quinta-feira, 6 de junho de 2013

INSPEÇÃO DA JUSTIÇA EXPÕE ESTRUTURA PRECÁRIA DO INSTITUTO PSIQUIÁTRICO FORENSE

ZERO HORA 06 de junho de 2013 | N° 17454

SÓ MUDA O CÁRCERE

Vara de Execuções Criminais flagrou ainda carência de agentes e celas sem mínimas condições de higiene


EDUARDO ROSA

O Instituto Psiquiátrico Forense (IPF) Maurício Cardoso, na Capital, que recebe criminosos com problemas psiquiátricos, tem estrutura física deteriorada, higiene precária e insuficiência de agentes penitenciários. Dos 438 detentos, 56 já cumpriram medida de segurança e permanecem na instituição porque não têm para onde ir.

Estas são algumas das constatações feitas durante o Mutirão Carcerário 2013, que inspecionou quase 30 casas prisionais da Capital e da Região Metropolitana. O relatório será enviado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos próximos dias. Na manhã de ontem, Zero Hora acompanhou a visita do juiz Paulo Augusto Irion à instituição. O magistrado deparou com um cenário parecido com o das cadeias comuns, que têm dificuldade para ressocializar os presos:

– Teria de ser apropriado para recuperar ao convívio. Há problemas no prédio e de higiene.

Um dos espaços mais críticos é a Unidade G, abrigo de pacientes que passam por desintoxicação. As paredes estão chamuscadas, a rede elétrica fica à mostra e o banheiro sem porta faz com que o cheiro de fezes invada o dormitório. Azulejos quebrados e umidade completam o cenário, que receberá melhorias depois de dois incêndios terem sido provocados neste ano, informa a diretora-adjunta Aline Medeiros. As reclamações dos pacientes da ala estão relacionadas, principalmente, a proibições como cigarro e chimarrão.

– Existe restrições sim, e eles têm de internalizar esses limites. Há tratamento específico para drogadição e vemos resultados positivos – explica a diretora do instituto, psicóloga Magda Pires.

No espaço destinado a 42 homens que cumprem medida de segurança em regime fechado, faltam lençóis e forro nos colchões. Roupas ficam estendidas no meio das celas, internos dormem debaixo de camas, o odor de urina é forte e câmeras de monitoramento estão desativadas por não terem manutenção.

Um bloco é dedicado à triagem – acolhe criminosos que esperam pela perícia ou decisão que os encaminhará para a casa adequada, seja o instituto psiquiátrico ou uma prisão. Após avaliação, somente 13% dos casos resultam em medidas de segurança – 8% para tratamento ambulatorial e 5% para internação.

– Chama a atenção a falta de privacidade aqui – salienta Irion, referindo-se ao fato de a latrina ficar dentro da cela coletiva, sem divisão alguma.

Problema histórico do sistema carcerário no Estado, a insuficiência de servidores também é recorrente no IPF – são 10 agentes, quando o adequado seria mais do que o dobro.

Criminosos condenados à “prisão perpétua”

Dentro dos prédios da Avenida Bento Gonçalves, 56 homens e mulheres permanecem mais tempo do que deveriam no IPF.

Outro exemplo de gente que entrou no IPF e não tem perspectiva de sair é um homem de 51 anos que foi a júri pelo assassinato do pai. A renovação do laudo psiquiátrico o mantém recluso por 26 anos, quase o dobro da provável pena que receberia se fosse cumpri-la em um presídio comum.

– Todos se submetem à perícia anual para receber alta. Mas temos casos de pessoas que cumprem uma “prisão perpétua” – comenta a diretora Magda Pires sobre a renovação dos atestados de periculosidade.


UM LUGAR PARA DOENTES. Mais da metade dos pacientes têm esquizofrenia

- O Instituto Psiquiátrico Forense Maurício Cardoso, de Porto Alegre, é onde ficam criminosos com problemas psiquiátricos de diferentes regiões do Estado. É composto de seis unidades, mais uma ala para triagem.

- Atualmente, há 438 pessoas cumprindo medida de segurança. Diferente de grande parte das cadeias, não há superlotação.

- Os crimes mais comuns são homicídio e tentativa de homicídio.

- A esquizofrenia representa mais da metade dos casos.

- A maioria dos pacientes é homem – 11 mulheres vivem no IPF e 42 contam com alta progressiva, ou seja, em determinado intervalo de tempo, precisam se apresentar no IPF.

- O instituto integra a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Mas a diretora Magda Pires afirma que há uma discussão para que seja ligado à área da saúde.


MEDIDA MAIS DURA

Juiz critica tempo de internação em sentença


Em sentença que condenou um infrator de 16 anos por matar um homem após uma discussão em um baile, um juiz de Dom Pedrito criticou o curto prazo de internação para adolescentes que tenham cometido crimes graves. No texto, o magistrado escreveu: “... o representado possui apenas 16 anos de idade e ficará poucos meses internado na CASE (Centro de Atendimento Socioeducativo) de Santa Maria, enquanto a vítima perdeu a vida por discutir com um piá”.

Em um desentendimento na madrugada de 20 de abril, o adolescente e a vítima foram retirados pelos seguranças para fora do baile em que estavam. Em seguida, o infrator foi até uma esquina próxima ao local para buscar o revólver calibre 22 que havia escondido e, ao retornar, disparou um tiro na nuca de João Eduardo Lopes dos Reis, 43 anos.

Embora saiba que casos como esse fomentem a questão da redução da maioridade penal, o juiz da Infância e Juventude Alexandre Del Gaudio Fonseca acredita que tal medida seria ainda mais prejudicial à atual situação dos presídios, que, além de oferecerem estruturas precárias, estão superlotados.

– Uma medida correta, no entanto, seria aumentar o período de internação de adolescentes que tenham cometidos crimes graves para pelo menos até os 24 anos. Hoje, o infrator fica internado no máximo até os 21 anos – explica Gaudio.

Especialista defende internação mais longa

O curto prazo de internação também é criticado por especialistas como o advogado criminalista Alexandre Wunderlich. De acordo com o professor de Direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), é fundamental que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) seja revisto, uma vez que já se passaram duas décadas desde o início de sua aplicação.

– É preciso reconhecer que há um lapso, que existem algumas ineficiências que devem ser reparadas a fim de que as linhas gerais do ECA se mantenham estabelecendo os 18 anos como idade penal – defende Wunderlich.

BRUNA SCIREA






Nenhum comentário: