segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

ESCRITÓRIO DO CRIME

Jornal NH Digital
JORNAL DE NH - 07/12/2013 20h30


Galeria de presos se tornou uma central de extorsões. Detentos ligam e exigem dinheiro para não matar, sequestrar, assaltar ou incendiar


Sílvio Milani


Novo Hamburgo - A galeria 2 do complexo B da Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ), em Charqueadas, virou uma central de extorsões. Presos vêm telefonando para casas e empresas com ameaças aterrorizadoras. Exigem dinheiro para não matar, sequestrar, assaltar ou queimar propriedades. O poder de convencimento está nas informações que têm sobre as vítimas. Contam a elas detalhes da família, como endereço, nomes e escola dos filhos, para que se sintam observadas pelos bandidos.

Pelo menos 13 foram atormentadas desde o início do mês passado, entre empresários, comerciantes, médica e dentista da região metropolitana. "Essas são as que chegaram ao nosso conhecimento, mas acreditamos que haja número bem maior, considerando que muitas não procuram a Polícia", declara o chefe de Investigação da 1ª DP de Novo Hamburgo, inspetor José Urbano Lourenço. Sete são hamburguenses, quatro de Porto Alegre, uma de Alvorada e uma de Sapiranga. "Não é coincidência que a maioria das vítimas documentadas até agora seja da nossa cidade, pois o líder dos presos também é daqui", observa o inspetor. Condenado por assaltos e estupro, o apenado de 34 anos caiu em interceptações telefônicas autorizadas pelo Judiciário. Foram ainda identificados três colegas de cela, recolhidos por roubos à mão armada – um deles, também de Novo Hamburgo, ganhou liberdade na semana passada e os outros dois são de São Leopoldo e da Capital.

O delegado da 1.ª DP, Nauro Marques, pediu na sexta-feira a prisão preventiva dos quatro detentos e de duas mulheres que estariam dando suporte ao esquema. "Elas são parentes dos detentos. Disponibilizaram suas contas bancárias para depósitos das vítimas", explica o delegado. Nos casos investigados por ele, pelo menos três vítimas pagaram os criminosos. Em um caso apurado pela DP de Sapiranga, o dono de uma revenda de veículos pagou R$ 15 mil para os presos depois de sua casa ser alvejada por tiros.

O GOLPE

A vítima é escolhida por meio de consultas a redes sociais e listas telefônicas, mas também pode estar sendo observada por criminosos em liberdade.

A pessoa recebe ligações de um homem que geralmente diz ser de um "escritório de investigação" contratado para fazer mal a ela, filhos ou negócios.

O homem cobra entre R$ 2 mil e R$ 20 mil para não executar o plano. Assustada com o conhecimento do bandido sobre a rotina da família, a vítima acaba pagando.

"Fiquei três noites sem dormir"

Quatro telefonemas na segunda semana de novembro deixaram marcas profundas na vida de uma família do bairro Liberdade, em Novo Hamburgo. "A gente passou a desconfiar de tudo. Parece que estamos sendo seguidos. Eles sabiam muito sobre nós", comenta o comerciante de 46 anos, que chegou a sacar R$ 5 mil para pagar a quadrilha. "Os caras ameaçaram sequestrar meus filhos. Liguei desesperado para a escola do meu caçula para que não deixassem ele passar pelo portão até eu chegar. Fiquei três noites sem dormir. Só não depositei o dinheiro na conta deles porque minha irmã me alertou a procurar a Polícia."

TRECHOS DE ESCUTAS

Às 14h40 de 27 de novembro, o preso líder do esquema liga para a empresa onde trabalha uma publicitária de 30 anos, em Porto Alegre, que ele quer extorquir. O plano é se identificar como Murilo, um matador profissional contratado para executar um dos dois filhos da mulher. E alegar que, como não concorda em fazer mal para criança, aceita delatar os mentores da execução por R$ 2 mil.

Preso - Eu liguei pra (nome da publicitária). O telefone dela não atende...

Colega da vítima - Só um minutinho!

Preso - Tá, olha só, não temos muito que perder tempo, eu preciso falar com a (nome da publicitária) urgente. Tá acontecendo uns negócio com o (nome do filho da publicitária). Pede pra ela entrar urgente em contato comigo...

Colega da vítima - Quem tá falando?

Preso - Oi, é o Murilo. Anota o meu número aí!

Colega da vítima - Tu é de onde, Murilo?

Preso - De Porto Alegre.

Colega da vítima - Mas o que tá acontecendo com o (nome do filho da publicitária)?

Preso - Tu vai fazer muita pergunta ou vai pedi pra ela me ligar? Aí é contigo, se acontecer alguma coisa com o filho dela, é contigo!

O DRAMA DE UMA MÃE

Seis minutos depois, a publicitária recebe o recado e telefona para o número deixado por Murilo. A conversa dura 11 minutos e 43 segundos.

Preso - Tu vai fazer o que na Polícia? Que tu recebeu um telefonema? Que o Murilo tal e tal... te ligou e falou isso e aquilo? Que vai te adiantar? Amanhã ou depois acontece alguma coisa pros teus filhos, claro, eu não vou fazer!

Vítima - Pelo amor de Deus!

Preso - Depois acontece uma coisa pro teus filhos, o que tu vai fazer? No final da tarde o casal vai vir aqui pra fala comigo!

Vítima - Mas eu não tenho, é impossível conseguir o dinheiro até o final da tarde... preciso pelo menos até amanhã pra conseguir!

Leia reportagem completa no ABC Domingo

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