quarta-feira, 24 de outubro de 2012

SEM-TERRA ACOMODADOS EM ÁREA DE COLÔNIA PENAL


ZERO HORA 24 de outubro de 2012 | N° 17232

POLÊMICA EM CHARQUEADAS

Juiz critica cedência de área penal a sem-terra. Famílias foram instaladas a poucos metros de local que abriga detentos do regime semiaberto

KAMILA ALMEIDA

Uma polêmica se instalou em Charqueadas depois que sem-terra foram acomodados em uma área prisional. Pelo menos 18 famílias estão em um terreno com mais de 260 hectares da Colônia Penal Agrícola do município, que abriga 180 detentos do regime semiaberto.

OMinistério Público (MP) tem uma reunião marcada para hoje a fim de discutir o tema com o governo do Estado e a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe).

Tudo começou há um ano, quando duas moradias foram erguidas no local, fato criticado pelo juiz da Vara de Execuções Criminais, Sidinei José Brzuska. Na semana passada, em uma visita ao local, o juiz percebeu que as moradias haviam proliferado. Ele documentou a situação em fotos e encaminhou as imagens ao MP, reforçando o pedido de providências protocolado em outubro de 2011.

– A ocupação é uma medida ilegal, mas tem a autorização dos setores do governo. Essa atitude compromete a estrutura do presídio e a ação dos agentes. De noite, por exemplo, não se sabe se é morador indo embora ou preso fugindo dali – desabafa o juiz.

O clima no local é de tensão. Mesmo contente com a terra cedida, o sem-terra Elias Dias da Motta, 54 anos, que reside a cerca de 300 metros da entrada principal da colônia, confessa que vive um temor constante.

– Meu terreno fica lá longe. Só que é perigoso. Me mudei para longe de onde os presos ficam – disse o sem-terra, que mora no terreno do vizinho.


MP exige explicações

A área onde estão os agricultores foi cedida pela Secretaria da Segurança Pública do Estado há 60 dias – a cedência definitiva está em tramitação. De acordo com o diretor do Departamento de Desenvolvimento Agrário da Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo, Jaime Martini, a ideia é acomodar 20 famílias. Para ele, não há motivo para se preocupar com a segurança:

– Se a própria secretaria passa um ofício cedendo a terra, para nós é porque ela pode ser usada. Agora, vamos encaminhar a regularização, como energia elétrica e água.

O titular da Superintendência dos Serviços Penitenciários, Gelson Treiesleben, admite tratar-se de uma situação delicada:

– Ocorre, muitas vezes, por falta de informação, que alguns sem-terra entram na área do CPA, o que causa desconforto. Mas já adquirimos postes e cercas para que isso não ocorra mais.

O MP, que já vem cobrando do Estado uma solução para a falta de vagas no sistema aberto e semiaberto, quer explicações dos órgãos envolvidos.

– Esta área que estão cedendo pode agravar ainda mais o problema de falta de vagas, já que é um espaço que estão perdendo e deixando de ter um aproveitamento prisional melhor – diz a promotora de Justiça de Controle e Execução Criminal Cynthia Jappur.

Carlos Cesar D’Elia, coordenador da Comissão de Direitos Humanos da Procuradoria-geral do Estado (PGE)

"Temos de lidar com duas demandas: a necessidade de assentamentos e a da criação de vagas no sistema prisional. Aquela área não estava sendo proveitosa porque o perfil do preso mudou, passando de rural para urbano. Por outro lado, a questão da segurança preocupa, mas a Susepe está tomando providências para tornar o local bem delimitado."

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Esta cedência para sem-terra de áreas destinadas exclusivamente para a execução penal consegue impedir a finalidade da Colônia Penal AGRÍCOLA de Charqueadas, rasgar a Constituição do RS e violar todas as técnicas previstas para uma política prisional digna, segura e laborial, objetivando ressocializar os apenados da justiça. É UMA AFRONTA! Onde estão os Direitos Humanos, o Tribunal de Justiça do RS, a Defensoria Pública e a Assembleia Legislativa do RS para coibirem esta grave ilicitude que atenta contra a Constituição do RS, contra a ordem pública e contra as políticas de ressocialização dos apenados. O MP vai ficar com o pincel-na-mão nesta questão?

PARA LEMBRAR:

CONSTITUIÇÃO DO RS. Texto constitucional de 3 de outubro de 1989 com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais de nº 1, de 1991, a 58, de 2010.

CAPÍTULO II - DA POLÍTICA PENITENCIÁRIA

Art. 137 - A política penitenciária do Estado, cujo objetivo é a reeducação, a reintegração social e a ressocialização dos presos, terá como prioridades:

I - a regionalização e a municipalização dos estabelecimentos penitenciários;
II - a manutenção de colônias penais agrícolas e industriais;
III - a escolarização e profissionalização dos presos.

§ 1º - Para implementação do previsto no inciso III, poderão ser estabelecidos programas alternativos de educação e trabalho remunerado em atividade industrial, agrícola e artesanal, através de convênios com entidades públicas ou privadas.

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