16 de novembro de 2008
ZERO HORA 02/11/2013 | 14h06, Nº 17603
Presídio Central de Porto Alegre é recauchutado um ano antes da prometida desativação. Zero Hora revisita o local depois da primeira incursão à cadeia, realizada em 2008
Na semana passada, havia 4.367 detentos para 2.069 vagas na prisãoFoto: Lauro Alves / Agencia RBS
André Mags
Sob pressão internacional, o Estado tem reformado pedaços do Presídio Central de Porto Alegre que até então nunca tinham passado por obras. Zero Hora conferiu na última semana as intervenções e comparou com a situação encontrada cinco anos atrás, na primeira incursão à pior cadeia do Brasil. Conheça como está hoje o complexo de 26 mil metros quadrados que se transformou em vergonha nacional.
Corredor do inferno não existe mais
O maior símbolo da degradação do Presídio Central de Porto Alegre não existe mais. As celas sem portas que lembravam masmorras medievais estão sendo reformadas na terceira galeria do pavilhão C, desativada em 2009. As paredes foram cimentadas, os buracos, tapados.
Vazio, o espaço não exala a podridão e o abandono de antes, registrados em imagens que correram o mundo e motivaram uma denúncia contra o Brasil à Organização dos Estados Americanos (OEA) por desrespeito aos direitos humanos, em janeiro deste ano. A situação foi mostrada por Zero Hora em uma incursão pelo presídio em novembro de 2008, em que foi confirmado o estado calamitoso da prisão.
A reforma da galeria, iniciada em maio deste ano, é a principal modificação identificada por Zero Hora em nova visita ao Central, realizada no final da tarde da última terça-feira. A melhoria, feita com mão de obra prisional ao custo de R$ 50 mil, faz parte de um rol de mudanças prometidas em resposta à OEA, para mostrar que algo está sendo feito e evitar uma condenação internacional. Ao mesmo tempo, vigora a mais recente promessa de desativação do presídio, para até o final de 2014.Veja o vídeo da visita ao Central:
Os últimos ocupantes da terceira galeria foram integrantes de uma gangue cujo nome até hoje está pichado na parede dos fundos: os Bala na Cara. Durante sua permanência, eles arrasaram o setor. A gangue acabou transferida para a terceira galeria do pavilhão F. Como contraste, na galeria do andar de baixo do pavilhão, a segunda do C, os presos sempre cuidaram das instalações — "nem papel de bala eles atiram pela janela", diz um policial. As portas, de madeira, são de 1959 (ano da fundação do presídio) e estão inteiras.
Há cinco anos ou mais, a mescla de maconha, urina e suor era a base olfativa das galerias do Presídio Central de Porto Alegre, sobretudo na terceira galeria do pavilhão C. Na terça-feira, os primeiros corredores rumo aos pavilhões C e D exalavam um cheiro fraco da droga.
— É mais fácil ver eles fumando no pátio — afirma um PM.
Foi com essa atmosfera que a visita se iniciou.
Passarela torna a liberdade perturbadora
Quem atravessa a passarela que se estende em frente aos pavilhões C e D sente-se como parte do desfile dos livres ante dezenas de encarcerados atrás de janelas gradeadas e cheias de trapos pendurados. É um momento em que a liberdade se torna perturbadora. Se a caminhada é na companhia do juiz da Vara de Execuções Criminais (VEC) de Porto Alegre, Sidinei Brzuska, o incômodo fica mais evidente por causa da onda de reivindicações.
— Ei, doutor Brazuska! — grita um detento atrás das grades no início do passeio em frente ao pavilhão D, tropeçando no sobrenome do juiz.
— Faz anos que eu tô aqui e não me chamam para nada! Doutor, me tira desse lugar! — berra o apenado Marcelo Rosa da Silva.
O "não me chamam para nada" era uma referência à progressão de regime. Silva considerava que tinha direito a ir do fechado para o semiaberto. Brzuska pediu à reportagem para anotar o nome do rapaz, que cumpre sua pena na segunda galeria do pavilhão D. Os gritos continuavam. A passarela tem uns 170 metros. Ida e volta parecem uma viagem interminável.
— Ei! Doutor!
— Ei! Justiça!
— Quero ir embora!
O juiz tenta acenar com algum alento, mas não pode atender a todos. Responde alto, ainda que sem gritar.
— Agora não tenho como ver isso — avisa aos presos apoiados nas grades.
No chão do pátio abaixo das janelas dos presos foi construída uma espécie de calçada em que ninguém caminha. Apenados não têm acesso ao local, e os guardas também passam longe dali. Serviria mais aos deslocamentos das ratazanas king size que antes se refestelavam no lixo amontoado sob as janelas. A população de roedores, antigos habitués do Central, reduziu em cerca de 80% com as recentes desratizações, calcula o assessor de logística do presídio, capitão Hermes Volker.
— Durante o dia, em cinco minutos se enxergava uns 10 ratos. Nunca chegou a ter centenas de uma vez só, mas tinha bastante — compara o capitão.
Já o lixo jogado pelas janelas continua amontoado no pátio, assim como o fedor onipresente de esgoto extravasado — o sistema não comporta os dejetos de 4,3 mil presos em um lugar onde deveria haver 2 mil.
Entre os pavilhões C e D, um som vindo do interior dos prédios fica perfeitamente audível. Uma música brega de amor em volume altíssimo embala o tédio dentro do D. É sempre assim, como se fosse uma festa? O diretor operacional do presídio, major Guatemi Echart, responde laconicamente:
— Não.
De volta ao interior da cadeia, as tentativas de entregar papeizinhos com pedidos não cessam nas celas. O juiz recolhe um. Depois, pede para anotar outro nome, o de Geverson Eduardo Gonçalves Silvino. Questionado se as reivindicações são factíveis, Brzuska é sucinto:
— Às vezes, sim. Às vezes, não.
O juiz analisou os casos de Silva e de Silvino. O primeiro terá de aguardar talvez mais do que imaginava, pois só ganhará direito ao semiaberto em 2016. Já Silvino estava com a razão ao chamar a atenção de Brzuska. Ele tem um exame criminológico pendente. É esse exame que pode permitir a passagem para um regime mais brando.
Na galeria esvaziada, um gato preto
O "pior presídio do Brasil" ou a "masmorra do século 21" — definições dadas pela CPI do Sistema Carcerário, em 2009 —, ganha um banho quando é véspera de visita. No pavilhão B, a massa carcerária fazia uma faxina para receber familiares no dia seguinte com a casa arrumada. Como efeito da limpeza, uma nuvem de moscas de espalhou, perdida, pelos corredores mais próximos. Quando a reportagem passou pelos presidiários, separados por uma tela, eles viravam as costas. O major explicou que o comportamento faz parte de um acordo tácito: vocês não mexem com as nossas visitas e nós não mexemos com as de vocês.
No pavilhão A, uma galeria foi esvaziada para que pudesse ser visitada. Porém, parecia que os presos ainda estavam presentes. O ar, com jeito de ter sido muitas vezes respirado até poucos instantes antes de a equipe de ZH entrar na galeria, se mantinha quente e pesado, e o cheiro de suor se misturava com o de massa cozida, a provável boia que os detentos preparavam em fogareiros improvisados quando tiveram de sair do local.
As más condições e a superlotação são responsáveis pela disseminação de doenças — broncopneumonia, pneumonia e tuberculose são as principais. Na comparação com 2008, percebe-se que algumas paredes foram rebocadas. A estrutura dos banheiros está um pouco melhor. No entanto, passados cinco anos, o aspecto geral é de deterioração ainda maior, observou Brzuska.
Uma geladeira estava isolada, no meio do corredor. O som de dezenas de TVs e rádios deixados ligados, talvez por causa da rapidez com que os presos foram obrigados a abandonar as celas sem portas, chamava a atenção.
As vidas de 330 encarcerados estavam ali, expostas e remediadas em pedaços de pano colorido que compunham uma espécie de papel de parede em alguns cubículos, em colchões ralos e sujos ainda amassados pelo peso dos corpos, em cobertores desarrumados bruscamente, chinelos largados em cantos e tênis enfiados em buracos nas paredes de 42 celas que deveriam conter 84 homens. No cárcere mais próximo da entrada da galeria, a surpresa: um gato preto. Deitado sobre uma pilha de cobertores, o filhote aguardava pacientemente o retorno do seu dono.
Evangélicos na cozinha remodelada
A cozinha nunca foi o pior lugar do Central. Ainda assim, era uma sauna para a tropa de cozinheiros-detentos porque alcançava os 40ºC. No final de julho de 2012, a área foi reinaugurada em um novo local, ao custo de R$ 1,2 milhão, incluindo a colocação de 145 metros de piso de basalto, bancadas, cinco panelões com capacidade para acondicionar 500 quilos de comida, instalações de coifas e reformas na rede de esgoto. O ambiente é um pouco mais arejado do que o anterior, mas a maior alteração foi a aposentadoria das antigas caldeiras, que funcionavam desde a inauguração do presídio, em 1959. O sistema atual é a gás, e em breve uma cozinha experimental do Senac deve começar a operar ali.
Na última terça-feira, o trabalho dos cozinheiros era orquestrado por uma música evangélica. Religião e comida estão juntas no Central porque os 60 presos que trabalham na cozinha foram inseridos em um projeto evangélico de recuperação de detentos. O clima mudou, o odor de gordura ainda não impregnou totalmente no novo espaço, mas as exigências continuam as mesmas — é preciso contar com o carregamento de pães já às 3h e aprontar o café da manhã de toda a população carcerária do Central até as 5h. Não é recomendável falhar no fornecimento do rango aos presos.
Investimentos antes da implosão
O titular da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), Gelson Treiesleben, prefere não ligar os investimentos de cerca de R$ 1,25 milhão no pavilhão C (o mais destruído) e na cozinha à denúncia feita à OEA, e sim à urgência ante as péssimas condições de habitabilidade do presídio. Sobre as reformas em um estabelecimento com prazo para ser desativado, ele lançou uma metáfora:
— Vou usar um jargão da medicina. Nós sabemos que o paciente está doente, porém, não vamos deixar de medicá-lo, mesmo que futuramente ele possa morrer.
A Susepe pretende reduzir gradualmente a superlotação do Central, limitando a cadeia à capacidade máxima de 2.069 detentos — na última quarta-feira, havia 4.367 presos. Aos poucos, os presidiários devem ser transferidos para outras penitenciárias em construção, à medida que ficarem prontas. A meta é contar com oito novos estabelecimentos prisionais para onde serão encaminhados os detentos do Central até o final de 2014 — data em que se estipula uma possível desativação do pior presídio do Brasil.
As cadeias em construção
- Canoas 1 (393 vagas): previsão de entrega em abril ou maio de 2014
- Canoas 2, 3 e 4 (2.415 vagas): até metade de 2014
- Guaíba (672 vagas): final de 2014
- Modulada de Montenegro (500 vagas em um novo módulo): dezembro de 2013 ou janeiro de 2014
- Modulada de Charqueadas (250 em um novo módulo): falta construir guarita e passarela
- Venâncio Aires (529 vagas): final de 2013
Total de vagas: 4.759
ZERO HORA
Sob pressão internacional, o Estado tem reformado pedaços do Presídio Central de Porto Alegre que até então nunca tinham passado por obras. Zero Hora conferiu na última semana as intervenções e comparou com a situação encontrada cinco anos atrás, na primeira incursão à pior cadeia do Brasil. Conheça como está hoje o complexo de 26 mil metros quadrados que se transformou em vergonha nacional.
Corredor do inferno não existe mais
O maior símbolo da degradação do Presídio Central de Porto Alegre não existe mais. As celas sem portas que lembravam masmorras medievais estão sendo reformadas na terceira galeria do pavilhão C, desativada em 2009. As paredes foram cimentadas, os buracos, tapados.
Vazio, o espaço não exala a podridão e o abandono de antes, registrados em imagens que correram o mundo e motivaram uma denúncia contra o Brasil à Organização dos Estados Americanos (OEA) por desrespeito aos direitos humanos, em janeiro deste ano. A situação foi mostrada por Zero Hora em uma incursão pelo presídio em novembro de 2008, em que foi confirmado o estado calamitoso da prisão.
A reforma da galeria, iniciada em maio deste ano, é a principal modificação identificada por Zero Hora em nova visita ao Central, realizada no final da tarde da última terça-feira. A melhoria, feita com mão de obra prisional ao custo de R$ 50 mil, faz parte de um rol de mudanças prometidas em resposta à OEA, para mostrar que algo está sendo feito e evitar uma condenação internacional. Ao mesmo tempo, vigora a mais recente promessa de desativação do presídio, para até o final de 2014.Veja o vídeo da visita ao Central:
Os últimos ocupantes da terceira galeria foram integrantes de uma gangue cujo nome até hoje está pichado na parede dos fundos: os Bala na Cara. Durante sua permanência, eles arrasaram o setor. A gangue acabou transferida para a terceira galeria do pavilhão F. Como contraste, na galeria do andar de baixo do pavilhão, a segunda do C, os presos sempre cuidaram das instalações — "nem papel de bala eles atiram pela janela", diz um policial. As portas, de madeira, são de 1959 (ano da fundação do presídio) e estão inteiras.
Há cinco anos ou mais, a mescla de maconha, urina e suor era a base olfativa das galerias do Presídio Central de Porto Alegre, sobretudo na terceira galeria do pavilhão C. Na terça-feira, os primeiros corredores rumo aos pavilhões C e D exalavam um cheiro fraco da droga.
— É mais fácil ver eles fumando no pátio — afirma um PM.
Foi com essa atmosfera que a visita se iniciou.
Passarela torna a liberdade perturbadora
Quem atravessa a passarela que se estende em frente aos pavilhões C e D sente-se como parte do desfile dos livres ante dezenas de encarcerados atrás de janelas gradeadas e cheias de trapos pendurados. É um momento em que a liberdade se torna perturbadora. Se a caminhada é na companhia do juiz da Vara de Execuções Criminais (VEC) de Porto Alegre, Sidinei Brzuska, o incômodo fica mais evidente por causa da onda de reivindicações.
— Ei, doutor Brazuska! — grita um detento atrás das grades no início do passeio em frente ao pavilhão D, tropeçando no sobrenome do juiz.
— Faz anos que eu tô aqui e não me chamam para nada! Doutor, me tira desse lugar! — berra o apenado Marcelo Rosa da Silva.
O "não me chamam para nada" era uma referência à progressão de regime. Silva considerava que tinha direito a ir do fechado para o semiaberto. Brzuska pediu à reportagem para anotar o nome do rapaz, que cumpre sua pena na segunda galeria do pavilhão D. Os gritos continuavam. A passarela tem uns 170 metros. Ida e volta parecem uma viagem interminável.
— Ei! Doutor!
— Ei! Justiça!
— Quero ir embora!
O juiz tenta acenar com algum alento, mas não pode atender a todos. Responde alto, ainda que sem gritar.
— Agora não tenho como ver isso — avisa aos presos apoiados nas grades.
No chão do pátio abaixo das janelas dos presos foi construída uma espécie de calçada em que ninguém caminha. Apenados não têm acesso ao local, e os guardas também passam longe dali. Serviria mais aos deslocamentos das ratazanas king size que antes se refestelavam no lixo amontoado sob as janelas. A população de roedores, antigos habitués do Central, reduziu em cerca de 80% com as recentes desratizações, calcula o assessor de logística do presídio, capitão Hermes Volker.
— Durante o dia, em cinco minutos se enxergava uns 10 ratos. Nunca chegou a ter centenas de uma vez só, mas tinha bastante — compara o capitão.
Já o lixo jogado pelas janelas continua amontoado no pátio, assim como o fedor onipresente de esgoto extravasado — o sistema não comporta os dejetos de 4,3 mil presos em um lugar onde deveria haver 2 mil.
Entre os pavilhões C e D, um som vindo do interior dos prédios fica perfeitamente audível. Uma música brega de amor em volume altíssimo embala o tédio dentro do D. É sempre assim, como se fosse uma festa? O diretor operacional do presídio, major Guatemi Echart, responde laconicamente:
— Não.
De volta ao interior da cadeia, as tentativas de entregar papeizinhos com pedidos não cessam nas celas. O juiz recolhe um. Depois, pede para anotar outro nome, o de Geverson Eduardo Gonçalves Silvino. Questionado se as reivindicações são factíveis, Brzuska é sucinto:
— Às vezes, sim. Às vezes, não.
O juiz analisou os casos de Silva e de Silvino. O primeiro terá de aguardar talvez mais do que imaginava, pois só ganhará direito ao semiaberto em 2016. Já Silvino estava com a razão ao chamar a atenção de Brzuska. Ele tem um exame criminológico pendente. É esse exame que pode permitir a passagem para um regime mais brando.
Na galeria esvaziada, um gato preto
O "pior presídio do Brasil" ou a "masmorra do século 21" — definições dadas pela CPI do Sistema Carcerário, em 2009 —, ganha um banho quando é véspera de visita. No pavilhão B, a massa carcerária fazia uma faxina para receber familiares no dia seguinte com a casa arrumada. Como efeito da limpeza, uma nuvem de moscas de espalhou, perdida, pelos corredores mais próximos. Quando a reportagem passou pelos presidiários, separados por uma tela, eles viravam as costas. O major explicou que o comportamento faz parte de um acordo tácito: vocês não mexem com as nossas visitas e nós não mexemos com as de vocês.
No pavilhão A, uma galeria foi esvaziada para que pudesse ser visitada. Porém, parecia que os presos ainda estavam presentes. O ar, com jeito de ter sido muitas vezes respirado até poucos instantes antes de a equipe de ZH entrar na galeria, se mantinha quente e pesado, e o cheiro de suor se misturava com o de massa cozida, a provável boia que os detentos preparavam em fogareiros improvisados quando tiveram de sair do local.
As más condições e a superlotação são responsáveis pela disseminação de doenças — broncopneumonia, pneumonia e tuberculose são as principais. Na comparação com 2008, percebe-se que algumas paredes foram rebocadas. A estrutura dos banheiros está um pouco melhor. No entanto, passados cinco anos, o aspecto geral é de deterioração ainda maior, observou Brzuska.
Uma geladeira estava isolada, no meio do corredor. O som de dezenas de TVs e rádios deixados ligados, talvez por causa da rapidez com que os presos foram obrigados a abandonar as celas sem portas, chamava a atenção.
As vidas de 330 encarcerados estavam ali, expostas e remediadas em pedaços de pano colorido que compunham uma espécie de papel de parede em alguns cubículos, em colchões ralos e sujos ainda amassados pelo peso dos corpos, em cobertores desarrumados bruscamente, chinelos largados em cantos e tênis enfiados em buracos nas paredes de 42 celas que deveriam conter 84 homens. No cárcere mais próximo da entrada da galeria, a surpresa: um gato preto. Deitado sobre uma pilha de cobertores, o filhote aguardava pacientemente o retorno do seu dono.
Evangélicos na cozinha remodelada
A cozinha nunca foi o pior lugar do Central. Ainda assim, era uma sauna para a tropa de cozinheiros-detentos porque alcançava os 40ºC. No final de julho de 2012, a área foi reinaugurada em um novo local, ao custo de R$ 1,2 milhão, incluindo a colocação de 145 metros de piso de basalto, bancadas, cinco panelões com capacidade para acondicionar 500 quilos de comida, instalações de coifas e reformas na rede de esgoto. O ambiente é um pouco mais arejado do que o anterior, mas a maior alteração foi a aposentadoria das antigas caldeiras, que funcionavam desde a inauguração do presídio, em 1959. O sistema atual é a gás, e em breve uma cozinha experimental do Senac deve começar a operar ali.
Na última terça-feira, o trabalho dos cozinheiros era orquestrado por uma música evangélica. Religião e comida estão juntas no Central porque os 60 presos que trabalham na cozinha foram inseridos em um projeto evangélico de recuperação de detentos. O clima mudou, o odor de gordura ainda não impregnou totalmente no novo espaço, mas as exigências continuam as mesmas — é preciso contar com o carregamento de pães já às 3h e aprontar o café da manhã de toda a população carcerária do Central até as 5h. Não é recomendável falhar no fornecimento do rango aos presos.
Investimentos antes da implosão
O titular da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), Gelson Treiesleben, prefere não ligar os investimentos de cerca de R$ 1,25 milhão no pavilhão C (o mais destruído) e na cozinha à denúncia feita à OEA, e sim à urgência ante as péssimas condições de habitabilidade do presídio. Sobre as reformas em um estabelecimento com prazo para ser desativado, ele lançou uma metáfora:
— Vou usar um jargão da medicina. Nós sabemos que o paciente está doente, porém, não vamos deixar de medicá-lo, mesmo que futuramente ele possa morrer.
A Susepe pretende reduzir gradualmente a superlotação do Central, limitando a cadeia à capacidade máxima de 2.069 detentos — na última quarta-feira, havia 4.367 presos. Aos poucos, os presidiários devem ser transferidos para outras penitenciárias em construção, à medida que ficarem prontas. A meta é contar com oito novos estabelecimentos prisionais para onde serão encaminhados os detentos do Central até o final de 2014 — data em que se estipula uma possível desativação do pior presídio do Brasil.
As cadeias em construção
- Canoas 1 (393 vagas): previsão de entrega em abril ou maio de 2014
- Canoas 2, 3 e 4 (2.415 vagas): até metade de 2014
- Guaíba (672 vagas): final de 2014
- Modulada de Montenegro (500 vagas em um novo módulo): dezembro de 2013 ou janeiro de 2014
- Modulada de Charqueadas (250 em um novo módulo): falta construir guarita e passarela
- Venâncio Aires (529 vagas): final de 2013
Total de vagas: 4.759
ZERO HORA
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