quinta-feira, 5 de junho de 2014

DÉFICIT DE 210 MIL VAGAS


Estudo do CNJ revela que prisões brasileiras têm déficit de 210 mil vagas. Situação só não é mais grave porque 147 mil condenados cumprem pena em casa

POR CAROLINA BRÍGIDO
O GLOBO 05/06/2014 6:00

Prisão superlotada: CNJ aponta que faltam vagas em todas as unidades da federação - Arquivo/Divulgação



BRASÍLIA — Estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revela que 567.655 pessoas vivem atrás das grades, hoje no Brasil. Como o sistema carcerário só tem capacidade para 357.219 presos, o déficit chega a 210.436 vagas. Portanto, há no país 37% mais presos do que o sistema comporta. A falta de vagas fica mais abissal ao se considerar o número de presos que cumprem pena em casa: 147.937. Segundo o CNJ, essas pessoas não estão na cadeia por falta de vagas no sistema aberto.

— Agora sabemos que o número de pessoas presas é bem maior do que imaginávamos. Contando com os presos domiciliares, são mais de 715 mil. Até hoje, não havia referência aos presos domiciliares, só a quem estava em unidade prisional. Essa é a grande novidade — avaliou o conselheiro Guilherme Calmon, coordenador do levantamento.

Em dezembro de 2012, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) divulgara dados resumidos da população carcerária. Os números consolidados do órgão, referentes a dezembro de 2009, indicavam uma população do sistema penitenciário de 417.112 pessoas e, das delegacias, de 56.514 (total de 473.626 presos). Em 2012, essa população chegava a 548.003.

Com base nos novos dados, o CNJ deverá recomendar aos governos estaduais que reformulem as unidades prisionais e construam novos presídios, para amenizar a superlotação nas cadeias. Em fiscalizações nas penitenciárias, o CNJ tem flagrado a falta de vagas e de respeito aos direitos humanos.

— Se existe um problema de superlotação carcerária hoje, esse problema é maior do que a gente imaginava. Precisamos garantir condições dignas aos presos — afirmou Calmon.

Intitulado “Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil”, o estudo do CNJ mostra que, do total de presos, 41% são provisórios — ainda não foram julgados, mas cumprem pena. O levantamento, concluído segunda-feira, foi elaborado com base em informações repassadas pelos Tribunais de Justiça de todo o país e é um retrato do sistema carcerário de maio deste ano.

Apesar de alarmantes, o número de presos poderia ser maior. Isso porque há no Brasil 373.991 mandados de prisão aguardando cumprimento. São pessoas que deveriam estar presas, mas estão em liberdade porque as autoridades não as encontraram, ou sequer procuraram.

O CNJ mostra que o Brasil ocupa o quarto lugar na lista de países com maior população prisional, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, da China e da Rússia. Considerando os presos domiciliares, o Brasil sobe para a terceira posição, perdendo apenas para Estados Unidos e China. O órgão também compara o número de presos por habitantes no Brasil com o quadro em outros países. Se aqui temos 358 presos a cada 100 mil habitantes, esse índice é 294 na África do Sul, 212 no México, 149 na Argentina e 78 na Alemanha.

Ainda segundo o CNJ, o estado com maior população carcerária é São Paulo, com 204.946 presos, seguido por Minas Gerais, com 57.498, e Rio de Janeiro, com 35.611. A menor população carcerária está em Roraima, com 1.676 presos. Em Alagoas, eles são 2.531. Faltam vagas nos presídios de todas as unidades da federação. O déficit de vagas é de 90.448 em São Paulo. Em Minas Gerais, faltam 21.400 vagas e em Pernambuco, 21.193. Faltam menos vagas em Roraima (458) e Piauí (460).

Analisando o quadro sob o paradigma de presos provisórios, a situação é mais grave em Sergipe, onde 79% dos 4.666 detentos cumprem pena sem terem sido condenados. Na Bahia, os presos provisórios são 64% do total e no Ceará, 59%. As situações são menos alarmantes em Rondônia (20%) e Acre (27%).

O estado com maior número de presos cumprindo pena em regime domiciliar é São Paulo, com 92.150 pessoas nessa situação. Em seguida, surge Santa Catarina, com 14.472, e Minas Gerais, com 10.954. Na Paraíba, apenas oito presos cumprem pena em casa e no Espírito Santo, 27.

Série histórica elaborada pelo Depen mostra que a população de presos no Brasil cresce a cada ano. Em 2003, eram 308 mil. Em 2004, 336 mil. No ano seguinte, 361 mil. Depois, o número passou para 401 mil. Em 2007, eram 422 mil presos no Brasil. E em 2008, 451 mil. Antes de compilar seus próprios dados, o CNJ usava os números do Depen para planejar suas ações. A principal delas são os mutirões carcerários — visitas feitas por juízes, membros do Ministério Público e advogados aos presídios para detectar eventuais irregularidades. O programa foi criado em 2008, pelo então presidente do CNJ, ministro Gilmar Mendes, que também presidia o Supremo Tribunal Federal (STF). De agosto de 2008 a abril de 2014, os mutirões analisaram 474.857 processos e concederam 91.605 benefícios a presos — como a liberdade, o direito ao trabalho externo e a progressão de regime.


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