A Execução Penal é um dos extremos do Sistema de Justiça Criminal, importante na quebra do ciclo vicioso do crime pela reeducação, ressocialização e reinclusão. Entretanto, há descaso, amadorismo, corporativismo e apadrinhamento entre poderes com desrespeito às leis e ao direito, submetendo presos provisórios e apenados da justiça às condições desumanas, indignas, inseguras, ociosas, insalubres, sem controle, sem oportunidades e a mercê das facções, com reflexo nocivo na segurança da população.
quarta-feira, 21 de abril de 2010
CORRUPÇÃO NAS CADEIAS DO RS - Agente que faz denúncia é constrangida, punida e transferida. OAB reage.
CORRUPÇÃO NAS CADEIAS. Punição para quem denuncia. Agente penitenciária foi transferida de prisão após relatar irregularidades - CARLOS ETCHICHURY E JULIANA BUBLITZ - Zero Hora 21/04/2010.
A história narrada pela agente penitenciária Mary Rejane Paz Bengochêa, 44 anos, ilustra as dificuldades que servidores da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) encontram ao revelar irregularidades – como mostra a série de reportagens publicada por Zero Hora a partir de domingo. De denunciante, a funcionária passou à condição de investigada: respondeu a uma sindicância e acabou punida com uma transferência de presídio antes mesmo da abertura do procedimento administrativo.
Lotada no Presídio Estadual de Santa Rosa, Rejane procurou o administrador da prisão, Amandio Caetano Machado, para entregar um relatório em 2008. Ela relatava que um apenado recebia visitas fora de hora, alimentos “in natura” – o que era proibido aos demais – e permissão para usar faca, garfo e colher:
– Para minha surpresa, o administrador não quis receber o memorando, alegando que não tinha obrigação.
Diante da reação, testemunhada por uma colega, a agente diz ter enviado o documento à Delegacia Penitenciária Regional. Dias depois, ao procurar a Corregedoria da Susepe, Rejane conta ter sido informada de que Amandio havia formalizado queixas contra funcionários, e que ela estaria entre eles.
Rejane diz ter sido chamada ao órgão para uma audiência preliminar, quando a corregedora Vera Regina Hernandes Montedo teria a impedido de conhecer o teor das denúncias.
– A corregedora disse que eu tinha de obedecer e ficar quieta. Foi uma averiguação tendenciosa, parcial e sem isenção – argumenta a agente.
Agente conseguiu reverter remoção na Justiça
Em um relatório de junho de 2008, a corregedoria concluiu que a solicitação de afastamento da agente era “necessária, uma vez que se verificou que a administração da casa está realizando um bom trabalho”. Conforme o documento, Rejane estaria “manipulando” apenados. Ela foi transferida para o Presídio de Cerro Largo e soube que uma sindicância era aberta contra ela. Sua advogada conseguiu reverter a remoção graças a uma liminar na Justiça. Meses depois, o relatório de 289 páginas concluiu: “Considerando a fragilidade das provas para imputar de forma contundente aos agentes a prática de irregularidades administrativas, determino o arquivamento do feito”.
– A situação está muito difícil. Se soubesse que teria acontecido tudo isso, teria me calado – desabafa Rejane.
Contrapontos
O que diz Amandio Caetano Machado, diretor do Presídio Estadual de Santa Rosa- “Tenho ordens para não me manifestar. Caso eu fale com a imprensa, poderei ser punido. Recomendo que o senhor fale com o meu chefe, Adão Flores, delegado Penitenciário Regional.”
O que diz Adão José Flores Filho, delegado penitenciário da 3ª Região - “Sou delegado regional desde janeiro de 2009, quando a servidora já havia retornado para a penitenciária de Santa Rosa por decisão judicial. Infelizmente, não tenho informações a respeito. De fato, há uma orientação para que diretores de presídio não falem com a imprensa mas, neste caso, como é algo bem específico, acho que ele (Amandio) deveria se manifestar. Infelizmente, ele abriu mão desta oportunidade.”
O que diz Vera Regina Hernandes Montedo, corregedora da Susepe - A assessoria de imprensa da Susepe sugeriu que a reportagem ligasse diretamente para a corregedora, mas até o fechamento da edição de ontem Vera Regina não havia sido localizada para apresentar a sua versão.
OAB divulga nota em repúdio à corrupção
A série de reportagens Corrupção nas cadeias provocou manifestações na seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ontem, o presidente da instituição, Claudio Lamachia, divulgou nota lamentando e repudiando os episódios de corrupção e tortura em presídios. Lamachia ressaltou ser “inadmissível para uma sociedade democrática que o caos que caracteriza o sistema prisional no Estado dê margem, além de várias outras mazelas, à promiscuidade entre detentos e servidores públicos encarregados de manter a segurança da carceragem e o fiel cumprimento da lei”. O presidente da OAB destacou ainda que o órgão vai exigir a “rigorosa apuração dos episódios e a punição dos eventuais responsáveis por condutas irregulares”. A entidade espera que as autoridades competentes conduzam as averiguações “de modo a se chegar aos culpados e à sua penalização”.
Agentes querem interdição de presídios
Os agentes penitenciários do Estado ameaçam pedir interdição em cadeias do Estado que não ofereçam condições de funcionamento. A decisão foi tomada em assembleia da categoria, que também discutiu a série de reportagens Corrupção nas cadeias de ZH.
– Vamos fazer um levantamento e pediremos a interdição, por exemplo, daquelas penitenciárias que tiverem condições insalubres, poucos agentes ou oferecerem risco de incêndio – diz Flávio Berneira Júnior, diretor do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado.
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