda celas na 2ª DP (Azenha), 4ª (São Geraldo) e 6ª (Ipanema). No segundo andar do Palácio da Polícia, na Ipiranga, ficavam as celas do temido Departamento de Ordem Política e Social (Dops). Agora, esse xadrez é ocupado por policiais detidos por suspeita de cometer delitos.(...) Foi em junho de 1981 que juízes criminais determinaram o esvaziamento das celas de delegacias de Porto Alegre, exemplo logo copiado no Interior. Foram libertados presos condenados (e que não deveriam estar ali, cumprindo pena) e aqueles que sequer tinham prisão decretada, em situação ilegal. É que, em época de regime militar e antes da Constituição de 1988, os policiais podiam prender primeiro e depois requisitar a ordem de prisão ao juiz. Enquanto aguardavam resposta, os detentos ficavam no xadrez da delegacia. Muitas vezes, por dias ou até semanas. Havia também a prisão para averiguação, na realidade uma detenção que contrariava a lei, apenas para checar uma suspeita sobre alguém. Foi o juiz Günther Radke, revoltado com o desaparecimento de um preso, quem determinou o esvaziamento de todos as celas de DPs de Porto Alegre, até que o detento aparecesse. Os magistrados tinham sido informados de que policiais faziam um rodízio de presos pelas delegacias, para que não fossem localizados, enquanto eram interrogados. Irritado, num só dia o juiz Radke determinou que fossem libertadas 250 pessoas detidas em delegacias. A partir daquele momento, só ficavam presas em dependências da Polícia Civil pessoas que tivessem prisão temporária ou preventiva decretada – sendo que, no último caso, o sujeito era logo enviado ao presídio.(...) Na década seguinte, os presos continuaram ocupando xadrez, mas apenas por curtíssimo período de tempo – uma ou duas noites, até prestar depoimento ou concluir diligências de investigação. Até houve uma sugestão de juízes de Caxias do Sul, em 1992, de usar “temporariamente” as celas de algumas delegacias para colocar detentos, recorda o ex-chefe da Polícia Civil Newton Müller Rodrigues. Desde 1999 a determinação oficial é para que os detentos não passem mais a noite nas delegacias gaúchas, diz o chefe de Polícia, João Paulo Martins."

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA

Se isto for aprovado, o Estado do RS mostrará sua incapacidade diante da falência do sistema prisional e assumirá de vez a autoria de crimes contra direitos humanos e contra a administração pública. O Estado, representado pelo Governo do RS, pelo Tribunal de Justiça do RS e pela Assembléia Legislativa do RS, deveria responder por estes crimes, pois praticam a execução penal mantendo pessoas presas ociosas e em condições desumanas e medievais, em celas insalubres e superlotadas, sem segurança, oportunidades ou futura reinclusão. Respondem assim, direta ou indiretamente, por violações de direitos humanos e por desvios de agentes de funções para as quais foram contratados - brigadianos e policiais civis não são carcereiros e nem agentes penitenciários- desprezando a recuperação dos apenados, aceitando o despreparo técnico dos agentes da custódia e ignorando a eficácia do sistema.

Quando é que estes altos governantes que percebem altos salários para dirigir este esta unidade federativa irão tirar a venda da cegueira, abrir os olhos, aproximar seus instrumentos e exercer a função pública com comprometimento e zelo nas questões de ordem pública? Quando serão implementadas medidas compatíveis com a realidade? Quando mobilizarão esforços conjuntos para alterar os impedimentos da lei? Quando irão executar o dever dentro dos princípios democráticos? Quando respeitarão a lei que protege os direitos humanos? Quando irão parar de brincar de autoridade negligenciando a vida das pessoas? Quando...?