ZERO HORA 02/04/2015 | 04h56
por Marcelo Monteiro
Proposta aprovada em comissão da Câmara reaquece debate sobre maioridade penal
Favoráveis e contrários à detenção de quem comete infração a partir dos 16 anos iniciam duelo na defesa de seus pontos de vista
Defensores dizem que criminalidade em alta força alteração, mas críticos afirmam que cárcere pouco recupera Foto: Germano Rorato / Especial
Um acirrado debate entre defensores e opositores da redução da maioridade penal no país de 18 para 16 anos se intensificou na última terça-feira. Com mais de 22 anos de tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o projeto foi autorizado a seguir em frente e agora será debatido em grupo criado para essa finalidade no parlamento.
Nessa discussão, de um lado estão parlamentares de siglas como PSDB, DEM, PR e PSD, apoiados por familiares de vítimas de crimes cometidos por menores. De outro, bancadas de PT, PSOL, PPS e PC do B, além de entidades e ONGs de defesa da criança e do adolescente.
O debate está centrado em dois eixos: o prático e o constitucional. Além da legalidade da mudança na idade mínima para imputação de crimes no país, o tema aborda os possíveis efeitos da redução da maioridade nos índices de criminalidade.
Para os defensores da medida, como o arcebispo da Paraíba, dom Aldo Pagotto, a mudança, “hoje uma exigência da sociedade”, ajudaria a diminuir a violência. O religioso, porém, defende que o Estado apresente alternativas que proporcionem a ressocialização dos infratores e diz que, uma vez presos, os jovens não possam ser alocados em presídios, ao lado dos presos comuns.
Na mesma linha, o deputado federal Covatti Filho (PP-RS) defende tratamento diferenciado para os jovens que venham a ser condenados. Segundo ele, caso a legislação seja alterada, será necessário construir “presídios juvenis” para abrigar os apenados:
– Os jovens de hoje não são a mesma coisa do que os jovens dos anos 1940, quando foi regulamentada a maioridade de 18 anos.
A possível redução da faixa etária gerou reações por parte de diversas entidades, como o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, que se manifestou contrário à medida. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) avalia que “a criminalidade envolvendo crianças e adolescentes requer atenção especial das autoridades e da sociedade, mas não se deve deixar que a comoção leve a caminhos que não irão resolver o problema”.
A Fundação Abrinq afirma que “o adolescente é pessoa em desenvolvimento, que os jovens autores de ato infracional têm, em sua maioria, seus direitos violados antes de cometerem o ato infracional”.
Na opinião do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo Costa, além de inconstitucional, “falar em redução da maioridade é um retrocesso”. Opinião semelhante tem a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), ex-ministra dos Direitos Humanos, para quem a medida, se adotada, poderá ampliar a violência no país, em vez de diminuí-la.
– Os adolescentes respondem por menos de 1% dos atos contra a vida. Desses, todos, invariavelmente, recebem medida judicial de privação de liberdade, o que tem levado a um índice de ressocialização superior a 70%. No entanto, quando se analisa a situação dos presídios, ocorre exatamente o contrário:
– A reincidência no crime nas unidades prisionais ultrapassa os 70% – compara a deputada.
Longo debate
* No dia 8 de abril será instalada a comissão especial da Câmara que analisará o mérito e dará parecer à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171-A/93 que altera a faixa etária de responsabilidade penal de 18 para 16 anos no país. A comissão já foi criada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que encaminhou ofício aos líderes partidários para que indiquem seus representantes.
* Na primeira reunião, a comissão elegerá o presidente e os vice-presidentes e designará o relator. Caberá ao colegiado debater o mérito do projeto, fazer audiências públicas para discutir a mudança da imputabilidade penal, com a redução da maioridade penal, e elaborar um parecer sobre a proposta a ser votada pela comissão.
* Pelo regimento da Câmara, a comissão pode discutir a proposta por até 40 sessões plenárias. Caso não seja apreciada nesse prazo, a matéria poderá ser discutida por tempo indeterminado.
* O presidente da Câmara, no entanto, poderá avocar a proposta para apreciação em plenário, caso a comissão não consiga deliberar sobre o tema dentro de um prazo razoável.
* Uma vez aprovada, a proposta será encaminhada à apreciação do plenário da Câmara, em dois turnos de votação. Para a aprovação, são necessários no mínimo 308 votos, nos dois turnos. Se for aprovada na Câmara, a PEC segue para apreciação e votação no Senado.
* Se tiver alteração no Senado, passa por nova votação na Câmara.
Como é em outros países
No ano passado, em plebiscito, os uruguaios rejeitaram a proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Ao lado de Brasil, México, Colômbia, Venezuela, Peru e Equador, o país vizinho é um dos que têm a maior idade mínima prevista para prisão em caso de crimes.
Na Argentina, o limite era de 14 anos até 1983, quando a maioridade subiu para 16 anos. Entretanto, hoje há setores que pregam o retorno à antiga idade mínima.
Nos Estados Unidos, a idade mínima para uma pessoa ir para a cadeia varia entre seis e 12 anos, conforme o Estado. Uma das unidades federativas mais rigorosas é a Carolina do Norte, onde crianças a partir de de seis anos já podem ser presas.
Estados Unidos: 6 a 12 anos, dependendo do Estado
África do Sul, Bangladesh, Índia, Indonésia, Nigéria, Paquistão, Quênia, Sudão e Tanzânia: 7 anos
Escócia: 8 anos
Irã: 9 anos (meninas) e 15 anos (meninos)
Austrália, Hong Kong, Inglaterra, Nova Zelândia e Ucrânia: 10 anos
Turquia: 11 anos
Canadá, Costa Rica e Hungria: 12 anos
França: 13 anos
Alemanha, Bolívia, China, Croácia, Espanha, Itália, Japão e Paraguai: 14 anos
Dinamarca, Finlândia, Noruega, Polônia e Suécia: 15 anos
Argentina, Chile, Cuba e Rússia*:16
*Em casos graves, como assassinato e estupro, cai para 14 anos
Brasil, Equador, Colômbia, México, Peru, Uruguai e Venezuela: 18 anos
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O que corrige é a certeza da punição e por isto uma das alternativas é a prisão para isolar da sociedade, reeducar, ressocializar e reintegrar, mostrando ao autor e aos outros que o crime não compensa. É um tremendo equívoco deixar de tomar medidas duras contra o crime alegando a inoperância, a ineficiência, as omissões, a conivência, as negligências e a fuga de obrigações dos poderes, instituições e órgãos na execução penal.
por Marcelo Monteiro
Proposta aprovada em comissão da Câmara reaquece debate sobre maioridade penal
Favoráveis e contrários à detenção de quem comete infração a partir dos 16 anos iniciam duelo na defesa de seus pontos de vista
Defensores dizem que criminalidade em alta força alteração, mas críticos afirmam que cárcere pouco recupera Foto: Germano Rorato / Especial
Um acirrado debate entre defensores e opositores da redução da maioridade penal no país de 18 para 16 anos se intensificou na última terça-feira. Com mais de 22 anos de tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o projeto foi autorizado a seguir em frente e agora será debatido em grupo criado para essa finalidade no parlamento.
Nessa discussão, de um lado estão parlamentares de siglas como PSDB, DEM, PR e PSD, apoiados por familiares de vítimas de crimes cometidos por menores. De outro, bancadas de PT, PSOL, PPS e PC do B, além de entidades e ONGs de defesa da criança e do adolescente.
O debate está centrado em dois eixos: o prático e o constitucional. Além da legalidade da mudança na idade mínima para imputação de crimes no país, o tema aborda os possíveis efeitos da redução da maioridade nos índices de criminalidade.
Para os defensores da medida, como o arcebispo da Paraíba, dom Aldo Pagotto, a mudança, “hoje uma exigência da sociedade”, ajudaria a diminuir a violência. O religioso, porém, defende que o Estado apresente alternativas que proporcionem a ressocialização dos infratores e diz que, uma vez presos, os jovens não possam ser alocados em presídios, ao lado dos presos comuns.
Na mesma linha, o deputado federal Covatti Filho (PP-RS) defende tratamento diferenciado para os jovens que venham a ser condenados. Segundo ele, caso a legislação seja alterada, será necessário construir “presídios juvenis” para abrigar os apenados:
– Os jovens de hoje não são a mesma coisa do que os jovens dos anos 1940, quando foi regulamentada a maioridade de 18 anos.
A possível redução da faixa etária gerou reações por parte de diversas entidades, como o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, que se manifestou contrário à medida. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) avalia que “a criminalidade envolvendo crianças e adolescentes requer atenção especial das autoridades e da sociedade, mas não se deve deixar que a comoção leve a caminhos que não irão resolver o problema”.
A Fundação Abrinq afirma que “o adolescente é pessoa em desenvolvimento, que os jovens autores de ato infracional têm, em sua maioria, seus direitos violados antes de cometerem o ato infracional”.
Na opinião do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo Costa, além de inconstitucional, “falar em redução da maioridade é um retrocesso”. Opinião semelhante tem a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), ex-ministra dos Direitos Humanos, para quem a medida, se adotada, poderá ampliar a violência no país, em vez de diminuí-la.
– Os adolescentes respondem por menos de 1% dos atos contra a vida. Desses, todos, invariavelmente, recebem medida judicial de privação de liberdade, o que tem levado a um índice de ressocialização superior a 70%. No entanto, quando se analisa a situação dos presídios, ocorre exatamente o contrário:
– A reincidência no crime nas unidades prisionais ultrapassa os 70% – compara a deputada.
Longo debate
* No dia 8 de abril será instalada a comissão especial da Câmara que analisará o mérito e dará parecer à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171-A/93 que altera a faixa etária de responsabilidade penal de 18 para 16 anos no país. A comissão já foi criada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que encaminhou ofício aos líderes partidários para que indiquem seus representantes.
* Na primeira reunião, a comissão elegerá o presidente e os vice-presidentes e designará o relator. Caberá ao colegiado debater o mérito do projeto, fazer audiências públicas para discutir a mudança da imputabilidade penal, com a redução da maioridade penal, e elaborar um parecer sobre a proposta a ser votada pela comissão.
* Pelo regimento da Câmara, a comissão pode discutir a proposta por até 40 sessões plenárias. Caso não seja apreciada nesse prazo, a matéria poderá ser discutida por tempo indeterminado.
* O presidente da Câmara, no entanto, poderá avocar a proposta para apreciação em plenário, caso a comissão não consiga deliberar sobre o tema dentro de um prazo razoável.
* Uma vez aprovada, a proposta será encaminhada à apreciação do plenário da Câmara, em dois turnos de votação. Para a aprovação, são necessários no mínimo 308 votos, nos dois turnos. Se for aprovada na Câmara, a PEC segue para apreciação e votação no Senado.
* Se tiver alteração no Senado, passa por nova votação na Câmara.
Como é em outros países
No ano passado, em plebiscito, os uruguaios rejeitaram a proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Ao lado de Brasil, México, Colômbia, Venezuela, Peru e Equador, o país vizinho é um dos que têm a maior idade mínima prevista para prisão em caso de crimes.
Na Argentina, o limite era de 14 anos até 1983, quando a maioridade subiu para 16 anos. Entretanto, hoje há setores que pregam o retorno à antiga idade mínima.
Nos Estados Unidos, a idade mínima para uma pessoa ir para a cadeia varia entre seis e 12 anos, conforme o Estado. Uma das unidades federativas mais rigorosas é a Carolina do Norte, onde crianças a partir de de seis anos já podem ser presas.
Estados Unidos: 6 a 12 anos, dependendo do Estado
África do Sul, Bangladesh, Índia, Indonésia, Nigéria, Paquistão, Quênia, Sudão e Tanzânia: 7 anos
Escócia: 8 anos
Irã: 9 anos (meninas) e 15 anos (meninos)
Austrália, Hong Kong, Inglaterra, Nova Zelândia e Ucrânia: 10 anos
Turquia: 11 anos
Canadá, Costa Rica e Hungria: 12 anos
França: 13 anos
Alemanha, Bolívia, China, Croácia, Espanha, Itália, Japão e Paraguai: 14 anos
Dinamarca, Finlândia, Noruega, Polônia e Suécia: 15 anos
Argentina, Chile, Cuba e Rússia*:16
*Em casos graves, como assassinato e estupro, cai para 14 anos
Brasil, Equador, Colômbia, México, Peru, Uruguai e Venezuela: 18 anos
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O que corrige é a certeza da punição e por isto uma das alternativas é a prisão para isolar da sociedade, reeducar, ressocializar e reintegrar, mostrando ao autor e aos outros que o crime não compensa. É um tremendo equívoco deixar de tomar medidas duras contra o crime alegando a inoperância, a ineficiência, as omissões, a conivência, as negligências e a fuga de obrigações dos poderes, instituições e órgãos na execução penal.
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