segunda-feira, 25 de julho de 2011

A GRAVE QUESTÃO PENITENCIÁRIA

JOSÉ AQUINO FLÔRES DE CAMARGO, DESEMBARGADOR, PRESIDENTE DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS - ZERO HORA 25/07/2011


A preocupação com o tema carcerário não pode mais ser tangenciada.

Cuida-se de grave problema social, que diz respeito ao Judiciário.

A realidade do crime e da violência urbana exigem, em casos extremos e que não são poucos, o isolamento do indivíduo. Essa constatação não afasta a vergonhosa condição sub-humana do cárcere nas grandes casas penitenciárias.

E, na realidade atual, estes presídios se constituem no principal foco de reprodução e organização do crime. Em tal ambiente promíscuo, o descontrole e a ausência do Estado permitem o crescimento perigoso do caos social, cuja consequência é conhecida em outras grandes metrópoles do país.

Portanto, é necessário um basta à “Escola do Crime”.

E o primeiro passo para enfrentar a mazela é a conscientização da comunidade de que o preso é compromisso de todos. A luta é, pois, pela inclusão social; mas não ao crime.

Nesse sentido, é de se pensar, ao optar pela presença material da Justiça, que ela vem como um todo. Do foro ao presídio; da condenação à execução penal.

Significa investimento, gastos públicos permanentes para todas as esferas do poder público.

A premissa é o homem, mantê-lo junto ao seu ambiente. Em termos de Judiciário, significa efetividade da jurisdição penal, só possível através de uma política pública de Estado. A superar a mera questão de governo.

Mais do que nunca, a independência e atuação harmônica dos poderes e instituições públicas se mostram a pedra de toque do Estado Democrático de Direito.

Não é mais possível conviver com práticas isoladas ou tentativas extremas de solução de crises. Embora o comprometimento individual, comovente e contagiante, dos juízes que jurisdicionam a execução criminal, ele, por si só, é insuficiente.

Não é sem razão que, sob a liderança política da Comissão de Diretos Humanos do Tribunal de Justiça, criou-se um foro permanente de discussão suprainstitucional, cujo objetivo principal é identificar soluções para o sistema.

A consciência do tamanho e da gravidade do problema do setor penitenciário, aliada a uma política pública eficaz, poderá golpear o crime organizado e trazer frutos sociais inestimáveis a médio e longo prazo.




COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O Desembargador está com a razão ao afirmar que "a preocupação com o tema carcerário não pode mais ser tangenciada", e este tangenciamento tem sido a tônica neste anos em todos os governantes com cargos nos três Poderes, no Ministério Público e na defensoria pública. O problema não é só social, é sim de sistema com processos integrados e de cumprimento da lei e dos objetivos legais e sociais.

O que envergonha não é o "o isolamento do indivíduo", necessário para penalizar o autor de crime, mas a conivência das autoridades judiciais, do Ministério Público e da Defensoria Pública com a "condição sub-humana do cárcere nas grandes casas penitenciárias". E quando estes poderes agem, preferem sacrificar o cidadão do que se indispor com os verdadeiros responsáveis que deixam de investir na estrutura prisional e não aplicam a política penitenciária prevista na constituição estadual.

Realmente os "presídios se constituem no principal foco de reprodução e organização do crime". E é correto afirmar que o "ambiente promíscuo, o descontrole e a ausência do Estado permitem o crescimento perigoso do caos social". Mas o "basta" deve se iniciar pela "mea-culpa" do Poder Judiciário, responsável pela encaminhamento à prisão do suposto autor de crime, pelo processo, pelo julgamento, pela sentença, pela concessão dos benefícios legais, pela troca de regime, pela redução da pena, e pela soltura. É o Poder Judiciário o responsável pela supervisão da execução penal. Resta ao Poder Executivo a guarda, a custódia e a ressocialização dos apenados com a devida supervisão e determinações judiciais.

"Enfrentar a mazela" é "compromisso de todos", mas quem deve liderar o processo são as autoridades competentes, pois o Estado existe e é custeado pelo povo para isto, caso contrário não haveria motivo para o povo instituir um Estado governante. Se a sociedade é exigida para solucionar o problema não precisaria existir justiça. Cabe à sociedade compartilhar com o Estado as necessidades e apoiar o Estado na busca das soluções, mas só ao Estado incumbe a justiça e a execução penal.

A gravidade do problema prisional retrata a desarmonia entre os Poderes de Estado, o descompromisso com a ordem pública e o distanciamento dos Poderes para com as questões nacionais, em especial as referentes à saúde, educação e segurança.

Esta desarmonia é que vem estimulando as ações isoladas e superficiais, o imediatismo, o descaso, o corporativismo, a ingerência partidária e desvios de recursos para áreas menos prioritárias.

O Poder Judiciário, pela importância no contexto democrático e para impor a justiça e o respeito às leis, não pode ficar apenas no "comprometimento individual, comovente e contagiante" de seus juízes e partir para uma postura mais diligente e coativa contra as negligências, omissões e crimes de Estado, aproximando-se dos delitos e da sociedade; desburocratizando o poder; agilizando os processos; reduzindo prazos e instâncias de recurso; aumentando o número de juizes e varas criminais; aprimorando a tecnologia; decidindo o transitado em julgado nos tribunais regionais; e promovendo audiências em prazos curtos pra julgar os casos, em especial envolvendo presos provisórios. Além disto, exigir do Poder Executivo o cumprimento dos dispositivos legais e de direito, sob pena da lei e dos deveres políticos.

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