quarta-feira, 26 de novembro de 2014

PRESÍDIO CENTRAL, HISTÓRIAS DE AMOR E SUBMISSÃO

DIÁRIO GAÚCHO 26/11/2014 | 07h01


Histórias de amor atrás das grades do Presídio Central

Renato Dorneles




Mulheres em fila em frente ao Presidio Central de Porto Alegre para ingressar para dia de visita aos presos Foto: Mateus Bruxel / Agencia RBS






O Presídio Central de Porto Alegre, principal prisão masculina do Estado, paradoxalmente tem as mulheres como responsáveis por sua maior movimentação. Por ano, são feitas mais de 250 mil visitas aos internos. Destas, cerca de 85% (220 mil) são realizadas por mulheres. São mães, filhas, esposas, companheiras, noivas, namoradas que moldam suas vidas a partir desta realidade. Além disso, por tabela, mesmo sem terem cometido qualquer crime, são socialmente condenadas, enfrentando estigmas e preconceitos.

Mas elas provam que, dentro das frias e escuras paredes do Central, também há lugar para o amor. No primeiro dia da série que segue até sexta-feira, o Diário Gaúcho fala de um dos momentos mais delicados – e esperados – na prisão: a visita íntima.




Fotos: Mateus Bruxel

Às 6h40min de uma quarta-feira, a empresária Paula, 44 anos, não esconde a ansiedade na fila de visitantes no Presídio Central. Dali a três horas e meia, mais ou menos, encontrará o companheiro, 22 anos mais jovem, preso por envolvimento no tráfico de drogas. E eles voltarão a manter relações sexuais.

Mudanças na vida sexual estão entre as principais transformações que ocorrem na rotina de mulheres, quando seus maridos, companheiros, noivos ou namorados são presos. O sexo passa a ter dias marcados e tempo cronometrado, nas chamadas visitas íntimas.

A ansiedade de Paula tem suas justificativas. Há algum tempo que ela e o companheiro não fazem sexo. Dois meses antes, ela dera à luz prematuramente, aos seis meses de gestação, uma menina, fruto de seu relacionamento com o jovem que agora está preso. Depois disso, foi surpreendida por um caso de traição.

– Depois de ganhar a filha, quando eu voltei aqui não me deixaram entrar e me disseram que ele tinha me “desligado” e “ligado” uma outra mulher – contou ela.



A partir da “liga”, os encontros são organizados pelos próprios presos, nas galerias de cada pavilhão. Na maior parte dos casos, cada cela é dividida por um lençol pendurado, para que dois casais possam se relacionar simultaneamente. O tempo para a relação varia conforme o número de inscritos. Em uma das galerias, são 50 minutos para a relação e 15 minutos para o banho. Tudo controlado pelo “homem da planilha”, um preso encarregado de organizar os encontros.

Apaixonadas e dedicadas

Paula perdoou a traição. Não esconde sua paixão pelo jovem que conhecera por redes sociais, quando ele ainda estava livre. A empresária já tinha quatro filhos, todos mais velhos que o companheiro: 29, 27, 25 e 24 anos, mas não relutou em engravidar novamente. A prisão dele por tráfico não abalou o relacionamento. Mesmo grávida, não deixou de ir ao presídio duas vezes por semana.

A mesma dedicação de Paula é demonstrada por Ângela Almeron, 31 anos, em agosto, no sétimo mês de gestação. Por sinal, engravidara em uma visita íntima. O marido cumpre uma condenação de nove anos por assalto.

– Ele estava desesperado. Era motoboy, havia sofrido um acidente e não estava recebendo o auxílio-doença. A gente tem outros dois filhos (um menino, de 12 anos, e uma menina, de quatro). Então, ele foi com um amigo arrombar uma casa. Não estava armado, mas, como tinha um menino no local, foi condenado por assalto – contou.

Quando engravidou na visita íntima, Ângela teve mais privacidade do que Paula. Como, na galeria em que seu marido estava havia menos presos, entrava um casal por vez e cada um dispunha de uma hora e meia para a relação.

– No início foi bem constrangedor, mas a gente acaba se adaptando. Meu marido nunca teve uma cela, ele sempre morou no corredor – afirma

Ângela, evidenciando o problema da superlotação carcerária do Central.


Adriana e Jorge: um casal feliz

“Durmo com a vigilância"

Em matéria de visita íntima, poucas devem ter aproveitado tanto quanto Adriana Aguiar Cardoso, 36 anos. Ela conheceu o companheiro, Jorge Luiz de Oliveira Gomes, 56 anos, quando ele cumpria pena no Presídio Central, na mesma galeria na qual estava o irmão dela. Adriana, então, passou a ter dois cadastros de visitante: um para o irmão, outro para Jorge.
– Eu ia três vezes por semana. Dava oi para o meu irmão e ia ficar com o Jorge – relembra.
Com bom humor, o companheiro, que cumpre o restante da pena em casa, monitorado por tornozeleira eletrônica, não perde a oportunidade de brincar com a mulher.

União já dura quatro anos

– Fiquei 20 anos preso. No início, com ela, eu estava acostumado com vida a dois em três dias por semana. Agora, depois que saí, convivo com TPM e outros problemas que nem lembrava como eram. Além disso, no presídio eu era vigiado, mas não como agora, quando durmo todos os dias com a vigilância ao lado – ri Jorge.

No total, eles estão juntos há quatro anos.


Vladimir visita o companheiro

Sem preconceitos no Pavilhão H

O preconceito impede o homossexualismo nas galerias do Presídio Central. Exceto em uma: a terceira do Pavilhão H. Nela ficam os travestis. É para lá que, duas vezes por semana, vai Vladimir Carvalho Cunha, 46 anos, chamado de Deise na fila de visitas. Seu companheiro está preso sob a acusação de tráfico. Vladimir é um dos raros casos de visitante “ligado” para encontros íntimos no Central. Recebeu autorização do juiz Sidinei Bruzska, da Vara de Execuções Criminais.



Solidariedade atrás das grades

Quando a visita é no final de semana, além da movimentação das mulheres, há ainda crianças e adolescentes, desde que filhos ou irmãos menores dos apenados, ou outros menores de 18 anos cuja guarda o preso possua. Os pequenos reafirmam comportamentos solidários entre os internos, pois, enquanto alguns pais entram na cela para os momentos de visita íntima, os "caídos" cuidam dos filhos dos colegas.

Na visita íntima, tempo é dinheiro

O sexo nos presídios por meio das visitas íntimas tem suas peculiaridades. Por ser cronometrado e num ambiente onde quase tudo vira objeto de barganha, até "instantes" são comercializados por presos que não utilizem todo o tempo que lhe é disponibilizado para a relação.
Porém, se isso pode significar algum dinheiro ou outra vantagem em troca, por outro lado, muitas vezes vira motivo de constrangimentos. Preso que conclui o ato em um tempo mais curto pode virar motivo de chacota e ser chamados de coelhinho.

Coelhinho é o preso que estabelece uma relação sexual muito rápida com a visita

A visita íntima também é apontada como responsável por mudanças comportamentais na vida do cárcere, ao longo do tempo. Ainda que sem comprovação científica, é creditado a esse direito aquirido pelos presos o fim da violência sexual no presídio.
Outras mudanças, apontadas pelos próprios presos, diz respeito à decoração das celas. Nas décadas de 80 e 90 eram comuns posters e fotos de mulheres nuas nas paredes. Agora, em respeito às mulheres que têm acesso às galerias, essa prática foi abolida.


Mulheres viram objeto de negociação

Mestre em Psicologia, Fernanda Bassani é autora da dissertação Visita íntima: o gerenciamento da sexualidade nas prisões do Brasil.

Pergunta – Em um lugar como a prisão há espaço para que a sexualidade seja desenvolvida de forma natural?

Fernanda – Não, de maneira alguma. Em megaprisões, como é o caso do Presídio Central, ou em prisões superlotadas, como é típico do Brasil e do momento histórico atual, é impossível o desenvolvimento de uma sexualidade sem interferências perniciosas da dinâmica prisional.

Pergunta – E quais os maiores problemas desta dinâmica?

Fernanda – Com base em minhas pesquisas, pude constatar que um dos principais fatores que influenciam a sexualidade no cárcere é sua submissão à dinâmica comercial que atualmente rege as cadeias. Assim, muito facilmente as mulheres acabam se transformando em objeto de negociação, status, ou meio para obter algum outro benefício, que não apenas afeto ou sexo, conforme prevê o mecanismo da visita íntima.



VISITA ÍNTIMA

A sistemática

- Em um caderno, o "homem da planilha" anota o número das celas (normalmente, são 18, dos dois lados da galeria).
- Os presos que vão receber visita íntima o procuram para se inscrever.

- Com uma sacola contendo um lençol e material de higiene, os inscritos vão para o pátio. Enquanto isso, as visitantes estão sendo submetidas a revista na entrada do presídio.

- Quando a visita chega, o preso sob para em sua companhia para a galeria (correspondentes aos corredores dos pavilhões), onde aguardam a sua vez.

- O homem da planilha vai a chamada, conforme a ordem de inscrição (independentemente da cela em que o preso durma).

- Cada cela, dividida ao meio por um lençol, recebe dois casais simultaneamente.

- Ao final do tempo estipulado da o sexo (50 minutos, por exemplo), o homem da planilha avisa o casal. 
Depois, ainda há 15 minutos para o banho de cada casal, nos banheiros existentes nas celas.


Reportagem: Renato Dorneles. Fotos: Mateus Bruxel. Edição impressa: Luiz Domingues.




 COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - OS PAÍSES DE PRIMEIRO MUNDO ATENTAM PARA QUESTÕES DE HUMANIDADE, PRIVACIDADE E PRESERVAÇÃO DA FAMÍLIA E DA INTIMIDADE DAS PESSOAS PRESAS. NO BRASIL, PRESOS E FAMILIARES SÃO ABANDONADOS À PERMISSIVIDADE E AO DOMÍNIO DOS MAIS FORTES...E depois exigimos segurança nas ruas...
 

Quarto para visita íntima em presídios do primeiro mundo








sábado, 22 de novembro de 2014

PEDRINHAS PODE LEVAR BRASIL A BANCO DE RÉUS NA OEA





TERESA PEROSA
REVISTA ÉPOCA 21/11/2014 07h30




Pedrinhas (Foto: Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão)

Quatro é a média de denúncias diárias que a ONG Sociedade Maranhense de Direitos Humanos recebe de familiares de presos no Complexo de Pedrinhas. Depois de quase um ano da divulgação do vídeo que exibia presos decapitados, tortura, agressão, maus tratos e mortes continuam sendo o cotidiano do presídio. A corte da Organização de Estados Americanos (OEA) emitiu uma nova reprimenda esta semana ao Estado brasileiro pela incapacidade de conduzir a crise de hiperlotação e violência em Pedrinhas. O puxão de orelha aumenta as chances do país se tornar réu no tribunal. Só em 2014, 18 presos foram mortos no complexo. O número total de mortes desde 2013 chega a 80.



sexta-feira, 21 de novembro de 2014

PRESIDIÁRIO PEDE IMPEACHMENT DE DILMA POR SUPERLOTAÇÃO DE PRESÍDIO

CONGRESSO EM FOCO 20/11/2014 10:30 

Presidiário pede impeachment de Dilma. Condenado por roubo, preso que cumpre pena em presídio paulista pede ao STF e à Câmara que presidente reeleita seja enquadrada por crime de responsabilidade. O motivo: superlotação de penitenciárias brasileiras

por Fábio Góis |




Fábio Góis/Congresso em Foco

Carta foi escrita à mão pelo presidiário João Pedro Boria: superlotação carceráriaUm presidiário que cumpre pena por roubo em uma penitenciária paulista entrou com pedido de impeachment contra a presidente reeleita Dilma Rousseff por causa da superlotação dos presídios brasileiros. O inusitado pedido, inicialmente enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), chegou à Câmara no último dia 13 e é assinado pelo preso João Pedro Boria Caiado de Castro, de 37 anos, condenado a seis anos e 11 meses de prisão. Na carta, João Pedro pede o enquadramento de Dilma em “crime de responsabilidade”, com base no artigo 8º da Lei nº 1.079/50, estendendo a acusação ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e à “Justiça Pública Estadual”. Apesar da menção ao tucano com uma espécie de autor dos desmandos, o pedido de impeachment é direcionado apenas à petista.

Preso na Penitenciária Compacta de Potim II, no Bairro das Correias, em São Paulo, João Pedro enviou a carta a Brasília pelo meio tradicional, os Correios. Em letra cursiva, com linguagem formal que sugere certo conhecimento sobre a legislação, ele relata o que considera “infração à lei federal” no que diz respeito ao sistema penitenciário. “O ora requerente, assim como outros inúmeros cidadãos, encontra-se preso e recolhido em prisões sem vagas, e com exasperação da superlotação, com evidente ilegalidade ao artigo 85, parágrafo único, da Lei 7.210/84 [Lei de Execução Penal], e artigo 5º [...] da Constituição Federal [...] Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Decreto nº 678 de 6 de novembro de 1992, artigo 7º, item 2”, diz trecho da carta, com referência à legislação sobre “direito à liberdade pessoal”.

“Destarte, é evidente a infração de lei federal de ordem pública, pelo governador do Estado de São Paulo [...] e da Justiça pública Estadual, com permissão tácita, por inércia, da presidenta da República”, acrescenta João Pedro. “De outro vértice, a Lei de Execuções Penais fixou o prazo de seis meses, a contar da sua publicação, para que tivesse sido providenciada a construção de estabelecimentos penais em número suficiente ao ingresso dos condenados [...] Como passados 20 anos e nada, praticamente, foi providenciado, a situação vem se agravando.”

Ainda segundo a carta, João Pedro denuncia as “nefastas consequências” causadas pelo suposto descaso do governo com o sistema prisional – o entre elas o “fomento às facções criminosas” em São Paulo. Sem apresentar assinaturas endossando sua carta, o preso arrola como testemunhas de sua acusação, além dele mesmo, o secretário de Administração Penitenciária de São Paulo, Lourival Gomes, e o presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) do Ministério da Justiça, Luiz Antônio Silva Bressane.

Como “provas documentais” de sua denúncia, João Pedro diz que, por estar preso, não pode apresentá-las materialmente. Por isso, requer como tais a declaração formal, por parte do CNPCP, da lotação máxima de cada presídio do estado, com o objetivo de confrontá-la com o número de internos de cada unidade prisional. A tarefa de contar os presos, solicita João Pedro, é da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo.

A Penitenciária de Potim II foi inaugurada em 18 de março de 2002. Com área construída de 7.854,69 m², tem capacidade máxima para 844 detentos. Mas, segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, o presídio reúne atualmente mais do que o dobro dessa população prisional. Em junho deste ano, um agente penitenciário foi agredido e, depois de uma revista geral, foram encontrados celulares, chips, baterias, fones de ouvido, drogas e espetos de ferro. Diversas rebeliões já foram promovidas no presídio.

“Bastião de Justiça”

A carta, datada de 5 de outubro, foi formalmente recebida no dia 23 de outubro pela Central do Cidadão do STF, departamento subordinado à Secretaria Geral da Presidência. Ou seja, na semana que antecedeu a reeleição de Dilma em segundo turno. Depois dos devidos procedimentos protocolares, o chefe da central, Marcos Alegre Silva, encaminhou ofício à Ouvidoria Parlamentar da Câmara, em 28 de outubro. A mensagem do presidiário, no entanto, só chegou à Secretaria Geral da Mesa da Câmara na última quinta-feira.

“A carta chegou pelos Correios. Recebemos cerca de 200 cartas como essa, todos os dias, vindas do sistema penitenciário de todo o Brasil. São cartas com pedidos diversos, como progressão de regime, livramento condicional, ocorrências sobre execução de pena, denúncias de maus tratos, pedidos de tratamento médico…”, disse Marcos Alegre ao Congresso em Foco. Ele informou que João Pedro já havia escrito para o STF em outras ocasiões, com outros propósitos. No entanto, diz o servidor, apenas pedidos de informação processual e casos de habeas corpus são examinados na central. “Os demais pedidos encaminhamos aos órgãos competentes.”

Para o chefe da Central do Cidadão, o STF é procurado, principalmente, por cidadãos humildes de “rincões do país”, sem acesso à internet ou domínio das tecnologias de comunicação. Ele diz que, além das cartas manuscritas, são protocolados no STF diversos pedidos por fax e formulários eletrônicos, com a ajuda de servidores da corte. “As pessoas têm o ideário do STF como o último bastião de Justiça”, disse Marcos Alegre.

Ele afirmou ainda que, no caso de João Pedro Boria, provavelmente se trata de um “autodidata”. Devido ao tempo de sobra na prisão, explica Marcos Alegre, alguns presos consomem “livros de jurisprudência” e adquirem o conhecimento suficiente para elaborar seus próprios pedidos, imersos que estão no universo jurídico de sentenças e habeas corpus. “O mundo deles gira em torno disso. Na maioria das vezes é o próprio preso quem escreve. Eles acabam por adquirir um conhecimento jurídico interessante”, declarou o servidor, lembrando que esses presos viram os “escribas da cadeia” ao redigir também para os colegas de cela.

Golpe do emprego

Identificado como empresário, João Pedro tem outras complicações na Justiça. Além da condenação por roubo, pesa contra ele acusação de estelionato, crime pelo qual foi preso em 2007 pelo Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos (Garra). Segundo a denúncia, ele promovia o “golpe do emprego” por meio da empresa Human Desenvolvimento Organizacional e Internacional, no município de São José. A fraude consistia na oferta de vagas em empresas de renome, com altos salários, mediante o pagamento de uma taxa prévia. Em vez de obter a colocação, os interessados pagavam por um serviço não prestado.

Um advogado carioca contou à reportagem ter sido vítima de João Pedro Boria. Ela lembra que, recém-formado em Direito, procurou os serviços da Human Desenvolvimento para tentar uma vaga de emprego. Foi ludibriado, diz: “Até hoje eu tenho créditos a receber”, diz o advogado, que instaurou processo judicial contra João Pedro e, em fevereiro de 2008, conseguiu a penhora dos bens do empresário, segundo registros do Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro.

Em agosto de 2006, o blog Imprensa Marrom foi condenado a pagar R$ 3.500 por danos morais a João Pedro, devido à veiculação, no blog, de comentário de internauta considerado ofensivo pela Justiça. A notícia foi veiculada pela Folha Online, em 3 de setembro daquele ano. “A decisão [...] é a primeira condenação no Brasil por Comentários, ou seja, não por texto de quem faz o blog, mas de um de seus leitores, com veiculação automática”, diz a reportagem.

O Congresso em Foco fez, em outubro de 2012, uma radiografia sobre os pedidos de impeachment protocolados na Câmara contra a Dilma, então em seu segundo ano de mandato – todos foram arquivados por falta de embasamento legal. Àquela época, Dilma ainda gozava de certa aprovação popular (chegou a 65% em março de 2013), e sequer poderia imaginar que enfrentaria as manifestações de junho de 2013, quando viu a aprovação ao seu governo despencar para 30%. A reportagem mostrava que cidadãos comuns eram os autores dos requerimentos, todos apontando algum tipo de desmando que, em suas avaliações, Dilma teria cometido.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

APENADO DO SEMIABERTO PULA O MURO DO ALBERGUE



DIÁRIO GAÚCHO 17/11/2014 | 18h47

Vanessa Kannenberg

Foto: apenado é flagrado pulando muro de albergue em Gravataí. Detento do regime aberto foi capturado pela Brigada Militar cerca de 15 minutos depois



Detento recebeu um pano para evitar a cerca e pulou de cerca de três metros Foto: Felipe Mendes / Arquivo pessoal



Dentro do Instituto Penal de Gravataí (IPG), os apenados passavam por revista rotineira. Do lado de fora, no pátio, um deles pulava o muro lateral do albergue. Ignorando a altura de cerca de três metros e o arame farpado recém-instalado, por volta das 15h desta segunda-feira, Everton Luiz Coelho da Silva utilizou um pano que lhe foi jogado para se proteger da cerca e fugiu.

Antes de pular, do alto do muro, ele se virou para os detentos que estavam na cadeia e fez sinal de ok com o dedão. Quem conta é um assessor de imprensa de um vereador da Câmara de Vereadores, que fica ao lado do albergue.



— Eu estava na janela, falando ao telefone, quando vi ele subindo o muro. Minha colega ainda comentou “ele deve estar trabalhando na cerca”, mas eu respondi “não pode ser, ele está muito arrumado” — conta Felipe Mendes, que enviou fotos pelo Facebook da Zero Hora.

De fato, o detento usava camiseta, calça jeans e tênis. Dando-se conta do que acontecia, Mendes interrompeu a ligação e começou a fotografar.

— A gente achou até engraçado, porque ele parecia muito tranquilo. Além de fazer o ok para os presos, ele pulou e saiu caminhando bem de boa, nem correu — detalha o assessor.



Cerca de 15 minutos depois da fuga, alertada pelos funcionários da Câmara, a Brigada Militar capturou o fugitivo, que estava a pé e com uma mochila nas costas, próximo da ERS-118. Depois de ser apresentado à Polícia Civil, foi encaminhado ao Presídio Central de Porto Alegre.

Para a administradora do instituto penal, Janaína Guntzel, a fuga do detento surpreendeu:

— Esse preso especificamente é muito tranquilo e comportado. Ele é do regime aberto (quando o apenado passa as noites e finais de semana no albergue e trabalha no horário comercial), em que é difícil ocorrer fugas.


Segundo ela, o arame farpado foi colocado justamente na área onde houve a fuga há apenas duas semanas. O objetivo é dificultar que os presos fujam. Atualmente, o albergue de Gravataí está com uma população carcerária de 66 detentos, mas a capacidade é para 60. Do total, apenas 15 não estão empregados.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

UM CELULAR PARA CADA PRESO



ZERO HORA 10 de novembro de 2014 | N° 17979


CLÁUDIO BRITO*



Tenho consciência de que vai causar estrépito e, em muitos, indignação.

Nem por isso deixarei de expor o que é meu pensar a respeito do uso de celulares por apenados nas cadeias. Sugiro há bom tempo que os condenados recebam permissão ao porte, transporte e uso de aparelhos de telefonia móvel enquanto estiverem recolhidos. Com a advertência de que seriam monitorados ininterruptamente.

Mais ainda, em cada presídio haveria uma sala de informática, com acesso à internet, também sob controle da navegação. Desconheço meio melhor para que muitos crimes sejam evitados ou, quando ocorridos, também acarretem punição aos culpados, pois certamente identificados seus autores.

Pergunto: existe alguma investigação sem interceptação e escuta? O que ainda agora permitiu a descoberta das atividades de uma quadrilha de ladrões de automóveis comandada pelos celulares, na conexão constante de seu líder, segregado em uma cela de segurança máxima? A escuta que policiais realizaram, certamente sob autorização judicial.

Ninguém faz outra coisa quando investiga. A ordem é escutar. Então, adequado que os presos tenham seus telefones para que sejam ouvidos em seus colóquios, restando seus passos e os de seus comparsas escancarados.

Há quem diga que o uso da comunicação ensejaria mais crimes, então facilitados por quem deveria impedi-los. Não vejo assim. Foram as escutas que ensejaram a pronta resposta policial em tantos casos. E quem disse que, sem os celulares, os crimes ficariam impossíveis? Visitas e correspondência não existirão? Então, se de qualquer forma, com mais ou menos obstáculos, o cometimento de crimes por quem está na cadeia acontecerá sempre, que se facilite a investigação ouvindo-se o que os presos tramarem.

Revista rigorosa por scanner pessoal e outros instrumentos? Reserve-se a tecnologia para impedir a entrada de armas e drogas nas casas prisionais, o que é muito mais grave do que um chip ou um celular. A escuta das conversas telefônicas ajudará na missão.

Jornalista claudio.brito@rdgaucha.com.br


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Vou concordar em parte com o Brito. Nenhum país desenvolvido trabalha com ideia de permitir celulares para cada preso, pois este é um instrumento de poder, de comando, de negócio e de vida e morte entre os presos. Nenhuma polícia do mundo está preparada para prevenir um crime ordenado por celular. Agora, sou favorável a ter uma sala de informática para navegação sob controle e restrita, como forma de benefício por bom comportamento. É o que fazem nos países desenvolvidos como instrumento de disciplina e não da forma vergonhosa, calamitosa, negligente e ineficiente como é no Brasil, como se o preso tivesse direito a ter celular e depredar a cadeia para esconder os aparelhos e alimentar a bateria com gatos na rede elétrica.

NÚMERO DE CELULARES NA PASC SUPERA O TOTAL DE PRESOS

ZERO HORA 10/11/2014 | 05h03

Dobra apreensão de celulares na Pasc. Até outubro, 254 aparelhos foram recolhidos, número superior ao total de detentos na prisão

por José Luís Costa



Foto: Ronaldo Bernardi / Agencia RBS

A fama da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) de “escritório do crime organizado” é cada vez mais apropriada. O número de celulares apreendidos em 2014 já é superior ao dobro do recolhido em todo o ano passado, segundo estatística da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Considerando dados até outubro, o crescimento chega a 142%.

Foram 254 telefones recolhidos, o equivalente a mais de um aparelho por preso (225) na Pasc. Nem no Presídio Central são apreendidos tantos equipamentos em proporção ao número de detentos. Dos celulares recolhidos na Pasc, 26 foram encontrados com visitantes, 40 com presos e 188 teriam entrado por “outros meios”.


Esses “outros meios” seriam arremessos por cima de muros ou camuflagem em objetos ou alimentos. Também existe desconfiança, não admitida publicamente pela Susepe, de que o ingresso seja facilitado por quem tem livre acesso à cadeia pela porta da frente, como advogados e visitantes. A suspeita é reforçada pelo fato de a Pasc ter detectores de metais que deveriam revelar telefones.

A situação gera casos inusitados. Juízes que fiscalizam a cadeia costumam ser vistos com as “calças caindo” nos corredores porque deixam até o cinto na portaria para evitar o buzinaço dos detectores de metais. Enquanto isso, o preso Marcos Marcelo do Nascimento, sem sair da Pasc, responde a inquérito por porte ilegal de pistola encontrada na cela.

O mais recente caso da farra de celulares ocorreu na semana passada com a prisão preventiva de José Carlos dos Santos, o Seco, que já estava na cadeia, e foi identificado em escutas ordenando furtos e roubos de veículos. Segundo a polícia, Seco passava quase o dia todo com telefone no ouvido, o que é incomum entre quadrilheiros mais perigosos. Em geral, ele falam o mínimo necessário. Para driblar a vigilância, também costumam enxertar telefones entre os “caídos”, os presos mais pobres, que aceitam guardar os equipamentos em troca de drogas, cigarros, comida e produtos de higiene. Para os próximos dias, está prevista a instalação de um scanner corporal, equipamento que identifica objetos nas cavidades corporais. Para o secretário da Segurança Pública, Airton Michels, depois de o aparelho entrar em operação, não haverá mais “explicações” para a entrada de celulares na Pasc.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

HOMICIDA EM PRISÃO DOMICILIAR DORME AO LADO DO FUZIL E DA PISTOLA

 

DIÁRIO GAÚCHO 07/11/2014 | 12h26


José Luís Costa




Em regime domiciliar por falta de vagas nas cadeias, o apenado Maycon Nunes Carvalho, 22 anos, vai voltar para atrás das grades. A Vara de Execuções Criminais da Capital determinou a prisão dele ao receber uma foto na qual ele foi flagrado dormindo em um sofá, ao lado de uma pistola e com um fuzil a tiracolo.

A imagem foi enviada para um celular apreendido esta semana no pavilhão D do Presídio Central de Porto Alegre. O detento é conhecido no meio policial e foi identificado por causa de uma tatuagem no braço direito. Ele tinha sido preso em dezembro passado com uma pistola calibre .40, em Viamão. Foi condenado a três anos e quatro meses em regime aberto e, em 18 de agosto, ganhou o direito da prisão domiciliar.


Agora, vai voltar para o regime fechado temporariamente e responder a um novo processo por porte ilegal de arma. Ele também responde a um processo por tráfico de drogas e tem contra si uma denúncia do Ministério Público por homicídio qualificado.

FLAGRADO DORMINDO AO LADO DE FUZIL, PRESO DOMICILIAR VOLTA Á CADEIA

 

DIÁRIO GAÚCHO 07/11/2014 | 12h26


José Luís Costa




Em regime domiciliar por falta de vagas nas cadeias, o apenado Maycon Nunes Carvalho, 22 anos, vai voltar para atrás das grades. A Vara de Execuções Criminais da Capital determinou a prisão dele ao receber uma foto na qual ele foi flagrado dormindo em um sofá, ao lado de uma pistola e com um fuzil a tiracolo.

A imagem foi enviada para um celular apreendido esta semana no pavilhão D do Presídio Central de Porto Alegre. O detento é conhecido no meio policial e foi identificado por causa de uma tatuagem no braço direito. Ele tinha sido preso em dezembro passado com uma pistola calibre .40, em Viamão. Foi condenado a três anos e quatro meses em regime aberto e, em 18 de agosto, ganhou o direito da prisão domiciliar.


Agora, vai voltar para o regime fechado temporariamente e responder a um novo processo por porte ilegal de arma. Ele também responde a um processo por tráfico de drogas e tem contra si uma denúncia do Ministério Público por homicídio qualificado.

QG DO CRIME MONTADO ATRÁS DAS GRADES



ZERO HORA  07 de novembro de 2014 | N° 17976

A VOLTA DE SECO



OPERAÇÃO TRINCA-FERRO, da Polícia Civil, deflagrada na madrugada de ontem, desarticulou uma central decrimes comandada de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). Um dos integrantes do bando é o assaltante José Carlos dos Santos, o Seco, condenado 13 vezes a penas que somam 173 anos de cadeia


Policiais civis realizaram ontem uma operação curiosa: deram voz de prisão a um homem que já está preso, um dos mais conhecidos assaltantes gaúchos, José Carlos dos Santos, o Seco. Condenado 13 vezes, num total de 173 anos de reclusão por roubos a bancos e carros-fortes, ele cumpre pena desde 2006 e teve mais uma vez a prisão preventiva decretada. Agora, porque teria montado um quartel-general do crime, de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).

Escorados em um ano de investigação e 70 horas de escutas autorizadas pela Justiça, policiais comandados por Juliano Ferreira, titular da Delegacia de Repressão ao Roubo de Veículo, identificaram cerca de 200 roubos e furtos de carros e caminhões praticados pelo grupo. Afora isso, a quadrilha comandada por Seco detrás das grades clonava veículos, traficava drogas, vendia armas e comercializava explosivos usados em assaltos. Explosões eram a especialidade de Seco quando atuava nas estradas: ele é apontado como responsável pelo uso de dinamite em oito roubos de carros-fortes.

As investigações apontam que Seco virou um consultor para o crime organizado. Repassava informações sobre o uso de explosivos e era o intermediário entre quem queria comprar os artefatos e quem fornecia. Também coordenava a troca de carros e caminhões roubados por armas e drogas no Paraguai. Em uma das escutas, Seco falaria sobre a compra de cordéis – componentes explosivos usados para a detonação. No diálogo, cordéis são chamados de “cordinhas”.

A neutralização do esquema aconteceu com a Operação Trinca-Ferro. Cerca de 150 policiais civis cumpriram na madrugada de ontem 50 mandados (21 de prisão temporária e 29 de busca e apreensão) em municípios da Região Metropolitana e do Interior. Dezesseis suspeitos foram presos até ontem. A Polícia Civil diz que 80 pessoas com participação no esquema foram identificadas.

SUSPEITA DE NOVA FACÇÃO

Os diálogos interceptados desde novembro de 2013 mostram, segundo a polícia, que o bando se preparava para montar uma facção nas cadeias e fora delas. O grupo estaria aliado aos Bala na Cara, o mais novo e agressivo “partido do crime” nas prisões gaúchas – Seco, inclusive, cumpre pena na ala deles, em Charqueadas. Um dos aliados de Seco, Carlos Raimundo Alves Junior, o Ninho, foi flagrado ensinando um comparsa ao telefone sobre como organizar o grupo:

– Ô, meu, tira meu salve (ordem aos bandidos). Tu pode passar a limpo aí no hotel. (...) Faz reunião com os confirmados. Isso aqui é feito para fortalecer, para ter mais respeito, pro cara se unir mais (...). Temos de se juntar, criar outras paradas. É um parâmetro para juntar uns gurizões de respeito. Para dar ideologia certa, para ir se formando e se estruturando, Cabeção. Toda semana vai ter um troquinho.

Levado ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), Seco negou as suspeitas e disse que a voz identificada nos telefonemas não é dele. A polícia conta, porém, com antenas de celular e reconhecimento de voz para confirmar que os comandos vinham dele.


 CASA PARA TORTURAR INIMIGOS


O assaltante Seco se negou a falar, mas outras pessoas presas prestaram testemunho e confirmaram as atividades da quadrilha. ZH teve acesso ao depoimento de um dos ouvidos pelo delegado Juliano Ferreira. Ele afirma que Seco está aliado à facção Bala na Cara e que pretende ampliar sua influência no grupo, considerado “de responsa” (que cumpre a palavra empenhada).

O depoente diz também que a quadrilha mantinha em São Leopoldo, no bairro Campestre, uma casa usada, além de esconderijo, para torturar inimigos do bando.

Conforme o depoimento, o local serviu de cativeiro para um bebê sequestrado. A menina teria sido levada para obrigar o pai, um traficante, a pagar dívida com o bando. A criança foi libertada após pagamento do resgate. Seco teria ficado contrariado com o sequestro, por ter sido feito sem sua orientação.

MULHER DE SECO TAMBÉM FOI DETIDA


Certa vez, a residência teria sido invadida por integrantes dos Manos (facção rival dos Bala na Cara), que, por sua vez, torturaram a mulher de Seco, Adriana da Silva Santos Moraes, para revelar onde estaria um dinheiro pertencente ao bandido.

O grupo liderado por Seco tinha integrantes do sexo feminino. A mulher dele foi presa em Montenegro na operação de ontem – ela é apontada como braço direito do criminoso, sendo responsável por transportar entorpecentes. O depoimento confirma que as mulheres eram usadas para levar armas para os esconderijos e até para assaltar. A mulher de Ninho (Carlos Raimundo Alves Junior) foi reconhecida como participante do roubo de uma caminhonete Nissan.

A testemunha dá pistas sobre um dos mistérios da crônica policial: o que foi feito de Michele, ex-mulher de Seco, sequestrada sete vezes por criminosos que queriam colocar as mãos na fortuna acumulada pelos ataques a carros­fortes cometidos pelo assaltante. Ela teria morrido em São Paulo. O depoimento não dá detalhes.


CADEIA FALIDA



ZERO HORA 07 de novembro de 2014 | N° 17976


JOSÉ LUÍS COSTA


SISTEMA PENITENCIÁRIO. Presídio de segurança máxima só no nome

INAUGURADA COMO GARANTIA de conter os bandidos mais perigosos do Estado, Pasc se tornou escritório com grades para o comando de crimes


A rede criminosa montada por José Carlos dos Santos, o Seco, 35 anos, de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) é só mais um dos incontáveis episódios que ilustram a falência da cadeia.

Inaugurada em 1992, há tempos ela deixou de ser de contenção máxima para virar “escritório com portas e janelas de grades” onde estão perigosos quadrilheiros comandando roubos, homicídios e tráfico de drogas às custas da sociedade gaúcha.

A fragilidade estrutural da Pasc começou a ser escancarada em 1999, quando o assaltante de bancos Cláudio Adriano Ribeiro, o Papagaio, fugiu pela porta da frente, em um episódio nebuloso até hoje.

A proliferação de celulares nas cadeias a partir dos anos 2000, em contrapartida a sistemas de controle obsoletos e precárias câmeras de vigilância, fizeram da Pasc uma penitenciária com os mesmos problemas de uma prisão comum. Um relatório da Vara de Execuções Criminais (VEC) da Capital, elenca as deficiências: a Pasc tem 16 galerias e só quatro pátios. Isso faz com que, mesmo confinados em celas individuais por causa da periculosidade, presos se encontrem para “trocar ideias” durante o banho de sol. Os apenados recebem visitas na própria cela e jamais usam uniforme. E, apesar do controle, têm acesso a celulares, drogas, instrumentos para serrar grades e até arma de fogo.

MUITAS COBRANÇAS, NENHUMA SOLUÇÃO

Em junho de 2011, após o assaltante Sandro Alexandre de Paula, o Zoreia, fugir por um ponto cego junto à cozinha – sem câmera e sem guarda –, o próprio secretário de Segurança Pública, Airton Michels, admitiu:

– A Pasc não é cadeia de alta segurança, é de média segurança.

Desde aquela época, a Vara de Execuções Criminais cobra melhorias e providências para reprimir o ingresso de celulares na cadeia. Foram enviados pelo menos sete documentos à Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), mas os retornos foram explicações evasivas ou promessas ainda não cumpridas.

No último ofício remetido, em julho, o juiz Sidinei Brzuska, da VEC, escreveu:

“Há um gasto de energia nessas cobranças e também uma certa sensação de frustração, pois não se vê melhora significativa nas coisas, que seguem na base do improviso, sem planejamento, sem investimentos.”

Passados três meses, a VEC ainda não recebeu qualquer resposta. Questionado ontem sobre a situação, o magistrado sentenciou:

– O Estado trata a Pasc como Porto Alegre trata o Dilúvio (arroio com elevado índice de poluição). É preciso, com urgência, uma cadeia de alta segurança.

FRAGILIDADE EXPOSTA



ZERO HORA 7 de novembro de 2014 | N° 17976


SUA SEGURANÇA | HUMBERTO TREZZI



Portas de metal nos corredores dos pavilhões que funcionam de forma estanque: quando uma abre, a outra fecha. Mais de 20 câmeras monitorando, via circuito fechado, os caminhos internos. Guaritas externas de uma altura considerável, para melhor observar os presos. Muro interno, cercas de arame farpado, muro externo, tudo para dificultar fugas. Escassa comunicação entre os vizinhos de celas – que, aliás, recebem um preso cada, raridade em grandes presídios brasileiros.

Cada cela tem duas grades, uma na porta e outra por fora desta, tornando difícil ao preso serrá-las. Esses eram os predicados iniciais da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), que deveriam justificar seu nome.

Deveriam, mas não justificam, a se julgar pela minuciosa operação desencadeada pela Polícia Civil, a Trinca-Ferro (esta, sim, apropriadamente denominada... o apelido lembra um pássaro que, apesar de engaiolado, não deixa de voar).

Foi em 1999 que a primeira fuga da Pasc aconteceu. O assaltante Cláudio Adriano Ribeiro, o Papagaio – um dos pioneiros em roubo de carros-fortes no Estado – escapou. Dizem que por uma grade de janela serrada, às vistas dos guardas. A Justiça Criminal de Charqueadas condenou 17 policiais militares pela escapada. Concluiu que eles foram negligentes ao não vigiar com cuidado o preso.

O diretor da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) na época da fuga de Papagaio era Airton Michels, o atual secretário da Segurança Pública. Agora, mais um assaltante de blindados, José Carlos dos Santos, o Seco, é indiciado por burlar a vigilância da Pasc. Não fugiu, mas comandaria o crime de trás das grades.

Como? É um grande mistério. A Pasc tem detectores de metais de dois tipos: raquete (portáteis) e portão detector. Como os celulares continuam sendo passados para os detentos? Certo que a vida dos agentes também não é uma maravilha. São ameaçados pelos chefes de facção. Desafios que a cúpula da segurança precisa solucionar.



CONTRAPONTO

O QUE DIZ A SUSEPE -
A Pasc é de alta segurança. Os celulares ingressam nos presídios de diversas formas, com visitas, jogados por cima dos muros e outras, que precisam ser investigadas. Existem portais que detectam metais nas salas de visitas e funcionam bem. Em relação aos bloqueadores de celular, diversas empresas realizaram testes desde 2006 e nenhum foi eficaz. A Susepe comprou um scanner corporal que começará a funcionar na próxima semana. A aposta da Susepe é inibir a entrada de ilícitos, pois todas as pessoas que ingressarem na Pasc vão passar por esse scanner, incluindo visitas, servidores, advogados e autoridades.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

ADVOGADOS E JURISTAS DIVERGEM SOBRE ATUALIZAÇÃO DA LEP

JORNAL DO COMÉRCIO 04/11/2014

Advogados e juristas divergem sobre atualização da Lei de Execução Penal Proposta de reformulação está emperrada no Legislativo

Wagner Miranda de Figueiredo



MARCELO G. RIBEIRO/JC
ADOV
Alexandre Wunderlich teme que as alterações agravem o sistema punitivo

Após 30 anos da Lei de Execução Penal (LEP) ser sancionada, uma comissão formada por juristas apresentou ao Senado Federal um projeto de atualização da norma. A entrega final da proposta ocorreu no fim do ano passado. Até hoje, o projeto tramita no Legislativo. Mas a atualização da Lei 7.210, de 1984, é necessária? Isso é o que o Jornal da Lei apurou com advogados e juízes. Houve uma contraposição de ideias. Enquanto advogados afirmam que o Executivo não cumpre a norma, juízes querem a adequação da lei à realidade atual.

Para o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Sidnei Beneti, que defende a atualização da lei, há necessidade de rever o sistema penitenciário brasileiro. Para ele, os presos precisam ter conhecimento das progressões das penas. “Isso evitará a judicialização de numerosos incidentes e acabará com as pragas da pena vencida e do retardamento da efetivação de direitos do condenado. Fatores que causam intranquilidade e acúmulo de processos”, relata o ex-magistrado, que presidiu a comissão responsável pela atualização da lei. Além disso, ele afirma que as penas aplicadas ao Estado por falta de manutenção de presídios deveriam ser mais concretizadas.

Por outro lado, há quem pense que a LEP não deve ser considerada um problema imediato. Apesar de reconhecer falhas na norma, o doutor em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) Salah H. Khaled Jr. acredita que o foco precisa ser mudado e que possíveis alterações legislativas não trariam melhorias para a realidade das práticas punitivas no Brasil. “Sou contra o fetiche normativo. Penso que a realidade está gritando e é com ela que temos que nos preocupar”, argumenta, posicionando-se contrário ao objetivo inicial dos juristas.

Alexandre Wunderlich, professor de Direito Penal da Pucrs, teme que a alteração da LEP endureça o sistema punitivo. “O que me preocupa é o impacto carcerário que essa reformulação poderá produzir. Por exemplo, se deixarmos mais gente presa e dificultarmos as progressões de regime num sistema que está caótico, ele certamente irá colapsar”, reflete o advogado.

Questionado sobre as possíveis mudanças do sistema punitivo, Wunderlich acredita que qualquer modificação a ser posta em prática necessita previamente de um estudo, para que o futuro impacto no sistema carcerário seja avaliado. “Quando temos uma ‘bancada da bala’, que pede o endurecimento do sistema, isso acaba criando projetos legislativos de endurecimento do sistema. Só que esse endurecimento precisa ser previsto para a próxima década. Quantas vagas do sistema penal serão necessárias? Quantos juízes de Execução Penal? Porque se tu crias leis duras hoje, daqui a dez ou 20 anos o impacto carcerário irá aparecer no sistema”, detalha Wunderlich.

Outro ponto questionado pelos advogados é a falta de cumprimento da norma por parte do Executivo. “Realmente, vários de seus dispositivos não vêm sendo concretamente aplicados. No tocante à pena privativa de liberdade, é evidente a falta de vagas em presídios e a instrumentalização de estabelecimentos para cumprimento da progressão de regime prisional, especialmente o semiaberto. Mas não é só isso. É preciso também funcionalizar melhor os instrumentos de aplicação concreta da lei. É preciso evitar a judicialização de todo e qualquer incidente no cumprimento da pena”, destaca Beneti.

Já para o professor Khaled, o sistema penitenciário brasileiro é ilegítimo por não seguir nenhuma recomendação. “Nosso sistema penitenciário é absolutamente ilegal e, nesse sentido, toda pena privativa de liberdade é ilegal, uma vez que não se conforma minimamente ao que está previsto tanto na LEP quanto no que diz respeitos aos direitos fundamentais dos apenados”, alerta o docente e autor do livro “A busca da verdade no Processo Penal”.

UÉ, MAS A SEGURANÇA NÃO É MÁXIMA NA PASC?



DIÁRIO GAÚCHO E ZERO HORA  06/11/2014 | 10h31


Humberto Trezzi


Sistema penitenciário. Repórter especial comenta sobre ação de organização criminosa comandada pelo assaltante Seco de dentro da cadeia



Portas de metal nos corredores dos pavilhões que atuam de forma estanque: quando uma abre, a outra fecha. Mais de 20 câmeras de TV monitorando, via circuito fechado, os caminhos internos. Guaritas externas de uma altura considerável, para melhor observar os presos. Muro interno, cercas de arame farpado, muro externo, tudo para dificultar fugas. Escassa comunicação entre os vizinhos de cela - que, aliás, nunca estão lotadas, raridade em grandes presídios brasileiros.

Cada cela tem duas grades, uma na porta e outra por fora desta, tornando difícil ao preso serrá-las. Esses eram os predicados iniciais da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), que deveriam justificar seu nome.

Deveriam, mas não justificam, a se julgar pela minuciosa operação desencadeada pela Polícia Civil, a Trinca-Ferro (esta, sim, apropriadamente denominada...o apelido lembra um pássaro que, apesar de engaiolado, não deixa de voar).

Foi em 1999 que a primeira fuga da Pasc aconteceu. O assaltante Cláudio Adriano Ribeiro, o Papagaio - um dos pioneiros em roubo de carros-fortes no Estado - escapou. Dizem que por uma grade de janela serrada, às vistas dos guardas. A Justiça Criminal de Charqueadas condenou 17 policiais militares pela escapada. Concluiu que eles foram negligentes, ao não vigiar com cuidado o preso.

O diretor da Susepe (Superintendência de Serviços Penitenciários) na época da fuga de Papagaio era Airton Michels, o atual secretário da Segurança Pública. Agora, mais um assaltante de blindados, José Carlos dos Santos, o Seco, é indiciado por burlar a vigilância da Pasc. Não fugiu, mas comandaria o crime de trás das grades.

Como? É um grande mistério. A Pasc tem detectores de metais de dois tipos: raquete (portáteis) e portão de raio X. Como os celulares continuam passando para os detentos? Desafio que a cúpula da segurança precisa esclarecer.

Operação nesta manhã prendeu comparsas de Seco:



Foto: Ronaldo Bernardi/Agência RBS


Quadrilha comandada por Seco de dentro da Pasc é presa. Organização criminosa, articulada dentro de celas, teria roubado mais de 200 veículos neste ano

por Eduardo Rosa. Atualizada em 06/11/2014



A liderança da organização criminosa recai sobre José Carlos dos Santos, o Seco Foto: Ronaldo Bernardi / Agencia RBS


Uma ação do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) contra roubo e furto de veículos prendeu, na manhã desta quinta-feira, 16 pessoas. Resultado de 11 meses de investigação, a Operação Trinca Ferro cumpriu 29 mandados de busca e apreensão e 24 mandados de prisão em 17 cidades da Região Metropolitana, dos vales do Sinos e do Caí e do centro do Estado. Neste ano, o bando teria roubado mais de 200 veículos.


Conforme a Polícia Civil, a liderança da organização criminosa recai sobre José Carlos dos Santos, o Seco, que comandava o grupo de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). Seco chegou a ser um dos criminosos mais procurados do Rio Grande do Sul após espalhar pânico ao utilizar caminhões para abalroar carros-fortes em rodovias. Desde 2006, está preso.

De acordo com o delegado Juliano Ferreira, titular da Delegacia de Repressão ao Roubo de Veículos, foram identificados cerca de 200 roubos e furtos de carros e caminhões praticados pelo grupo. De dentro da cadeia, Seco enviava ordens a seus comparsas por telefone.

— Verificamos que o Seco é muito vinculado ao tráfico de drogas, inclusive com os "Bala na Cara" (facção que atua no ramo), com quem fazia contatos seguidos. Qual era a ideia? Quem sabe, se tornar fornecedor. Era uma atividade muito intensa, com muito dinheiro — explica o delegado.

Parte dos veículos era enviada para Santa Catarina, Paraná e Paraguai, onde podiam ser trocados por dinheiro e por drogas. Também serviam para Seco pagar seus comparsas, aponta a Polícia Civil.

— Foi uma árdua e complexa investigação, que começou em novembro do ano passado com a prisão do Alemão Ramires (Ramires da Costa), um dos maiores clonadores de veículos, além de ladrão — acrescenta Ferreira.

A mulher de Seco, Adriana da Silva Santos Moraes, foi presa em Montenegro — ela é apontada como braço direito do criminoso. Seco chegou à sede do Deic, em Porto Alegre, por volta das 10h30min. Ele prestará depoimento e retornará para a Pasc.