sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

ALIANÇA NA PRISÃO

ZERO HORA 04 de janeiro de 2013 | N° 17302


TERROR NA SERRA

Quadrilhas fizeram aliança na prisão. Bandidos que espalharam pânico por Cotiporã e região se articularam quando estavam presos na Pasc, em Charqueadas

CARLOS WAGNER E HUMBERTO TREZZI

Um dia, entre os anos de 2009 e 2010, um encontro entre dois chefes de quadrilhas durante o banho de sol no pátio da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) mudou a história do crime no Rio Grande do Sul. É o que a polícia acaba de descobrir, ao identificar suspeitos de participar do mais impactante assalto realizado em 2012 em território gaúcho, o roubo a uma fábrica de joias em Cotiporã, no qual foram feitos 30 reféns e morreram três bandidos em tiroteio com a Brigada Militar.

Opátio da Pasc reuniu, de um lado, Luciano da Silveira, o Puro Osso, 34 anos, chefe de uma quadrilha perigosa e especializada no roubo e furto de veículos, com sede em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Do outro, Elisandro Rodrigo Falcão, 31 anos, descrito pela polícia como um homem audacioso por ter implantado o método de explodir e roubar caixas eletrônicos na Serra, ao estilo do cangaço, que domina militarmente uma pequena cidade antes de atacar. O bando dele se escondia nos arredores de Caxias do Sul.

É possível que o know-how do ataque a caixas eletrônicos tenha partido do grupo de Puro Osso. Ele foi preso em 2002 por arrancar os terminais bancários com correntes e rebocá-los numa van. O mesmo método seria usado, cinco anos depois, pelo bando de Falcão em Caxias – que foi denominado, por isso, Quadrilha da Van.

Criminosos também teriam se encontrado no Central

Puro Osso e Falcão ficaram na mesma ala da Pasc, confirma a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Mais do que isso: outros assaltantes vinculados às duas quadrilhas também “puxaram cana” juntos. Mesmo em bandos diferentes, Puro Osso e Falcão acabaram se encontrando também, de passagem, no Presídio Central de Porto Alegre.

– Todo o pessoal da Quadrilha da Van fez rebeliões na Penitenciária Industrial de Caxias e foi transferido para a Pasc. Dali, passaram pelo Central. Ficaram com o bando do Puro Osso nesses locais – confirma um agente do serviço reservado da BM (P2) que investiga as duas quadrilhas.

Esse policial participou do tiroteio que resultou na morte de Falcão e dois outros bandidos no domingo.

União resultou em onda de violência

A aliança entre os dois quadrilheiros resultou em uma onda jamais vista de ataques com dinamite a caixas eletrônicos na Região Metropolitana e na Serra. E na subida dos índices de roubo e furto de veículos.

Elisandro Rodrigo Falcão fugiu da cadeia em Caxias do Sul em julho. Luciano da Silveira, o Puro Osso, no final de dezembro, de São Leopoldo. No domingo passado, os dois se envolveram no mesmo ataque, ápice da empresa criminosa de ambos: comandaram o assalto à fábrica de joias em Cotiporã, na Serra. Falcão morreu e Puro Osso fugiu.

Testemunhas reconheceram três bandidos fugitivos como sendo os mesmos que escaparam com Puro Osso dia 29 de dezembro de um albergue em São Leopoldo. A BM cercou a região com 150 homens, cães farejadores, avião e barcos. Quatro bandidos conseguiram furar o bloqueio e escaparam. Eles foram resgatados por um Tiida vermelho, com placas de Sapucaia do Sul, em São Vendelino, na Serra, encontrado ontem em uma lavagem de carros em Sapucaia. O carro está sendo periciado em busca de pistas deixadas pelos criminosos. Dois homens que estavam no local foram levados ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), onde prestaram depoimento e foram liberados.

– O veículo foi apreendido e estamos investigando se existe ligação dele com os quadrilheiros de Sapucaia do Sul – informou o delegado Juliano Ferreira, da Delegacia de Roubos, ligada ao Deic.

Ferreira está em Cotiporã em busca de um dos bandidos, que ainda estaria escondido na mata da região.

Ataques em dois Estados

A Polícia Federal investiga as quadrilhas de assaltantes que invadem e dominam pequenas cidades – o chamado Novo Cangaço – por dois motivos. Um deles é que os bandidos têm atacado bancos federais. A outra razão é que alguns criminosos agem em Estados do Sul, formando uma espécie de consórcio. Atacam em Santa Catarina, fogem para o Rio Grande do Sul, e vice-versa.

O próprio Elisandro Falcão, morto em Cotiporã, é suspeito de ter liderado um assalto em Praia Grande (SC) em 2011, do ataque a um carro-forte em Dona Francisca (próximo a Joinville, Santa Catarina) em outubro passado e também do assalto com explosão de caixas eletrônicos em Sombrio (SC), em novembro. Outro que começou carreira no crime em Santa Catarina é Puro Osso, natural de Criciúma.

A P2 (serviço reservado da BM) tem o nome de outro homem que atuaria com Falcão nos dois Estados. É Edison Rodrigues, foragido, com mandado de prisão por assalto expedido pela 3ª Vara Criminal de Chapecó (SC). Ele já esteve preso por roubo com explosivos, furto com explosivos, estelionato e receptação de material roubado. Em novembro, foi visto em Caxias do Sul.

– É possível que ele estivesse no ataque em Cotiporã, pois era do bando de Falcão – diz um PM da P2.

Veículo apreendido pode fornecer pistas

O paradeiro de Puro Osso é ignorado. Mas os agentes da Delegacia de Roubos seguem os rastros deixados pelo veículo apreendido ontem em Sapucaia do Sul, na esperança de chegar ao esconderijo dos criminosos na Região Metropolitana.

O comércio de carros legais é uma das maneiras usadas por Puro Osso para lavar dinheiro. O delegado Luís Fernando Martins, que trabalhava no Vale do Sinos em 2006, descobriu que, mesmo cumprindo pena na Pasc, Puro Osso negociava a venda de dinamite e alugava armas de grosso calibre para bandidos. Foram apreendidas 120 bananas de dinamite na casa de uma parente dele.

Puro Osso tem ainda, segundo investigações da polícia, ligações com traficantes de cocaína.











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