ZERO HORA 04/09/2012 - 06h00
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DE SÃO PAULO
Paredes de celas mais finas que o exigido -que podem ser derrubadas com um golpe de marreta- e tetos com risco de desabar são alguns dos problemas que levaram o governo federal a suspender verbas para a construção de presídios em oito Estados.
Indícios de superfaturamento e contratos direcionados também estão entre os fatores que fizeram o Ministério da Justiça interromper o financiamento. O programa envolve cerca de R$ 1,1 bilhão e visa reduzir o déficit de vagas no sistema prisional.
Entre os Estados atingidos estão Bahia, Rio Grande do Sul, Alagoas e Maranhão.
Em junho, o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), responsável pelo programa, suspendeu a aprovação de repasses e análise de projetos em andamento, que chegam a R$ 176 milhões.
A medida foi adotada depois que chegaram ao ministério laudos elaborados pelo Instituto Nacional de Criminalística, da Polícia Federal, em presídios em construção em Santa Catarina. A Folha obteve cópias dos relatórios.
Os peritos da PF acharam indícios de que as obras foram realizadas com materiais de preço inferior ao pactuado. A diferença, diz o Depen, além de representar gastos irregulares, pode comprometer a segurança das prisões.
Nas paredes das celas, por exemplo, o contrato exigia 7,5 cm de espessura de concreto, mas, de acordo com o laudo, ele não superava 3,5 cm.
"O normal são paredes de 15 cm para mais. De 3,5 cm, com uma marretada, dá para ser aberta. É fina demais, é difícil até para executar", diz Claudio Gil, engenheiro civil especializado em estruturas de concreto e dono de empresa que já atuou em presídios.
O laudo também diz que "as lajes do teto das celas não possuem armação, reduzindo a segurança das mesmas".
Editoria de arte/Folhapress
MÓDULOS
Os serviços em Santa Catarina e nos oito Estados com repasses suspensos estão a cargo da empresa Verdi Construções, de Erechim (RS), por meio de um método chamado Siscopen, que usa sistemas modulares de construção, o que agiliza as obras.
O sistema seria de uso exclusivo da empresa, o que permitiria a dispensa de licitações. Essa celeridade do método construtivo foi usada como argumento para a contratação direta da Verdi em ao menos três Estados.
Porém, os peritos encontraram outras empresas no país que utilizam metodologia semelhante, com preços inferiores. Uma cela, orçada por R$ 85,8 mil em Santa Catarina, foi encontrada por R$ 45 mil em empresa de São Paulo.
A polêmica levou o Ministério Público Federal no Paraná a recomendar que o Estado não efetuasse contratos sem licitação para as prisões.
OUTRO LADO
O advogado da Verdi Construções, Andrei Zenkner, diz que o laudo da PF que amparou a decisão do Depen "pretendeu" contrariar conclusões do TCU (Tribunal de Contas da União) de que não houve direcionamento nem "irregularidades significativas" na execução das obras.
"A obra foi concluída e entregue no prazo. O preço da obra foi o de mercado."
Na área criminal, argumenta o advogado, o próprio Ministério Público Federal em Santa Catarina requisitou o arquivamento do caso. A Polícia Federal também não encontrou crimes no projeto.
"Ou seja: TCU, PF e MPF já reconheceram que não há ilícito penal algum na contratação e construção das obras." Segundo Zenkner, a Verdi possui uma tecnologia de concreto de alto desempenho desenvolvida a partir de anos de pesquisa e investimento. "Está em condições de construir obras industrializadas de alta qualidade, preço de mercado e agilidade, dentro da lei e da ética".
O Ministério da Justiça diz que determinou a suspensão "imediata" de propostas que usem o método desenvolvido pela Verdi até que haja um cadastro de preços de referência de itens específicos usados na construção de prisões.
Por conta disso, a Universidade Federal de Santa Catarina está realizando "estudo de aferição, verificação, detalhamento e validação dos insumos" das obras.
Colaborou CRISTINA MORENO DE CASTRO
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