segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

UMA BOMBA-RELÓGIO FEITA DE NEGLIGÊNCIA



ZERO HORA 16 de janeiro de 2017 | N° 18743



POLÍTICA + | Rosane de Oliveira




A contabilidade macabra dos mortos em rebeliões em presídios passa longe de uma centena em 15 dias. Começou no dia 31 de dezembro, com os 60 do complexo Anísio Jobim, em Manaus. Seguiram-se os 33 da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Roraima. No sábado, mais 26 no presídio de Alcaçuz, na Região Metropolitana de Natal (RN). As bombas-relógio construídas ao longo de anos tendo a negligência como matéria-prima começam a explodir em série.

Um dos produtos mais abundantes no Brasil é o diagnóstico das condições desumanas em que se empilham presos na maioria dos Estados. Comissões do Congresso, representantes do Conselho Nacional de Justiça, organizações não governamentais e jornalistas de diferentes veículos se debruçam sobre a situação das cadeias para concluir o óbvio. Que os presos vivem amontoados, que a maioria não estuda e não trabalha, que as facções mandam e desmandam. E por que isso não muda? Simplesmente porque, salvo as honrosas exceções que confirmam a regra, os governos acham que investir em presídio é perda de tempo. Não dá voto. Ao contrário, na maioria dos Estados, perde voto quem defende tratamento digno para os presos. Ao eleitor médio, não basta a privação da liberdade: a punição deve incluir o tratamento desumano.

Esse olhar vingativo não leva em conta uma obviedade: presos recolhidos a um sistema como o que impera nos principais Estados do Brasil saem de lá piores do que entraram, mesmo quando recolhidos por um delito menor. E a vítima desse bumerangue é quem está do lado de fora.

Os massacres dos últimos dias obrigaram os governadores, seus secretários de Segurança, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, e até o presidente Michel Temer e a ministra Cármen Lúcia, comandante do Supremo Tribunal Federal, a substituir o olhar contemplativo pela busca de uma solução. Definitivamente, não é permitindo que presos se matem entre si, cortando cabeças de desafetos da facção rival, que se vai resolver o problema da superlotação.


ALIÁS

O Espírito Santo, que percebeu antes a necessidade de tratar o problema no sistema carcerário como prioridade, deve servir de inspiração para outros Estados.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - E por que isso não muda?  Não é só porque "os governos acham que investir em presídio é perda de tempo. Não dá voto". Não muda porque os Poderes e órgãos com competências e incumbência na execução penal não exercem seus deveres, não atendem a finalidade da pena, não proporcionam os objetivos e, ainda, garantem a impunidade e a continuidade das ilicitudes e irregularidades cometidas no ambiente prisional pelo próprio Estado, aquele ente indivisível constituído pelos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. 

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