quarta-feira, 19 de abril de 2017

A BRIGADA NOS PRESÍDIOS ESTÁ NO LIMITE



ZERO HORA 19 de abril de 2017 | N° 18823

ENTREVISTA

ANDREIS DAL'LAGO, Comandante-geral da BM

POR: Carlos Ismael Moreira



O coronel Andreis Silvio Dal’Lago, 54 anos, comandante-geral da Brigada Militar, recebeu o Grupo de Investigação da RBS (GDI) no Quartel-General da corporação ontem. O oficial afirmou que a atuação de PMs em cadeias gaúchas – que se arrasta por 22 anos – está no “limite”. E reforçou o discurso de quando tomou posse em 25 de janeiro deste ano e afirmou diante do governador José Ivo Sartori que a “defasagem histórica do potencial humano não é motivo para nos abatermos e, sim, momento de desafio para todos, seja dos agentes políticos e sobretudo daqueles detentores do cargo e função pública”. A conversa ocorreu um dia após reportagem mostrar que o gasto do governo em diárias para os PMs que trabalham nos presídios consumiu R$ 82,2 milhões entre 2011 e 2016, além de comprovar como o benefício, que deveria ser eventual, se tornou permanente. Leia trechos da entrevista.

A Brigada reconhece que o pagamento das diárias para os PMs nos presídios virou incremento salarial?

O efetivo precisava vir de algum lugar do Estado. Por exemplo, não posso tirar aqui de Porto Alegre 300 homens. Imagine como iria ficar a questão da criminalidade? Vindo gente do Interior, obviamente é preciso haver ressarcimento. Havia e há necessidade de um treinamento. Portanto, para essas pessoas se deslocarem do Interior, a legislação prevê o pagamento de valor para atender suas despesas, no caso, a diária. Isso, desde aquele período de 1995 até hoje, assim é feito. O ordenador de despesas dessas diárias é a Susepe. Nós apenas alocamos as pessoas, que passam à disposição da força-tarefa em tempo integral e ali desenvolvem a sua atividade, desde 1995 até hoje, no mesmo ritmo.

O Ministério Público de Contas entende que esse pagamento ininterrupto desvirtua o instituto da diária. Se o senhor tivesse de definir essa situação em uma palavra, seria ilegal, irregular ou correta?

O policial que sai do interior do Estado e vem para a Capital ou vai para Charqueadas exercer a atividade tem direito a uma compensação remuneratória pelas despesas que ele efetua. Primeiro. Segundo, a motivação da força-tarefa, de 1995 até hoje, continua a mesma. Imagine hoje a Brigada Militar sair do Central, o que eu gostaria muito, tanto que temos uma PEC (proposta de emenda à Constituição) na Assembleia que o governador Sartori encaminhou. Também tem um concurso em andamento para a Susepe, porque para nós sairmos tem de empoderar o órgão responsável. E nós queremos sair de dentro e da guarda externa, o que daria 1,5 mil homens para colocar no policiamento ostensivo, só que a guarda-externa é missão exclusiva da BM, o que nós queremos tirar da Constituição para que a própria Susepe ou outro órgão treine alguém para ficar nos muros.

Mas do ponto de vista legal, o senhor reconhece que a prática é irregular?


Isso é o Tribunal de Contas do Estado que tem de responder. O policial tem direito a receber a diária, a legislação é clara. O que o comandante da BM faz ao trazer um policial do Interior e colocar aqui em Porto Alegre ou Charqueadas? Cumpre a lei, ele tem direito à diária. A Susepe, que é ordenadora, faz o pagamento. Nesse aspecto de ser continuado ou não, quem deve responder é quem ordena a despesa. Se a Susepe não pagar a diária, o policial militar vai dizer “só um pouquinho, quero voltar”, porque tem direito a receber. Se é legal ou não, é com o Tribunal de Contas e com quem ordena a despesa.

O levantamento da reportagem também identificou transferências de servidores que trabalham na Capital para cidades do Interior, realizadas apenas no papel, de forma a justificar o pagamento das diárias. Nesse caso, não há uma irregularidade clara?

O que tem é a necessidade do completamento do efetivo. Hoje, temos um problema sério, poucos policiais são voluntários para ir para o presídio. Por orientação do Tribunal de Contas, esse tipo de transferência desde 2015 não foi mais feito. E no momento que isso não foi mais feito pela corporação, para atender ao interesse público de ter alguém na força-tarefa, ficamos na situação de não ter mais ninguém para mandar para lá. Aí sugerimos a criação dessa gratificação prisional, que não depende de nenhuma movimentação, deslocamentos. Nós fomos chamados a resolver um problema do Estado. Se o PM ganha diária, ela é legítima e legal. “Ah, mas não devia ser todo esse tempo”. Mas não é problema da corporação. Por mim, tiro hoje o efetivo que tenho lá. No início de 2015 dissemos: olha, secretário, precisamos criar uma vantagem que atenda à demanda dos policiais que vêm para cá e não necessite de movimento. Por isso, surgiu a gratificação. E até implementarmos essa vantagem, é um dos motivos pelo qual a Brigada Militar nos presídios está no limite.

A gratificação não irá se converter em mecanismo para estender a permanência da BM nos presídios ao regularizar o pagamento da vantagem?

Espero que não. Vai se criar algo, legalizar uma vantagem de uma força-tarefa que não é da rotina, da regra do Estado. Mas, como disse, primeiro: temos de atender as orientações dos órgãos.



Secretaria da Segurança se manifesta sobre diárias

Por meio de nota, a SSP se manifestou ontem. O governo afirma que “trabalha para corrigir uma distorção histórica” e alega que foi criada a Gratificação por Desempenho de Atividade Prisional (GDAP). Conforme a SSP, para que o benefício entre vigor e comece a ser pago em substituição às diárias contínuas, precisa ser “regulamentado por decreto” e a “proposta de aguarda parecer da Procuradoria Geral do Estado”.


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