segunda-feira, 11 de outubro de 2010

PRESÍDIO PRIVADO - NOVO GOVERNADOR NÃO SIMPATIZA COM AS PPPS

PRESÍDIO PRIVADO - MODELO AMEAÇADO. Futuro do Presídio de Canoas em xeque. Governador eleito do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT) não é simpático às parcerias público-privadas (PPPs) na administração de cadeias, modelo que está previsto para o Complexo Prisional de Canoas. O atual governo pretende concluir o processo de licitação até dezembro, e Tarso diz que analisará a situação após a posse. CARLOS ETCHICHURY E JULIANA BUBLITZ, colaborou Gustavo Azevedo, Zero Hora 11/10/2010

A posição do governador eleito Tarso Genro sobre parcerias público-privadas (PPPs) para presídios deixa uma dúvida no ar. Um novo complexo penitenciário em Canoas, que geraria 3 mil novas vagas por meio de PPPs, sairá do papel, como prevê o atual governo, ou será arquivado a partir do dia 1º de janeiro?

Raul Pont, presidente estadual do PT, tem declarado ser favorável à suspensão das PPPs. Eleito em primeiro turno, Tarso, que se desincompatibilizou do Ministério da Justiça para se candidatar, é um entusiasta de PPPs, desde que não sejam empregadas na administração de cadeias. Na última quarta-feira, durante o Painel RBS, ele falou:

– Não tenho nenhuma predileção por parceria público-privada em matéria de presídio. Acho que é possível aproveitar essas parcerias dentro de um certo limite. Sou absolutamente contra que se entregue a direção do presídio para a iniciativa privada. Na minha opinião, isso é até inconstitucional.

E concluiu, cuidadoso, sem fechar questão:

– Os contratos que já foram feitos, vamos respeitá-los, inclusive acompanhar a experiência que está sendo feita para, a partir daí, tirar algumas conclusões.

Ocorre que não há contratos propriamente assinados. Em agosto, o governo do Estado lançou o edital para a contratação do consórcio que construirá o Complexo Prisional de Canoas. A expectativa era atrair investidores nacionais e internacionais. A seleção deve ocorrer até dezembro, o que permitiria o início das obras em 2011 e a conclusão dois anos depois. Cinco empresas já retiraram o edital e visitaram a área. Secretária-geral do atual governo, Ana Pellini acredita que tudo esteja encerrado até dezembro:

– A governadora quer ver esse contrato assinado até o fim do ano. Não vamos fazer correria. Estamos trabalhando para que tudo seja assinado neste governo.

A secretária pondera, ainda, que apenas cerca de “5% dos presos do Estado” ficarão sob a tutela das cadeias construídas mediante PPPs.

Mas caso a licitação atrase, o que não é incomum, o processo seria levado adiante pela equipe de Tarso? Zero Hora procurou Tarso, que preferiu se manifestar por meio de sua assessoria. A declaração deixa mais dúvidas do que certezas:

– No momento certo, após a posse, será analisada a situação do Complexo Prisional de Canoas – mandou dizer o governador eleito.

Investimento de R$ 200 milhões

O projeto em questão envolve a construção de nada menos do que 11 prédios, com investimento previsto de R$ 200 milhões. Se a ideia se mantiver, o consórcio vencedor custeará toda a construção e a manutenção, sendo ressarcido por um valor fixo por detento. A concessão será de 27 anos, prorrogável por igual período.

Para a Brigada Militar, ficaria a responsabilidade pela segurança externa. Já a operação interna seria feita pela empresa, com supervisão e controle da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Entre os benefícios para a população, está prevista a instalação de um distrito industrial para até 60 empresas, gerando potenciais 7 mil empregos.

"No momento certo, após a posse, será analisada a situação do Complexo Prisional de Canoas", TARSO GENRO, governador eleito.


O que prevê a proposta da atual gestão do governo estadual para Canoas:

- Três unidades do regime fechado masculino – 1,8 mil vagas (600
vagas cada)
- Uma unidade de regime semiaberto masculino – 600 vagas
- Uma unidade de regime fechado feminino – 482 vagas
- Uma unidade de regime semiaberto feminino – 70 vagas
- Uma unidade de amamentação e berçário – 48 vagas
- Uma unidade de corpo da guarda
- Uma unidade do grupo de operações táticas
- Uma unidade central de serviços
- Uma unidade central de saúde

ARGUMENTOS FAVORÁVEIS

Capacidade de investimento - A iniciativa privada tem capacidade de fazer grandes
investimentos em um curto espaço de tempo, sem depender de processos burocráticos e decisões políticas.

Agilidade - Serviços de manutenção, eventuais reformas e outras melhorias poderiam ser feitas a qualquer momento, com maior agilidade. A iniciativa privada não teria de cumprir prazos e legislações restritivas impostas ao governo do Estado.

Gestão - A dinâmica da iniciativa privada teria maiores condições de manter as penitenciárias em melhores condições, sem o enfrentamento de problemas que
costumam marcar os empreendimentos estatais, como deterioração física e superlotação.

Custo diluído - Em vez de arcar com um alto investimento de uma vez na construção de presídios, o governo do Estado consegue diluir o gasto em um período mais longo. No caso do Complexo Prisional de Canoas, o edital prevê um contrato de 27 anos.

Economia a longo prazo - Sob responsabilidade da iniciativa privada, o governo
não teria de arcar com gastos com o pessoal que atua nos estabelecimentos e, no futuro, com custos previdenciários e de aposentadorias dos agentes penitenciários.

ARGUMENTOS CONTRÁRIOS

Obrigação estatal - Críticos defendem que o Estado já se afastou o bastante de suas obrigações nas áreas de saúde, educação e segurança pública. A aposta no modelo privado de vigilância penitenciária seria mais uma fuga das responsabilidades.

Custo por detento superior - Hoje, o Estado gasta, em média, R$ 600 com cada preso. Na iniciativa privada, o custo máximo será de R$ 2,7 mil, embora o governo acredite que, na licitação, o valor possa cair para R$ 1,8 mil.

Segurança interna - A perspectiva de que seguranças privados façam a vigilância interna é considerada problemática do ponto de vista legal. Eles ficariam incumbidos de registrar desvios de comportamento capazes de ampliar o tempo de pena – tarefa que é considerada imprópria para um trabalhador privado.

Lucro no sistema carcerário - Críticos dizem que é problemático uma empresa buscar o lucro num segmento que deveria prezar pela recuperação e ressocialização dos detentos. A privatização significaria transformar o preso em mão de obra, sem os inconvenientes dos direitos trabalhistas.

Tamanho - O ideal seriam presídios menores e descentralizados para evitar que os presos venham para os grandes centros e se misturem com facções. Esse modelo não interessa à iniciativa privada, que necessita de grandes presídios para obter um lucro que justifique o investimento.

SUA SEGURANÇA | Humberto Trezzi - Por que não?

O governador eleito Tarso Genro vê inclusive empecilhos constitucionais em entregar a direção de presídios à iniciativa privada. Ele acredita que é missão do Estado gerenciar atividades estratégicas como a guarda de criminosos. Está embutido neste pensamento esboçado por Tarso, também, muito da ideologia do seu partido, o Partido dos Trabalhadores, de priorizar poder ao Estado e olhar com desconfiança as privatizações.

Ora, os fatos têm demonstrado que presídios privados funcionam, em muitos casos, melhor que os estatais. Seja nos Estados Unidos, seja nas escassas experiências brasileiras. É o que demonstram números exibidos pela Penitenciária Industrial de Joinville (SC), a 623 quilômetros de Porto Alegre. Conforme reportagem publicada pelo jornalista de Zero Hora Francisco Amorim este ano, os 366 detentos desse presídio usam uniformes e ocupam celas limpas.

Quase a metade deles estuda, outros tantos trabalham, e o número de apenados está dentro da capacidade prevista. Eles recebem as visitas íntimas em quartos, e o índice de fugas é zero. Além disso, a propalada reincidência seria 10 vezes menor do que em presídios catarinenses estatais.

Seria, coloco, porque números sempre podem trazer neles embutido um pouco de propaganda. Vamos supor que parte disso seja exagero. Por mais que nem tudo seja comprovado, aquilo que é comprovável – a inexistência de superlotação, o estudo para mais da metade dos apenados – já é maravilha perto da realidade atual do Rio Grande do Sul. Não por falta de esforço das autoridades penitenciárias, mas porque presídio custa caro.

Já o administrador de uma prisão privada tem interesse em vender um bom produto, pois depende disso para garantir seu lucro. Por que não experimentar? Que não seja por simples motivação ideológica. Ideologia, muitas vezes, esbarra em realidades que a contradizem.

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