quarta-feira, 21 de novembro de 2012

SINAIS DE TORTURA

 
ZERO HORA 21 de novembro de 2012 | N° 17260

VIOLÊNCIA NA CADEIA. Vistoria encontra 70 presos de SC com sinais de tortura

Auditor de Direitos Humanos apontou irregularidades em penitenciária que teria originado atentados


DIOGO VARGAS | São Pedro de Alcântara (SC)


O ouvidor nacional da Secretaria de Direitos Humanos, Bruno Renato Teixeira, disse ter confirmado a existência de 70 presos com ferimentos, supostamente provocados por tortura, na Penitenciária de São Pedro de Alcântara, na Grande Florianópolis. Ele também apontou uma série de negligências na unidade, desde o atendimento dos detentos à segurança do local.

Aviolência na cadeia estaria por trás da onda de atentados em Santa Catarina na semana passada. A suspeita é de que uma facção criminosa teria ordenado, de dentro da prisão, os ataques em retaliação às supostas agressões. A inspeção do ouvidor, que desde segunda-feira apura as condições do sistema prisional catarinense, durou quatro horas.

Ao final, o ouvidor e o juiz Alexandre Takaschima, da corregedoria do Tribunal de Justiça, afirmaram ter constatado as principais denúncias dos familiares dos presos, como a de que havia lesionados. Os dois disseram ter recebido dos presos, nas celas, diversos cartuchos de balas de borrachas disparadas pelos agentes. O juiz Takaschima relatou que a contagem desses cartuchos deflagrados e a de presos lesionados será decisiva para esclarecer as denúncias de tortura:

– A corregedoria do Deap (Departamento de Administração Prisional) não soube dizer ao certo qual o número de cartuchos deflagrados. Por isso, a contagem. Queremos ter todas as versões, do Deap, presos e das inspeções .

Ouvidor cobra apuração de agressão em 2008

Conforme o magistrado, haveria descontrole do armamento não letal. Ele mandou apurar se houve negligência pela direção da Penitenciária ou do Deap numa primeira visita do juiz da Vara de Execuções Penais de São José no local, feita há duas semanas. O grupo recebeu relatos também dos agentes penitenciários, no que se refere à falta de efetivo, e avalizaram as queixas.

O ouvidor anunciou que vai monitorar o resultado das apurações e também cobrar ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a suposta morosidade no julgamento de outro caso de tortura na penitenciária, ocorrido em 2008.

ENTREVISTA

“Vi presos machucados”

Bruno Renato Teixeira, ouvidor de Direitos Humanos

Teixeira conversou com a reportagem do jornal Diário Catarinense após a inspeção. Confira os principais trechos:

Diário Catarinense – Como foi a vistoria?
Bruno Renato Teixeira – Constatamos um pouco do que os familiares relataram. A questão da saúde é muito grave. Precisamos fazer uma ação para atendimento digno. A superlotação nos preocupa e encontramos algumas negligências, no acesso ao trabalho, que tem de ser melhor discutida. Encontramos diversas munições de armas não letais (balas de borracha) dentro das celas.

DC – O senhor constatou que houve violência, tortura a presos?
Teixeira – Todos os que relataram que sofreram algum tipo de violência foram encaminhados para exame. Então estamos aguardando. Confirmou-se os 70 (presos feridos).

DC – O senhor viu preso ferido?
Teixeira – Vi presos machucados. Lesões fruto de armas não letais. Todos foram atendidos e devolvidos às celas. Conversei com o pessoal da enfermagem. Foram disparos de armas de fogo.

DC – Em que situação houve esses disparos?
Teixeira – Os relatos são de que os agentes entraram nas celas e dispararam numa situação de retaliação ao que tinha ocorrido. Essa é a fala dos detidos. Os agentes dizem que havia um movimento para se criar um motim na unidade, o que não foi confirmado pelos presos.

DC – Há algum relato de preso de que a violência poderia ter sido uma suposta retaliação à morte da agente penitenciária (Deise Alves, assassinada em embosca no final de outubro)?
Teixeira – Eles não conseguem fazer essa correlação, mas segundo informações, relatos, eles afirmam que poderia ter sido em virtude disso. Esse processo de tortura já existia desde antes do ocorrido (assassinato) com a esposa do então diretor da unidade (Carlos Alves, marido de Deise).
Saldo violento
O balanço na Penitenciária São Pedro de Alcântara
- 70 presos estão feridos.
- 18 estão na enfermaria da penitenciária.
- Nas galeria 3 e 4 encontram-se os mais machucados.
- Seis detentos foram transferidos: quatro para cadeia de Itajaí e dois para Criciúma.
- A comissão encontrou projéteis de bala de borracha em celas. Juiz Alexandre Takashima pedirá a contagem dos projéteis encontrados para comparar com o número de presos machucados.
PRÓXIMOS PASSOS
- 1º de dezembro: prazo final para o Instituto-geral de Perícias (IGP) entregar os laudos dos exames feitos em 70 presos. Até agora, 59 foram concluídos.
- 14 de dezembro: término do inquérito policial que apura as denúncias. Falta ouvir os agentes prisionais e receber o material do IGP.

Nenhum comentário: