terça-feira, 24 de setembro de 2013

CADEIA NOVA, VELHOS PROBLEMAS



ZERO HORA 24 de setembro de 2013 | N° 17563


JOSÉ LUIS COSTA

ARROIO DOS RATOS. Pouco mais de um ano após a inauguração, mais recente penitenciária da Região Metropolitana já tem sinais de degradação


Inaugurada há pouco mais de um ano com custo total de R$ 21 milhões, a mais nova cadeia da Região Metropolitana, a Penitenciária Estadual de Arroio dos Ratos já exibe sinais de degradação semelhantes aos que corroem antigas prisões gaúchas. Além de falhas de concepção no projeto – o modelo já foi abandonado pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen) –, um defeito no sistema de esgoto tem inundado celas e o pátio, lembrando uma cena típica do Presídio Central de Porto Alegre.

Conforme constatado em inspeções da Vara de Execuções Criminais da Capital (VEC), dejetos das pias, dos chuveiros e dos sanitários, que deveriam escoar para a caixa de distribuição de efluentes, retornam para o interior das celas. Um dos motivos seria a pouca inclinação na rede de esgoto. Para não ficarem ilhados no meio da sujeira, os presos estão “desentupindo” a tubulação, quebrando canos e conexões com pedaços de paus e cabos de vassoura, e os resíduos acabam indo para o pátio.

– São problemas que não deveriam estar ocorrendo em uma unidade prisional nova. É preciso avaliar se a umidade dos vazamentos pode ou não comprometer a estrutura, tornando mais fácil a abertura de buracos – lamenta o juiz Sidinei Brzuska, da VEC.

Em junho, ele cobrou medidas para resolver o problema, mas a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) não teria apresentado respostas ao juiz. Na semana passada, o temor do magistrado se confirmou. Em uma cela, foi descoberto um buraco no piso, sob a cama, contendo três facas de cozinha, dois ponteiros de ferro e dois estoques (facas artesanais) com 30 centímetros de comprimento.

Além do esgoto, a cadeia tem problemas estruturais. Os pátios são isolados por telas – em vez de muros – e não existem grades. Na parte dos fundos das celas, aberturas circulares com 15 centímetros de diâmetro substituem janelas. Na frente, as paredes são vazadas, com fendas retangulares – 70 centímetros de altura por 15 de largura. Para completar, ao abrir as portas, os agentes ficam de frente para os presos, sem nenhum tipo de barreira de proteção.

Presídio foi alvo de críticas por parte de autoridades

Antes mesmo de ficar pronta, a penitenciária foi alvo de críticas de autoridades. Em maio de 2012, em visita às obras, a comitiva da ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, deixou o local apreensiva. Na ocasião, técnicos do Depen, que acompanhavam a vistoria, afirmaram que o padrão arquitetônico estava ultrapassado e que cadeias de modelo semelhante não seriam mais construídas.

Duas semanas depois, técnicos do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) apontaram as mesmas deficiências. Recomendaram que, em razão das fragilidades, a cadeia fosse ocupada apenas por presos de primeiro ingresso ou com histórico de bom comportamento. Mas a sugestão não pode ser seguida, devido à necessidade de se reduzir a superlotação do Presídio Central. Atualmente, estão recolhidos em Arroio dos Ratos 639 apenados – a capacidade é de 672 vagas.


CONTRAPONTOS

O que diz a Susepe
- A Susepe se manifestou apenas sobre a inexistência de muros. Lembrou que, conforme a resolução 09/2011, do Ministério da Justiça, a barreira física de um estabelecimento prisional pode ser tanto um alambrado quanto um muro. No caso de Arroio dos Ratos, o alambrado foi construído com altura de seis metros, com concertina (arame farpado, enrolado em formato de fole) na parte superior. O alambrado proporciona visibilidade ao agente penitenciário nas guaritas. Em relação ao esgoto, a Susepe informou que o assunto deveria ser tratado com a Secretaria Estadual de Obras Públicas.

O que diz a Secretaria Estadual de Obras Públicas, Irrigação e Desenvolvimento Urbano - Conforme a assessoria de comunicação da Secretaria de Obras Públicas, a Susepe não encaminhou pedido para conserto da rede de esgoto.

FALHAS EM CADEIA. Presídio tem problemas estruturais que começaram no projeto, concebido com base em um modelo em desuso

- A Penitenciária Estadual de Arroio dos Ratos nasceu condenada por causa de problema estruturais. Com paredes e aberturas inadequadas, é considerada frágil para a contenção de presos.

- Anunciada na gestão da governadora Yeda Crusius, em julho de 2009, a cadeia foi concebida com base em um projeto arquitetônico do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que, tempos depois, foi aposentado pelo próprio Depen.

- O governo federal havia disponibilizado verba de R$ 21 milhões para a obra, mas o repasse foi cancelado em seguida, sob a alegação de demora do Estado em iniciar a construção.

- O Piratini decidiu bancar a obra, iniciada em janeiro de 2010, com a promessa de ser inaugurada em julho de 2011. Depois, a abertura foi prorrogada para março de 2012.

- A obra foi concluída em junho e ocupada a partir de agosto.

- Em fevereiro, durante o Carnaval, 83 detentos, revoltados por terem sido levados do Presídio Central para Arroio dos Ratos, arrancaram com facilidade as portas da galeria D. A rebelião foi controlada após a entrada do Batalhão de Operações Especiais da BM.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O que querem aqueles governantes que executam suas políticas penitenciárias para a mídia como se estivessem em campanha política permanente, sem se preocuparem com a finalidade  e objetivos da execução penal. Os estabelecimentos penais deveriam ser construídos por comissões integrando os poderes responsáveis pela aplicação, execução, controle e fiscalização da execução penal. Atualmente, os poderes só se preocupam em depositar seres humanos em cadeias sem averiguar as condições sanitárias, de tratamento, segurança e trabalho no interior das unidades.  Assim, o poder administrativo só se preocupa em construir o isolamento e montar uma guarda simples;  o judiciário que deveria supervisionar lava as mãos; o MP que faz o controle externo não está nem aí; a defensoria não se preocupa em defender direitos dos presos; os policiais acreditam que prender já é cumprir o dever; e a administração prisional fica lutando contra a insuficiência de meios para fazer o controle e conter a indisciplina, o domínio das facções, a depredação dos prédios e a entrada de drogas, armas e celulares, entre outros problemas.

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