terça-feira, 4 de janeiro de 2011

RECUPERAÇÃO DE PRESOS E VONTADE POLÍTICA

Recuperação de presos e vontade política - Rachel Leroy, advogada e cronista - O Globo, 04/01/2011 às 17h13m; Artigo da leitora

Advogada atuante há quase 20 anos, principalmente no direito penal, tive oportunidade de formar opiniões sobre a população carcerária.

No início de minha militância, lidei com o crime e o criminoso, sendo que meus clientes tinham, em média, de 30 a 40 anos. Passados quase duas décadas, houve uma drástica mudança, não nos delitos em si, mas na idade da população carcerária.

Pude observar que houve um decréscimo na faixa etária. O que antes ia de 30 a 40 anos, hoje tem adolescentes, pessoas que, na sua grande maioria, estão entre 18 e 26 anos.

O perfil das famílias também mudou radicalmente. No inicio da minha militância, eu era procurada pelo pai e pela mãe. Atualmente, só por um ou por outro e, em muitos os casos, somente pela avó ou pelo avô, que passaram a substituir os genitores que morreram ou se perderam pelo mundo, sejam porque não tiveram estrutura para criar os filhos ou porque se envolveram com as drogas e simplesmente desapareceram.

Tenho convivido com jovens que, além de não terem famílias da forma tradicional, se envolveram com o mundo do crime muito cedo e, por isso, a infância e a adolescência se perderam por diversos motivos.

Estes jovens, quando são presos, em sua grande maioria estão vinculados com o tráfico de drogas.

Convivendo com esta população carcerária, pude observar que muitos são oriundos das camadas mais pobres da sociedade, mal sabem ler ou escrever, poucos freqüentaram a escola e não sabem nada ou quase nada sobre seus pais, sua família, sua origem.

Como já dito, durante estes anos de militância com o direito penal e o criminoso, cheguei a uma conclusão assustadora: afinal o que arrasta toda esta população jovem para o mundo do crime? Resposta: a falta de educação.

Descobri que um dos pilares que poderia afastar a juventude do submundo do crime é a educação.

Não é só a educação pura e simples, mas sim aquela que profissionaliza, que esclarece, que abre os olhos e a mente para a crítica, para línguas estrangeiras. Para a evolução, enfim.

Muitos presos, ao caírem na malha do Estado-Cárcere, deveriam passar por uma espécie de triagem para que pudesse ser avaliados sobre a possibilidade de serem aproveitados, recebendo educação e uma profissão, o que os tornaria mais útil para si, para a família e para a sociedade.

Esta profissionalização seria implementada de forma a reingressar o preso na sociedade, cuja formação abria espaço para o trabalho vinculado a uma empresa ou na condição de autônomo, logo que posto em liberdade, retornando para a sociedade de forma menos agressiva.

Tudo isto seria muito bom, se não dependêssemos da vontade do Estado e dos políticos.

Assim, até que todos se conscientizem disto, continuaremos sonhando que um dia descubram que os presos podem ser recuperados. Basta ter educação e vontade. A partir deste dia, viveremos melhor e os presos também. A sociedade agradecerá.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Parabéns, doutora. A senhora acertou um direto numa das maiores causas da insegurança do Brasil - a falta de ressocialização dos apenados. Inserido no final do processo do sistema de ordem pública, a ressocialização do apenado com inclusão social e profissional é vital para tirar estas pessoas da reincidência e do aliciamento criminoso. Durante a pena, o apenado cumprí-la em condições dignas e salubres, com segurança e trabalho para se profissionalizar. Ao término da pena, o ex-apenado precisa de assistência e acompanhamento técnico e psicológico para evitar recaidas e a forte pressão do poder do crime.

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