quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

DESCONTROLE - INTERNET A SERVIÇO DE BANDIDOS PRESOS

TECNOLOGIA DO CRIME. Internet a serviço de presidiários - GUSTAVO AZEVEDO - Zero Hora 24/02/2011

Um novo trunfo tecnológico, impulsionado pelo descontrole do uso de celulares nos presídios gaúchos, desafia as autoridades da segurança pública do Estado.

Para driblar as escutas de conversas telefônicas, uma das principais armas dos policiais para monitorar criminosos, detentos lançam mão agora de aparelhos com acesso à internet. Com smartphones de última geração conectados à banda larga 3G, os apenados conseguem coordenar o tráfico e encomendar crimes usando chats, programas de mensagens instantâneas – como o MSN – e redes sociais. Diferentemente do sinal telefônico, os dados emitidos pela rede mundial são bem mais complicados de serem interceptados e rastreados.

A facilidade com que esses avançados aparelhos entram nas cadeias é assustadora. ZH conversou por MSN com um traficante preso na Capital. Usando um celular para acessar o programa de mensagens instantâneas, o homem fala sobre sua condição de apenado, dando uma pequena mostra do novo poder que os criminosos, mesmos que enclausurados, têm em suas mãos. A Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) confirmou que o interlocutor está no Presídio Central.

Responsável por um levantamento que apontou terem sido apreendidos 2 mil celulares em 20 presídios e albergues da Região Metropolitana em 18 meses – de maio de 2009 a novembro do ano passado –, o juiz Sidinei Brzuska revela que muitos dos equipamentos apreendidos têm tecnologia de acesso à rede.

Segundo ele, os smartphones seriam exclusividade de perigosa minoria: presos com grau de instrução maior e de alta periculosidade.

– Vamos encaminhar um ofício ao Estado para saber se a administração tem propostas para resolver problemas crônicos do setor prisional, como essa questão dos celulares – disse o magistrado.

Apenados mais seguros

O atrativo do uso da internet para os criminosos está na maior dificuldade que as autoridades têm para interceptar as informações trocadas, o que faz com que os presos se sintam mais seguros. O diretor do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc), Joel Souza de Oliveira, explica que o trâmite da autorização judicial para acompanhar os contatos pela internet é o mesmo que para interceptar diálogos telefônicos. A dificuldade em relação aos dados é técnica:

– Chegamos à troca de informações pela internet por meio de escutas. Essas redes passam dados em vez de áudio. As operadoras têm dificuldade de oferecer esses dados à polícia. Estamos na dependência de equipamentos caros, e, às vezes, até as operadoras têm de fazer um grande investimento para chegar a essas informações.

O diretor da Faculdade de Informática da PUCRS, Avelino Zorzo, explica que a maior parte dos dados não fica arquivada nos aparelhos. O professor aponta que os acessos aos sites e às digitações executadas são quase impossíveis de serem coletados depois, mas se a interceptação ocorrer no momento da conexão há condições de visualizar o conteúdo.

– É possível monitorar a rede usada pelo aparelho. Mas, para isso, é preciso agir com antecedência, identificando o telefone. Mas tem de ser no momento do uso, depois é muito difícil rastrear – aponta.

Para o diretor do Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos da Polícia Civil, delegado Emerson Wendt, especialista em crimes cibernéticos, a facilidade com que presos acessam a internet abre caminho para bandidos virtuais.

– Com um smartphone, o preso tem um computador nas mãos. Pode facilmente executar o que chamamos de engenharia social, que é aplicar histórias para ludibriar os outros. Eles podem enviar e-mails falsos, criar páginas que não existem de dentro da cadeia. Se houver casos concretos, vamos investigar – assegurou Wendt.

Os 3 desafios das autoridades. As dificuldades para acabar com a linha direta entre presos e comparsas nas ruas:

1. Entrada de Celulares - Em 2010, a BM e a Susepe apreenderam 6.060 telefones e chips de celulares nas cadeias. A fiscalização deficitária e a conivência de agentes tornam os controles pífios. A inoperância das autoridades facilita a vida dos apenados. A gestão anterior da Susepe anunciou ano passado a compra de dezenas de aparelhos de Raio X e detectores de metais. Prometia a instalação em setembro passado. Segundo a atual administração, nem a licitação para a aquisição dos dispositivos foi aberta.

2. Dificuldade de bloquear sinais - Desde 2006, o governo testa sistemas para bloquear o sinal dos celulares. As tecnologias, porém, nunca conseguiram ser eficientes. A gestão anterior da Susepe executou testes no Presídio Central, mas
os equipamentos atingiram também residências vizinhas. Ano passado, autoridades anunciaram que abandonariam o projeto e investiriam no controle das casas prisionais. A atual administração do órgão já adiantou que voltará a apostar nos bloqueadores de celulares.

3. Inviabilidade de rastrear a Internet - Paralisar o uso da tecnologia de banda larga 3G por parte de detentos é o novo desafio das autoridades. A missão, porém, não é nada fácil, já que os dados são muito difíceis de serem rastreados até mesmo pelas operadoras. Com a internet, os presos driblam as escutas telefônicas e de mensagens
de texto (SMS). A saída será apertar o cerco para entrada dos aparelhos, tentar encontrar bloqueadores de sinais e apostar na investigação policial, que teria condições de rastrear e monitorar as redes com antecedência.

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