Alvo do governo e MP de Contas, gestora privada de presídio do Amazonas cobra R$ 4,1 mil por preso. Valor pago pelo governo amazonense à empresa Umanizzare para a administração de casas prisionais é duas vezes maior em relação custo de cada detento no Rio Grande do Sul
Por: Estadão Conteúdo
ZERO HORA 05/01/2017
Foto: Seap / Divulgação / Divulgação
Com presos que custam mais do que em outros Estados, as unidades prisionais administradas pela empresa Umanizzare, no Amazonas, apresentam "descontrole de segurança" e "ineficiência de gestão". A avaliação consta em um relatório do Ministério Público de Contas do Estado do Amazonas (MPC-AM). Por isso, o órgão pediu nesta quarta-feira, que o governo estadual rescinda os contratos. Integrantes da administração do Estado e do governo federal também criticam a gestão da empresa.
Em 2016, o pagamento à Umanizzare chegou ao dobro do ano anterior. Segundo relatório da Secretaria da Fazenda do Amazonas, publicado no Portal da Transparência, foram destinados R$ 429,4 milhões para a Umanizzare no ano passado. O valor é 115% superior ao de 2015, quando o repasse foi de R$ 199,5 milhões.
Entre as unidades administradas pela empresa está o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), onde 56 detentos foram mortos em um dos maiores massacres da história dos presídios no país. Em nota, o governo do Amazonas contestou o dado da Fazenda, alegando que pagou R$ 302,2 milhões em 2016.
O secretário de Segurança, Sérgio Fontes, também avaliou a gestão terceirizada das cadeias do Amazonas, pedindo uma revisão contratual.
— Essas relações contratuais realmente têm de ser revistas — admitiu na quarta-feira.
Levantamento feito a partir do relatório da Fazenda aponta que o valor médio mensal gasto com cada um dos 6.099 presos nas seis unidades concedidas à empresa é de R$ 5.867 em 2016. Se considerar o valor informado pelo governo, no entanto, o custo cairia para R$ 4.129 por mês no ano passado. No Rio Grande do Sul, a proporção de orçamento e população carcerária foi de R$ 1.799 por preso, valor duas vezes menor em relação ao pago pelo governo amazonense à Umanizzare para custear cada apenado.
Além do alto custo, a ineficiência da gestão foi um dos motivos pelos quais o procurador do MPC-AM Ruy Marcelo Alencar pediu que os contratos fossem encerrados.
— O quadro atual nas unidades prisionais é de absoluto descontrole — afirma no relatório.
Ele ressalta os registros fotográficos em que são vistas "várias armas, aparelhos celulares e dezenas de túneis de fuga" nos estabelecimentos. O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, também acredita que houve falha da administração do complexo.
— Porque, senão, não teriam entrado facão, armamento pesado, bebida, celular.
Gestão
Além do Compaj, a Umanizzare é responsável por administrar o Centro de Detenção Provisória Feminino (CDPF), o Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM), o Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat), a Unidade Prisional de Itacoatiara (UPI) e a Unidade Prisional do Puraquequara (UPP). No modelo de gestão privada, as unidades são construídas com dinheiro público, dirigidas por agentes públicos, mas os demais serviços — de vigilância a escolta interna — são feitos por agentes terceirizados.
O formato é criticado por um órgão do Ministério da Justiça, em relatório do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, que aponta que os funcionários fazem "apenas um breve curso preparatório na Escola de Administração Penitenciária do Amazonas, de modo que não dispõem de conhecimento técnico suficiente para exercer efetivamente o acompanhamento da execução penal". Outra crítica é que o trabalho tem as condições de risco agravadas pela possibilidade de demissão, ausência de plano de carreira e baixa remuneração dos profissionais (em torno de R$ 1.700), o que pode facilitar suborno de agentes por presos. Também é mencionada a alta rotatividade de funcionários, o que "favorece a ocorrência de tortura e maus-tratos", segundo o relatório.
A medida ainda vai na contramão de resolução do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), que recomenda "a rejeição de quaisquer propostas tendentes à privatização do Sistema Penitenciário Brasileiro". Para o coordenador do Grupo de Estudos Carcerários Aplicados da Universidade de São Paulo (Gecap-USP), Cláudio Amaral, a iniciativa privada deve operar de forma "alternativa", e em casos "pontuais".
— O importante é que os agentes tenham a mesma preparação, seja na iniciativa pública ou privada — disse, citando o exemplo da Associação de Proteção e Amparo aos Condenados (Apac), em Minas, que entende como bom exemplo de gestão privada.
Atividade-fim
Em nota, a Umanizzare destacou que só responde por limpeza e assistência social e jurídica dos presos, além da vigilância eletrônica. "O Estado cuida de todas as atividades-fim", incluindo "todo o comando da unidade, sendo sua direção executada por servidor público indicado pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária; disciplina, uso de força, segurança e vigilância armada dos detentos (exercício do poder de polícia, função exclusiva do Estado)."
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