sábado, 29 de maio de 2010

CAOS PRISIONAL - SISTEMA BATE RECORDE HISTÓRICO: 30 MIL PRESOS.


Número de presos no sistema carcerário do RS aumenta 117% em 10 anos. Sistema acaba de bater um recorde histórico: superou a marca dos 30 mil presos - Juliana Bublitz - Zero Hora - 29/05/2010

Maculado por denúncias de corrupção, cadeias deterioradas e celas superlotadas, o sistema carcerário gaúcho acaba de bater um recorde histórico: superou a marca dos 30 mil presos. A marca é o retrato de uma tendência que vem se insinuando nos últimos 10 anos.

Entre 2000 e 2010, as prisões gaúchas receberam nada menos do que 117,5% a mais de apenados, enquanto a população do Estado cresceu apenas 7%. As explicações para o fenômeno, segundo especialistas, são múltiplas – do avanço do crack à reação de comunidades à violência.

A velocidade da escalada de presos superou o ritmo com que novas grades foram erguidas, segundo dados da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

Na última década, a cada duas pessoas levadas ao cárcere, uma vaga foi aberta. O resultado não poderia ser outro. A defasagem representa um déficit de 10.880 vagas, conforme a Promotoria de Controle e Execução Criminal.

Apesar da inauguração de albergues emergenciais e de uma penitenciária para receber criminosos, a situação se agrava a cada semana. No dia 18, pela primeira vez na história, a Susepe registrou um contingente de 30.005 presidiários em suas dependências. Como o número oscila, na sexta-feira, a contagem divulgada no site do órgão era menor, de 29.981 presos, mas nem por isso menos expressiva.

A maioria dos homens e mulheres por trás dos números tem entre 25 e 29 anos, Ensino Fundamental incompleto e mais de uma entrada no sistema – ao todo, 61,9% deles são reincidentes. O índice é um indicativo, segundo o promotor Gilmar Bortolotto, que há 12 anos atua na fiscalização de presídios, de que a chance de recuperação de apenados é mínima. Mais do que isso. Para o representante do Ministério Público, a incapacidade de regeneração do sistema é uma das explicações para a multiplicação da massa carcerária.

– O ambiente prisional vem se deteriorando com o passar dos anos e se tornando uma espécie de catalisador de criminosos. Os presos saem piores do que entraram, praticam novos crimes, voltam para a prisão, e o ciclo recomeça – diz Bortolotto.

O fenômeno, porém, não explica tudo. Outros fatores, como o avanço do crack na última década, são apontados por estudiosos como fundamentais para o boom de apenados no Estado e também no Brasil, onde o total de presos subiu espantosos 103,5% na última década, convergindo com a estatística estadual.

Cerco às drogas compõe o quadro de explicações

Como nenhuma outra droga, a pedra da morte trouxe consigo um séquito de usuários fora de controle, capazes de tudo para manter o vício. Doentes e sem freios sociais, muitos deles, ao lado de traficantes perigosos, acabaram engrossando o exército de delinquentes enclausurado nas cadeias e contribuindo para a explosão nos números.

Pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Violência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o sociólogo Juan Mario Fandino Mariño tem convicção de que o reforço no combate ao tráfico está por trás desse aumento.

Fandino afirma que, desde o início dos anos 2000, comunidades cansadas dos mandos e desmandos dos chefes de bocas-de-fumo em diferentes regiões brasileiras decidiram reagir e exigir respostas da polícia.

Para reduzir crimes como homicídios, furtos e roubos, passava a ser imperativo atacar o comércio de drogas e seus tentáculos. Foi que fizeram os governos de Estados como São Paulo e Rio de Janeiro – nesta última, as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) se tornaram exemplos de reabilitação, ao incidirem diretamente nas favelas cariocas, historicamente corrompidas pelo tráfico.

Por aqui, a aposta não foi diferente. Segundo o comandante-geral da Brigada Militar, coronel João Carlos Trindade, a luta contra as drogas virou prioridade. Operações foram intensificadas, e as prisões aumentaram. Em 2006, conforme Trindade, a corporação prendeu 33.490 pessoas. No ano passado, foram 141.638. Muitas acabaram soltas. Mesmo assim, o comandante garante que “nunca se prendeu tanto”.

– A maioria das prisões teve relação com o tráfico, e isso está se refletindo na diminuição de outros índices de criminalidade – comemora Trindade.

Paradoxalmente, a iniciativa origina um novo impasse: a superlotação das cadeias, que por sua vez contribui para o surgimento de novos e aparentemente intermináveis problemas. Enquanto a bola de neve do sistema carcerário não for detida, alertam Fandino e Bortolotto, o mundo do crime continuará se retroalimentando.

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