sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

TORNOZELEIRAS PASSAM NO TESTE?

PRESOS VIGIADOS. Tornozeleiras passam em teste. Final de contrato de empresa com o governo do Estado obrigou à devolução do equipamento, mas Susepe promete que processo para retomar monitoramento deve ser rápido - GUSTAVO AZEVEDO E JOÃO BRUM, ZERO HORA, 17/02/2011

Apesar dos bons resultados, com níveis irrisórios de reincidência, o monitoramento de presos com tornozeleiras eletrônicas no Estado, pioneiro no país, teve de ser suspenso por tempo indeterminado ontem. Por força do fim do contrato de locação, assinado pelo governo passado e com validade de apenas seis meses, os 91 apenados do regime aberto que usavam os equipamentos tiveram de entregá-los e retornar às unidades prisionais de origem.

O sistema, mesmo não sendo uma unanimidade entre especialistas, não será abandonado pela Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Pelo contrário. O superintendente da Susepe, Gelson Treiesleben, adianta que até o fim do ano cerca de mil detentos devem estar sob vigilância por satélite. Uma licitação para adquirir lotes de mil dispositivos por ano, num total de 4 mil, está em andamento, e a previsão de Treiesleben é de que o monitoramento volte a funcionar em abril:

– Não sei por que a gestão passada não fez a licitação em 2010. O processo está na fase das impugnações e, depois, poderemos abrir o pregão eletrônico. A partir daí é mais rápido.

A Susepe tem motivos de sobra para apostar nas tornozeleiras. Desde que entrou em funcionamento, em agosto de 2010, apenas quatro presos monitorados foram recolhidos após praticarem novos crimes, de um total de 273 que participaram da iniciativa. Outro trunfo é a redução da superlotação do sistema carcerário, a principal pedra no sapato do órgão estadual.

Custo deve ser reduzido

Além disso, o custo por apenado deverá despencar. Pelo contrato encerrado ontem, o Estado pagava mensalmente R$ 550 por equipamento – incluindo o monitoramento. A expectativa de Treiesleben é que o preço caia para R$ 300 com a nova licitação. O custo médio para manter um apenado é em torno de R$ 600 por mês.

– O gasto do regime aberto deve ser bem menor. Vamos gastar menos em energia, alimentação e pessoal – ressalta o superintendente.

Para o juiz Sidinei Brzuska, da Vara de Execuções Criminais, a iniciativa precisa continuar porque estabeleceu um mecanismo rígido de controle do preso. Ele acredita que dois pontos precisam melhorar: o momento de colocação e revisão do equipamento, com salas mais adequadas, e o acesso às informações, hoje restritas à Susepe:

– Seria um processo transparente. O Ministério Público e o Judiciário devem ter acessar os dados dos apenados a qualquer hora, pela internet.

O controle, porém, ainda é criticado pelo consultor de Segurança Pública e Direitos Humanos Marcos Rolim:

– Sou a favor da tornozeleira quando usada para evitar a prisão. Mas o sistema serve só para controlar o apenado, que segue sem alternativa para sair do mundo do crime. Gasta-se muito com tornozeleira e nada em programas de apoio ao egresso.

Para Carlos Gadea, professor de pós-graduação em Ciências Sociais da Unisinos, com pesquisa em violência urbana, os equipamentos permitem aos detentos menos perigosos ficar em liberdade, o que facilita a reinserção na sociedade. Mas ele chama a atenção para o risco de estigmatização.

Apesar das restrições, parte dos presos que usa os equipamentos não gostou de ter devolvido o dispositivo. Um grupo promete fazer um protesto hoje no Fórum de Novo Hamburgo a favor das tornozeleiras. Com os albergues lotados, não querem ter de retornar para a prisão para dormir.

Avaliação da fase de testes

O QUE FUNCIONOU

- Foi estabelecido um mecanismo de controle sobre a localização exata dos presos a todo instante, o que facilitou o trabalho de fiscalização da Susepe.

- A reincidência foi considerada muito baixa, pois apenas quatro dos 273 apenados que passaram pelo monitoramento cometeram crimes.

- Os detentos escolhidos eram menos perigosos e demonstravam vontade de começar uma vida nova. Tiveram a chance de tentar se reinserir na sociedade.

- O sistema ajudou a diminuir o caos carcerário, reduzindo, ainda que timidamente, a superpopulação dos presídios.

O QUE PRECISA MELHORAR

- O Ministério Público e o Judiciário não têm acesso às informações de localização dos presos, restritas à Susepe. É preciso desenvolver um sistema online, que permita o acesso fácil e rápido aos dados pelos órgãos de fiscalização.

- No momento de colocação ou revisão das tornozeleiras, é necessário ter uma sala adequada para realizar o procedimento, com câmeras e a presença de órgãos públicos e da imprensa, para tornar o processo mais transparente e diminuir chances de erro.

- Se o governo quiser tornar a medida uma política de segurança do Estado, deve aumentar o número de funcionários e recursos para profissionalizar o sistema.

- O governo pretende ampliar o sistema para todo o Estado, hoje restrito à Região Metropolitana e ao Vale do Sinos. A intenção é atingir 1,5 mil presos do regime aberto.

- Nos próximos anos, a Susepe espera ampliar o monitoramento para o regime semiaberto, o principal problema do sistema carcerário atual. Para isso, a lei que rege a vigilância por tornozeleira deverá ser alterada.

- Outro projeto em análise é o uso da tornozeleira para casos especiais, como apenados com restrições aplicadas pela Lei Maria da Penha. Presos que não podem se aproximar da mulher, por exemplo, seriam monitorados.


Outros Estados planejam sistema

Assim como o Rio Grande do Sul, outros Estados também estão em processo de adoção do monitoramento eletrônico para detentos. Em São Paulo, 4.635 apenados do regime semiaberto receberam o equipamento para visitar suas famílias nas festas do final do ano passado. Durante o período, foram registrados poucos casos de irregularidades, como romper o lacre. Em situações como essa, o preso acaba voltando para a cadeia e perde o direito ao aparelho. No Rio de Janeiro, o uso do dispositivo começou no início desta semana. A primeira detenta monitorada vai deixar a penitenciária pela manhã, por quatro meses, para fazer um curso de informática. O governo pretende implantar o equipamento em 300 detentos em uma fase inicial. Em Mato Grosso do Sul, 15 apenados testam a novidade. Se aprovado, o sistema de rastreamento será adotado em todo o Estado. Rondônia e Paraíba também devem dar início ao sistema de monitoramento em breve.

Nenhum comentário: