segunda-feira, 26 de abril de 2010

CORRUPÇÃO NAS CADEIAS. Agentes apreendem menos celulares que a BM.


CORRUPÇÃO NAS CADEIAS. Agentes apreendem menos celulares - CARLOS ETCHICHURY

Usados como meio de comunicação entre quadrilhas e para aplicar golpes como o do falso sequestro, os telefones celulares são o foco de uma estatística que alarmou a Justiça: em prisões sob o controle da Brigada Militar, o número de aparelhos apreendidos é o dobro, comparado ao dos presídios aos cuidados da Susepe.

Um relatório da Justiça referente às apreensões de celulares realizadas em 25 presídios e albergues da Região Metropolitana, que concentram cerca de 14 mil apenados, revela que apenas um em cada três aparelhos recolhidos e notificados à Vara de Execuções Criminais (VEC) estava em cadeias controladas por agentes penitenciários.

Nas prisões sob controle da Brigada Militar, a apreensão é o dobro. A disparidade surpreendeu o juiz Sidinei Brzuska, que em documento enviado para o superintendente dos Serviços Penitenciários (Susepe), Mario Santa Maria Junior, no dia 1º de abril, questionou:

“Cotejando-se os números (informados pela Brigada Militar e pela Susepe) é possível arriscar a ilação de que ou os estabelecimentos administrados pela Susepe resolveram o problema dos celulares no interior das prisões ou não estão fiscalizando adequadamente o ingresso dos aparelhos nas casas prisionais.”

Em 20 de agosto do ano passado, a VEC determinou que todas as apreensões de celulares nas prisões abrigos e albergues da região – em poder de visitas ou nos fundos de galerias – sejam comunicados em relatórios remetidos ao judiciário a cada três meses. Zero Hora teve acesso aos documentos enviados pelas administrações prisionais, vinculadas à Susepe, e pelos diretores do Presídio Central e da Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ), as duas maiores prisões do Estado, comandadas pelas Brigada Militar.

De todos os 578 aparelhos notificados ao Judiciário desde aquela data, 375 (64,8%) foram comunicados pelas direções da PEJ e do Central, que concentram cerca de 7 mil presos. Os outros 203 (35,2%) aparelhos estavam nos demais 23 estabelecimentos, que acomodam um número similar de detentos.

Nas administrações militares, além de mais telefones móveis, foram localizados quatro revólveres e cinco pistolas.

A disparidade que surpreendeu o magistrado pode ser interpretada de diferentes maneiras. Uma delas é a possibilidade de a BM ser mais ágil que a Susepe na comunicação dos fatos. Outra diz respeito ao perfil das prisões. Como são superlotadas e, também por isso, têm mecanismos de controle mais frágeis, o Central e a PEJ podem abrigar mais celulares em poder de bandidos. Para um promotor da VEC, porém, é possível que a BM esteja sendo mais eficiente.

– O fato de ter mais apreensão não significa, necessariamente, que entrem mais celulares. Pode ser que a Brigada esteja apertando mais que os agentes – adverte um promotor, que prefere não ser identificado.

Falta efetivo, diz sindicato

É impossível saber, com precisão, onde há mais celulares em poder dos criminosos. Mas um teste, realizado nos dias 24, 25 e 26 de agosto de 2009, com uso de equipamento que identifica aparelhos móveis, constatou o funcionamento de 361 celulares em seis das principais prisões da Região Metropolitana. A verificação identificou que, embora o Central (com 69) e a PEJ (85) concentrassem a maior quantidade de telefones, as penitenciárias de Montenegro (70), de Alta Segurança de Charqueadas (48) e modulada de Charqueadas (38) e Feminina Madre Pelletier (41) tinham celulares a mancheias.

Para o vice-presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Rio Grande do Sul, Flavio Berneira Júnior, a carência de efetivo e de equipamentos ajuda a interpretar discrepância.

– A Penitenciária Modulada de Charqueadas, por exemplo, previa 17 agentes em cada módulo quando foi inaugurada. Sabe quantos trabalham por módulo hoje? Três. É impossível. Tudo fica prejudicado, desde a segurança até a localização de celulares e armas.

Na opinião de Berneira, se houvesse aparelhos detectores de metais e de raio X em funcionamento, semelhantes aos existentes nos aeroportos, a corrupção justificaria o ingresso dos celulares.

– Mas sem equipamentos de segurança e faltando gente, não podemos culpar os agentes – complementa.

O sindicalista pondera que, para retirar de circulação aparelhos em estabelecimentos dos regimes aberto e semiaberto, são necessários grandes operações, que envolvam o entorno dos estabelecimentos.

Zero Hora tentou conversar com representantes da Susepe, mas não houve retorno aos chamados.

Susepe não informa os telefones usados

A Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) não informou à Justiça quantos celulares são utilizados durante o expediente de trabalho por agentes penitenciários que atuam nas cadeias da Região Metropolitana. O pedido foi formalizado pela Vara de Execuções Criminais em setembro passado.

A partir da informação de que havia pelo menos 361 celulares em funcionamento nas sete principais prisões do Estado, em agosto de 2009, Sidinei Brzuska, juiz da VEC, solicitou o número dos aparelhos dos servidores civis e militares em atividade. A ideia era saber, a partir das informações repassadas pela Brigada Militar e pela Susepe, quantos dos 361 telefones eram utilizados legalmente pelos servidores dos seis presídios. A Brigada Militar respondeu: havia 24 em poder de PMs no Presídio Central e outros nove a serviço dos militares, na Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ).

A Susepe, porém, não informou à Justiça. Há pelo menos duas hipóteses para ausência de manifestação. A melhor: o acúmulo de trabalho tem atrasado o comunicado à Justiça. A pior: o silêncio sugere que a superintendência não sabe quantos celulares são usados pelos servidores nas prisões.

Diante da desinformação, o magistrado expediu o ofício número 90/2009, em 9 de novembro, reforçando a solicitação e alertando:

“...não havendo manifestação, todos os aparelhos móveis serão considerados irregulares.”

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